ele havia despertado seu interesse, ou algo do gênero.
— Permitam-me sentar? — pediu o estrangeiro de forma educada, e os colegas, como que involuntariamente, abriram um espaço; o estrangeiro sentou-se comodamente entre os dois e, no mesmo instante, tomou parte na conversa: — Se não ouvi mal, o senhor disse que Jesus não existiu neste mundo? — perguntou o estrangeiro, voltando para Berlioz seu olho esquerdo, verde.
— Não, o senhor não ouviu mal — respondeu Berlioz com cortesia. — Falei exatamente isso.
— Ah, que interessante! — exclamou o estrangeiro.
“O que diabos ele quer?”, pensou Bezdômny, franzindo a testa.
— E o senhor concordava com seu interlocutor? — quis saber o desconhecido, virando-se para a direita, para Bezdômny.
— Cem por cento! — confirmou Bezdômny, que gostava de se expressar de forma afetada.
— Incrível! — exclamou o interlocutor intrometido e, sabe-se lá por quê, olhou furtivamente ao redor e, abafando sua voz grave, disse: — Desculpem a minha impertinência, mas eu entendi de tal forma que, além de tudo, não acreditam em Deus? — Ele fez um olhar assustado e acrescentou: — Juro que não direi a ninguém.
— É, não acreditamos em Deus — respondeu Berlioz sorrindo de leve diante do susto do turista estrangeiro —, mas pode falar disso com total liberdade.
O estrangeiro reclinou-se no encosto do banco e perguntou com voz esganiçada pela curiosidade:
— São ateus?!
— É, somos ateus — respondeu Berlioz, sorrindo, e Bezdômny, enfurecido, pensou: “Pronto, esse estrangeiro já está querendo armar confusão!”
— Oh, que graça! — gritou o estrangeiro, surpreendido, e pôs-se a mover a cabeça, olhando ora para um, ora para o outro beletrista.
— Em nosso país o ateísmo não surpreende ninguém — disse Berlioz, diplomático e educado. — A maioria da nossa população deixou de crer, conscientemente, nos contos de fada sobre Deus há muito tempo.
Então o estrangeiro aprontou a seguinte peça: pôs-se de pé e apertou a mão do editor pasmo, pronunciando as seguintes palavras:
— Permita-me agradecer-lhe de todo o coração!
— Por que o senhor lhe agradece? — quis saber Bezdômny, piscando.
— Pela informação muito importante, que, para mim, um viajante, é interessante demais — explicou o estrangeiro esquisitão, levantando o dedo de forma significativa.
A informação importante, pelo visto, realmente provocou no viajante impressões fortes, tanto que ele lançou um olhar para os prédios, assustado, como se temesse avistar em cada janela um ateu.
“Não, não é inglês, não...”, pensou Berlioz, e Bezdômny pensou: “Onde ele aprendeu a falar russo assim? Isso é o interessante!”, e franziu a testa novamente.
— Mas permitam-me perguntar — começou a dizer o visitante estrangeiro depois de uma reflexão inquietante —, o que fazer com as provas da existência de Deus que, como se sabe, são precisamente cinco?
— Oh, céus! — respondeu Berlioz com desgosto. — Nenhuma dessas provas vale nada e a humanidade há muito tempo as deixou de lado. O senhor há de convir que, à luz da razão, não pode haver nenhuma prova da existência de Deus.
— Bravo! — bradou o estrangeiro. — Bravo! O senhor repetiu na íntegra a ideia do preocupado e velho Immanuel sobre o assunto. Mas veja o curioso: ele destruiu definitivamente as cinco provas e depois, como que zombando de si mesmo, criou sua própria sexta prova!
— A prova de Kant — exclamou o culto editor com sorriso fino — é também inconsistente. Não é à toa que Schiller dizia que os argumentos kantianos sobre essa questão podem satisfazer somente escravos, e Strauss simplesmente riu dessa prova.
Berlioz falava e pensava consigo: “Quem será ele? E por que fala russo tão bem?”
— Tinham de pegar esse Kant e prender uns três anos em Solôvki por causa dessas provas! — Ivan deixou escapar de repente.
— Ivan! — sussurrou Berlioz sem jeito.
