Mas digo que é bobagem, de qualquer modo. Diz uma coisa, vamos matar as mulheres também?

– Olha, Ben Rogers, se eu sou tão ignorante como ocê, não ia deixar ninguém perceber. Matar as mulheres? Não, ninguém nunca viu nada disso nos livros. Ocê traz as mulheres pra caverna e trata todas sempre com um jeito polido e doce, e aí elas se apaixonam por ocê, e nunca mais vão querer ir pra casa.

– Bem, se é assim, tô de acordo, mas não faço fé nisso. Logo, logo vamos ter a caverna tão cheia de mulheres e de sujeitos esperando ser resgatados que não vai ter lugar pros assaltantes. Mas vai em frente, não tenho nada a dizer.

O pequeno Tommy Barnes agora tava adormecido e, quando foi acordado, ficou assustado e chorou, e disse que queria ir pra casa pra ver a mamãe, que não queria mais ser assaltante.

Aí todos zombaram dele e chamaram ele de bebê chorão, e isso enfureceu o pequeno, e ele disse que ia direto pra casa contar todos os segredos. Mas Tom deu cinco centavos pra ele ficar quieto e disse que todos nós tínhamos que ir pra casa e nos encontrar na próxima semana, pra assaltar alguém e matar algumas pessoas.

Ben Rogers disse que não podia sair muito, só nos domingos, então ele queria começar no próximo domingo, mas todos os meninos disseram que era maldade fazer essas coisas no domingo, e isso decidiu a questão. Concordaram em se reunir e marcar um dia assim que possível, e depois elegemos Tom Sawyer primeiro-capitão e Jo Harper segundo-capitão do bando, e fomos pra casa.

Eu subi no telheiro e entrei sorrateiro pela janela antes do dia amanhecer. As minhas roupas novas tavam todas sujas de graxa e poeira, e eu tava morto de cansado.

Capítulo 3

Uma boa revistada – Graça triunfante – Brincando de assaltantes – Os gênios – “Uma das mentiras
de Tom Sawyer”

Levei uma boa revistada de manhã, da velha srta. Watson, por causa das minhas roupas, mas a viúva, ela não xingou, só limpou a graxa e o barro seco, e parecia tão chateada que pensei em me comportar por um tempo, se desse. Então a srta. Watson ela me levou pro gabinete e rezou, mas nada aconteceu. Ela me disse pra rezar todos os dias, que aquilo que eu pedia daquele jeito eu ia conseguir. Mas não era verdade. Tentei. Uma vez consegui uma linha de pescar, mas nada de anzóis. Tentei conseguir os anzóis três ou quatro vezes, mas não sei por que não conseguia fazer a reza funcionar. Mais tarde pedi pra srta. Watson tentar pra mim, mas ela disse que eu era tolo. Nunca me disse por quê, e não teve jeito de eu descobrir.

Uma vez sentei na mata e pensei muito sobre isso. Perguntei pra mim mesmo: se alguém pode conseguir o que reza pedindo, por que o Decano Winn não recebeu de volta o dinheiro que perdeu com o porco? Por que a viúva não pode receber de volta a caixa de rapé de prata que foi roubada? Por que a srta. Watson não consegue engordar? Não, disse pra mim mesmo, não tem nada disso. Fui e falei com a viúva sobre isso, e ela disse que as coisas que a gente conseguia rezando eram “dádivas espirituais”. Isso foi demais pra mim, mas ela me explicou o que queria dizer – tenho que ajudar as outras pessoas, e fazer tudo o que eu puder pras outras pessoas, e cuidar delas o tempo todo e nunca pensar em mim mesmo. Isso incluía a srta. Watson, foi o que pensei. Saí pro mato e revirei a coisa na minha cabeça por um bom tempo, mas não consegui ver nenhuma vantagem – a não ser pras outras pessoas – então decidi por fim que não ia me preocupar mais com isso, apenas ia deixar acontecer. Às vezes a viúva me puxava prum lado e falava sobre a Providência de um jeito que dava água na boca; mas no dia seguinte, talvez, a srta. Watson assumia o comando e derrubava tudo de novo. Achei que dava pra ver que tinha duas Providências, e um pobre sujeito tinha uma grande chance de felicidade com a Providência da viúva, mas, se a Providência da srta.