HUMPTY DUMPTY
Humpty Dumpty
Lewis Carroll
(Tradução de Renato Suttana)
(Through the looking glass)
No entanto o ovo apenas cresceu mais e mais e se tornou mais e mais humano: quando ela já estava a uns poucos metros dele, percebeu que tinha olhos e um nariz e uma boca; e quando se aproximou, viu claramente que era o próprio HUMPTY DUMPTY. “Não pode ser ninguém mais!”, disse a si mesma. “Estou tão certa disso como se seu nome estivesse escrito em sua cara.”
Poderia muito bem ter sido escrito umas cem vezes naquela cara enorme. Humpty Dumpty estava sentado com as pernas cruzadas, como um turco, no topo de um muro alto – tão estreito que Alice se espantou de que pudesse manter o equilíbrio – e, como seus olhos estivessem fixos na direção oposta, e ele não reparasse nela, ela pensou que fosse alguém de muita presunção.
– E como se parece com um ovo! – ela disse em voz alta, estendendo as mãos, pronta para agarrá-lo, na expectativa de que a qualquer momento ele caísse.
– É de fato uma provocação – Humpty Dumpty disse depois de um comprido silêncio, sem olhar para Alice enquanto falava – ser chamado de ovo... de fato!
– Eu disse que você se parecia com um ovo, senhor – Alice explicou cortesmente. – E alguns ovos são bem bonitos, não é? – acrescentou, esperando que essa observação se convertesse numa espécie de elogio.
– Certas pessoas – disse Humpty Dumpty, sem nunca olhar para ela – não têm mais juízo que um bebê!
Alice não soube o que replicar: não parecia uma conversa, pensou, pois ele nunca dizia nada para ela; de fato, sua última observação se dirigira a uma arvore – então ela aguardou e disse baixinho para si mesma:
– Certo dia Humpty Dumpty
sobre um muro se sentou.
Mas deu azar e – tibumba! –
um belo tombo levou.
Nem todos os cavaleiros
do rei, com os seus cavalos,
puderam novamente colocar
Humpty Dumpty de volta em seu lugar.
– Essa última linha é muito longa para a poesia – acrescentou, quase em voz alta, esquecendo-se de que Humpty Dumpty poderia ouvi-la.
– Não fique tagarelando consigo mesma desse jeito, – disse Humpty Dumpty, olhando para ela pela primeira vez – mas me diga seu nome e seu negócio.
– Meu nome é Alice, mas...
– É um nome bem estúpido! – Humpty Dumpty interrompeu com impaciência. – O que significa?
– Um nome precisa significar alguma coisa? – Alice perguntou incrédula.
– Claro que precisa! – Humpty Dumpty disse com uma curta risada. – Meu nome significa a forma que eu tenho, e é uma forma bem bonita também. Com um nome como o seu, você poderia ter qualquer forma, quase.
– Por que você está sentado aqui sozinho? – perguntou Alice, sem querer começar uma discussão.
– Ora, porque não há ninguém comigo! – gritou Humpty Dumpty. – Pensou que eu não saberia a resposta para essa? Pergunte outra.
– Não acha que estaria mais seguro no chão? – Alice prosseguiu, sem intenção de propor outra charada, mas simplesmente na sua bem-intencionada preocupação com a estranha criatura. – Esse muro é muito estreito!
– Que adivinhas tremendamente fáceis você propõe! – Humpty Dumpty resmungou. – É óbvio que eu não penso assim! Ora, se algum dia eu caísse (que não tem a menor chance), mas se eu caísse... – Aqui ele fez um beicinho e pareceu tão solene e grandioso que Alice mal pôde conter o riso. – Se eu caísse, – ele continuou – o rei me prometeu... Ah, você pode ficar pálida se quiser! Não pensou que eu ia dizer isso, pensou? O rei me prometeu... de sua própria boca... que... que...
– Que enviaria todos os seus cavalos e todos os seus cavaleiros – Alice interrompeu, um tanto inadvertidamente.
– Mas agora eu afirmo que isso é muito ruim! – Humpty Dumpty gritou, tomado de súbito fervor. – Você esteve ouvindo por trás das portas... e das árvores... e pelas chaminés... ou não poderia saber disso!
– Não estive, juro! – Alice disse muito gentilmente. – Está num livro.
– Ah, bem! Podem escrever tais coisas num livro – Humpty Dumpty disse num tom mais calmo. – É o que vocês chamam de uma História da Inglaterra, é isso. Agora, dê uma boa olhada em mim! Eu sou alguém que falou com um Rei, eu sou: quiçá você nunca verá outro igual: e para lhe mostrar que não sou orgulhoso, você pode apertar minha mão! – E sorriu quase até as orelhas, enquanto se inclinava para a frente (arriscando-se a cair no chão por causa disso) e oferecia sua mão a Alice. Ela o observou com certa ansiedade, enquanto tomava sua mão. “Se ele sorrisse mais um pouco, os cantos de sua boca poderiam se encontrar na nuca”, pensou: “e então não sei o que aconteceria com sua cabeça! Quem sabe até caísse!”
– Sim, todos os seus cavalos e os seus cavaleiros – Humpty Dumpty prosseguiu. – Eles me levantariam de novo num minuto, pode acreditar! Porém esta conversa está indo um pouco rápido demais: voltemos à ultima observação, exatamente.
– Receio que não possa me lembrar – Alice disse com polidez.
– Nesse caso, comecemos do zero – disse Humpty Dumpty – e é minha vez de escolher um assunto... – (“Ele fala como se fosse só um jogo!” – Alice pensou.) – Então, aqui uma pergunta para você. Que idade você disse que tinha?
Alice fez um breve cálculo e disse:
– Sete anos e seis meses.
– Errado! – Humpty Dumpty exclamou triunfal.
1 comment