– Muito obrigada – disse Alice.
– Nos dias compridos do quente verão
quem sabe você compreenda a canção.
Quando o outono as folhas amarelecer,
corra e anote tudo o que vou lhe dizer.
– Anotarei, se puder me lembrar ate lá – disse Alice.
– Não precisa ficar fazendo tais comentários – Humpty Dumpty disse. – Não são sensatos e me desconcertam.
Mandei um recado aos peixes do mar:
“Eis o que pretendo”, mandei avisar.
Mas esses peixinhos do oceano sem fim
logo responderam, me dizendo assim.
Isto me disseram, sem como nem quê:
“É que não podemos, meu senhor, porque...”
– Receio não estar entendendo muito bem – disse Alice.
– Fica mais fácil depois – Humpty Dumpty respondeu. –
Ora, novamente lhes mandei dizer:
“Saibam que é melhor não desobedecer.”
Uma vez lhes disse, e outra vez lhes disse.
Mas não houve um só que meu conselho ouvisse.
Pois meu caldeirão, que era novinho em folha,
apanhei de um golpe: não tive outra escolha.
E então alguém veio para me instruir:
“Aqueles peixinhos já foram dormir.”
Pois eu lhe falei assim, abertamente:
“Corra a despertá-los imediatamente.”
Falei alto e claro, muito decidido.
Dei um par de gritos bem no seu ouvido.
Mas era orgulhoso e altivo o sujeito.
Disse: “Não precisa gritar desse jeito.”
Humpty Dumpty elevou a voz quase ao ponto de gritar, enquanto recitava essa estrofe, e Alice estremeceu pensando: “Eu não gostaria de ser o mensageiro por nada!”
– Era muito altivo e orgulhoso de si.
Disse: “Vou correndo despertá-los, se...”
Logo um saca-rolha eu apanhei na estante:
“Vou eu mesmo e acordo-os neste exato instante.”
Mas quando me dei com a porta trancada,
empurrei, dei chute, puxão e pancada.
Quando achei a porta trancada por trás,
experimentei a maçaneta, mas...
Houve uma longa pausa.
– Isso é tudo? – perguntou Alice timidamente.
– É tudo – disse Humpty Dumpty. – Adeus.
Foi muito repentino, Alice pensou: mas, após uma forte indicação de que ela devia partir, sentiu que não seria educado ficar. Então ela se levantou e estendeu a mão.
– Adeus, até nos encontrarmos de novo! – disse com o máximo de animação que conseguiu.
– Eu não a reconheceria de novo se nos encontrássemos – Humpty Dumpty replicou num tom descontente, dando a ela um dedo para apertar. – Você é tão idêntica às outras pessoas.
– É pela cara que nos reconhecemos – disse Alice pensativa.
– Pois é disso que me queixo – disse Humpty Dumpty. – Sua cara é a mesma de todo mundo, então... – (marcando os lugares no ar com o polegar) – ... nariz no meio, boca por baixo. É sempre a mesma. Agora, se você tivesse os dois olhos ao lado do nariz... ou a boca por cima... já seria de alguma ajuda.
– Não ia parecer bem – Alice objetou. Mas Humpty Dumpty apenas fechou os olhos e disse:
– Espere até ter tentado.
Alice esperou um minuto para ver se ele falaria de novo, mas como ele não abriu mais os olhos nem lhe deu mais atenção, ela disse: – Adeus! – outra vez e, sem obter resposta, saiu andando devagar: mas não sem dizer a si mesma enquanto saía: – De todas as pessoas insatisfatórias... – (repetiu bem alto, como se fosse um grande consolo ter uma palavra tão longa para dizer) – ... de todas as pessoas insatisfatórias que eu já conheci... – Nunca terminou a frase, pois nesse momento uma forte pancada estremeceu a floresta de ponta a ponta.
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