Era de pequena estatura; tinha os cabelos de um castanho escuro, e os olhos grandes e azuis, dois pedacinhos do céu, abertos em rosto alvo e corado; o corpo, levemente refeito, era naturalmente elegante; mas se a dona sabia vestir-se com luxo, e até com arte, não possuía o dom de alcançar os máximos efeitos com os meios mais simples.

Estácio contemplou-a namorado sem ousar dizer palavra; a primeira que lhe ia sair dos lábios, era justamente o pedido que o levava ali. Mas Eugênia deteve-lha, mostrando o anel que a madrinha, fazendeira de Cantagalo, lhe mandara na véspera. Era uma opala magnífica, a tal ponto que Eugênia dividia os olhos entre o namorado e ela. Esta simultaneidade esfriou o mancebo. Entraram ambos em casa, onde D. Tomásia os esperava. A mãe de Eugênia sabia combinar o decoro com os desejos de seu coração; não seria obstáculo aos dois namorados; infelizmente, a presença de duas visitas veio destruir o cálculo dos três. Estácio espreitava uma ocasião de pedir a Eugênia a autorização que desejava; até ao jantar não se lhe deparou nenhuma.

Desceram todos ao jardim. D. Tomásia entreteve uma das visitas; Camargo foi mostrar à outra a sua coleção de flores. Estácio e Eugênia afastaram-se cautelosamente dos dois grupos, a pretexto de não sei que flor aberta na manhã daquele dia. A flor existia; Eugênia colheu-a e deu a Estácio.

— Não vá perdê-la; há de entregá-la a Helena da minha parte. Diga-lhe que estou com muitas saudades.

Estácio colocou a flor na botoeira.

— Vai cair! disse Eugênia. Quer que pregue um alfinete?

Estácio não teve tempo de responder, porque a filha de Camargo, tirando um alfinete do cinto, prendeu o pé da flor, gastando muito mais tempo do que o exigia a operação. A moça não era míope; todavia aproximou de tal modo a cabeça ao peito do mancebo, que este teve ímpetos de lhe beijar os cabelos, e seria a primeira vez que seus lábios lhe tocassem.

Edições Costa Flosi

Helena,

26

de Machado de Assis

— Pronto! disse ela. Diga a Helena que é a flor mais bonita do nosso jardim. Sabe que eu gosto muito de sua irmã?

— Acredito.

— Suponho que é minha amiga; há de sê-lo com certeza. Oh! eu preciso muito de uma amiga verdadeira!

— Sim?

— Muito! Tenho tantas que não prestam para nada, e só me dão desgostos, como Cecília... Se soubesse o que ela me fez!

— Que foi?

Eugênia desfiou uma historiazinha de toucador, que omito em suas particularidades por não interessar ao nosso caso, bastando saber que a razão capital da divergência entre as duas amigas fora uma opinião de Cecília acerca da escolha de um chapéu.

Estácio não escutou a história com a atenção que a moça desejara; limitou-se a ouvir a voz de Eugênia, que era na verdade angélica. Alguma coisa porém lhe ficou; e quando ela pôs termo às suas queixas:

— O que me parece, observou o sobrinho de D. Úrsula, é que não valia a pena brigar por tão pouca coisa...

— Pouca coisa! exclamou Eugênia.