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VICENTE Senhora, que me fareis?

MERENCIANA Um aqui-d'el-rei, ouvis?

Não sejais vós descortês.

VICENTE Não quero senão amores,

pois vosso, senhora, sou.

MERENCIANA Amores de vosso avô,

o da ilha dos Açores. Andar aramá vós só.



MATEUS Vamo-nos daqui, Vicente.

VICENTE Bofá vamos.

MATEUS Nunca vi tal feira.

VICENTE Vamos comprar à Ribeira,

que anda lá cousa mais quente.



Vão-se os compradores, e diz o Serafim às moças:

SERAFIM Vós outras quereis comprar das virtudes?

Senhor, não.

SERAFIM Saibamos por que rezão.

DOROTEIA Porque no nosso lugar

não dão por virtudes pão. Nem casar não vejo eu por virtudes a ninguém.

Quem tiver muito de seu,

e tão bons olhos com'eu sem isso casará bem.



SERAFIM Pois porque viestes ora cansar à feira de pé?



TEODORA Porque nos dizem que é feira de Nossa Senhora:

e vedes aqui porquê.

E as graças que dizeis

que tendes aqui na praça, se vós outros as vendeis, a Virgem as dá de graçaaos bons, como sabeis.



E porque a graça e alegria, a madre da consolação

deu ao mundo neste dia, nós vimos com devação

a cantar-lhe úa folia.

E pois que já descansámos assi em boa maneira, moças, assi como estamos, demos fim a esta feira, primeiro que nos partamos.



Alevantam-se todas, e ordenadas em folia cantaram a cantiga seguinte, com que se despediram.

Cantiga.

I CORO «Blanca estais colorada,

«Virgem sagrada.

«Em Belém vila do amor

«da rosa nasceu a flor:

«Virgem sagrada.»

II CORO «Em Belém vila do amor

«nasceu a rosa do rosal:

«Virgem sagrada.»

I CORO «Da rosa nasceu a flor:

«pera nosso Salvador:

«Virgem sagrada.»

II CORO «Nasceu a rosa do rosal,

«Deus e homem natural:

«Virgem sagrada.»



Gratias agamus

Domino Deo nostro

Maria Leonor Carva1hiio Buescu, Gil Vicente, Copilar;am de Todalas Obras, val. I, pp. 144-175

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