Não havia passagem secreta alguma.
Certo, mas móveis e quadros não desaparecem como fantasmas, é o que diziam de todos os lados. Eles saem por portas e janelas, e as pessoas que deles se apoderam se introduzem e saem da mesma forma por portas e janelas. Que pessoas são essas? Como entraram? E como saíram?
A delegacia de Rouen, convencida da sua impotência, solicitou a ajuda de agentes parisienses. O sr. Dudouis, chefe de polícia, enviou seus melhores homens da brigada criminal. Ele mesmo fez uma estada de 48 horas no Malaquis. Também não descobriu nada.
Foi então que mandou chamar o inspetor Ganimard, cujos serviços tivera com frequência a ocasião de apreciar.
Ganimard escutou em silêncio as instruções do seu superior, depois, balançando a cabeça, pronunciou:
– Creio que é um falso caminho continuar insistindo em vasculhar o castelo. A solução está em outra parte.
– Onde então?
– Junto a Arsène Lupin.
– Junto a Arsène Lupin! Supor isso é admitir sua participação.
– Eu a admito. E mais, considero-a como certa.
– Mas é um absurdo, Ganimard. Arsène Lupin está preso.
– Arsène Lupin está preso, concordo. Está sendo vigiado, também concordo. Mas, ainda que tivesse ferros nos pés, algemas nas mãos e uma mordaça na boca, eu não mudaria de opinião.
– E por que essa obstinação?
– Porque somente Arsène Lupin é capaz de montar uma máquina de tal envergadura e montá-la de modo que funcione... como funcionou.
– Palavras, Ganimard.
– Que são realidade. De nada adiantará buscar um túnel, pedras que giram sobre um pivô e outras engenhocas do gênero. Nosso homem não emprega procedimentos tão antiquados assim. É um homem de hoje, ou melhor, de amanhã.
– E o que conclui?
– Concluo pedindo-lhe uma autorização para passar uma hora com ele.
– Na cela dele?
– Sim. Ao voltar da América tivemos ótimas conversas durante a travessia, e ouso dizer que ele tem alguma simpatia por aquele que soube prendê-lo. Se puder me informar sem se comprometer, não me fará perder a viagem.
Era pouco mais de meio-dia quando Ganimard foi introduzido na cela de Arsène Lupin. Este, estendido no leito, ergueu a cabeça e deu um grito de alegria.
– Oh! Mas que verdadeira surpresa! O meu caro Ganimard aqui!
– Ele mesmo.
– Eu desejava muitas coisas no retiro que escolhi... mas nenhuma tanto quanto recebê-lo.
– Muito gentil da sua parte.
– De modo algum, sinto por você a maior estima.
– Fico orgulhoso.
– Sempre afirmei: Ganimard é o nosso melhor detetive. Ele quase se equipara, veja que estou sendo franco, quase se equipara a Sherlock Holmes. Mas peço desculpas por não poder lhe oferecer senão um banquinho. Nem um refresco ou um copo de cerveja. Perdoe-me, estou aqui de passagem.
Ganimard sentou-se, sorrindo, e o prisioneiro continuou, feliz de falar:
– Meu Deus, como estou contente de pôr os olhos na figura de um homem de bem! Estou farto da cara desses espiões e denunciantes que dez vezes por dia vêm revistar meus bolsos e minha modesta cela, para se assegurar de que não preparo uma fuga. Que zelo o governo tem por mim!
– Ele tem razão...
– Ah, não! Eu ficaria tão feliz se me deixassem viver no meu cantinho!
– Com o dinheiro dos outros.
– E daí? Seria tão simples. Mas estou falando demais, dizendo besteiras, e você talvez tenha pressa. Vamos ao que importa, Ganimard. A que devo a honra de uma visita?
– O caso Cahorn – declarou Ganimard, sem rodeios.
– Alto lá! Um instante... É que são tantos os casos! Primeiro preciso achar no meu cérebro o dossiê do caso Cahorn... Ah, sim, aqui está.
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