Mas a proposta de enviar Kant a Solôvki não apenas não espantou o estrangeiro, como também o levou ao êxtase.
— Isso, isso mesmo — gritou ele, e seu olho esquerdo, verde, virado para Berlioz, começou a brilhar —, o lugar dele é lá! Pois eu disse a ele uma vez, durante o café da manhã: “O senhor é o mestre, a vontade é sua, mas inventou algo disparatado. Pode ser que seja inteligente, mas é incompreensível demais. Vão gozar da sua cara.”
Berlioz esbugalhou os olhos. “Durante o café da manhã... falou com Kant? O que ele estará tramando?”, pensou.
— Porém — prosseguiu o forasteiro, sem se incomodar com o assombro de Berlioz e virando-se para o poeta —, é impossível enviá-lo a Solôvki, pelo simples fato de que ele, já há cento e poucos anos, se acha em lugares muito mais distantes do que Solôvki, e não dá para tirá-lo de lá de jeito nenhum, garanto ao senhor!
— Uma pena! — replicou o poeta encrenqueiro.
— Também acho uma pena — confirmou o desconhecido com o olhar cintilante, e prosseguiu: — Mas eis a questão que me preocupa: se não há Deus, então pergunta-se, quem administra a vida humana e, em geral, toda a ordem na terra?
— O próprio ser humano — o enfurecido Bezdômny apressou-se em responder essa questão admitidamente não muito clara.
— Perdão — replicou docilmente o desconhecido —, mas para governar, queira ou não queira, é necessário possuir um plano preciso com alguns prazos estabelecidos, nem que seja o mínimo. Permita-me perguntar: como é que pode o ser humano governar, se não apenas não tem condições de fazer qualquer plano, mesmo que seja com um prazo ridiculamente curto de, digamos, uns mil anos, como também é incapaz de garantir sequer seu dia de amanhã? E realmente — o desconhecido virou-se para Berlioz — imagine, por exemplo, que o senhor comece a governar, dispondo de sua vida e da vida de outras pessoas, e então passe a tomar gosto pela coisa e, de repente, o senhor... hum... hum... descobre que está com câncer de pulmão... — o estrangeiro sorriu docemente, parecia que a ideia do câncer lhe dava prazer —, é, câncer — repetiu a palavra sonora e apertou os olhos feito um gato —, pronto, seu governo chegou ao fim! Não lhe interessa o destino de mais ninguém, somente o seu.
“Os parentes começam a mentir para o senhor. Pressentindo algo errado, o senhor recorre a médicos formados, depois a charlatões e até mesmo a videntes. Assim como o primeiro e o segundo, o terceiro não ajuda em nada. Tudo termina tragicamente: aquele que, ainda há pouco, acreditava administrar algo de repente se vê imóvel deitado numa caixa de madeira, e as pessoas que o cercam, compreendendo que não há mais nenhuma utilidade naquele que está deitado, o queimam no forno. E existem casos piores: o sujeito pode decidir ir a Kislovôdsk”, o estrangeiro olhou para Berlioz com os olhos apertados, “uma coisinha de nada, pode-se pensar, mas nem isso ele consegue realizar, assim como não se sabe por que ele de repente resolve escorregar e vai parar debaixo de um bonde! Será que o senhor dirá que foi ele quem planejou isso para si mesmo? Não seria mais razoável pensar que ele foi governado por alguém?” E aqui o desconhecido desatou a soltar estranhas gargalhadas.
Berlioz ouvia com muita atenção a desagradável história do câncer e do bonde, e pensamentos angustiantes começaram a atormentá-lo. “Ele não é estrangeiro... não é estrangeiro...”, pensava, “é um sujeito estranhíssimo... perdão, mas quem é ele?...”
— Estou vendo que o senhor quer fumar, não é? — o desconhecido virou-se de repente para Bezdômny. — Quais prefere?
— O senhor tem diferentes marcas, por acaso? — perguntou sombrio o poeta, que estava sem cigarros.
— Quais prefere? — repetiu o desconhecido.
— Ah, “Nossa Marca”, vai — respondeu Bezdômny, perverso.
O desconhecido retirou imediatamente o porta-cigarros do bolso e ofereceu a Bezdômny:
— “Nossa Marca.”
O editor e o poeta não se impressionaram tanto com o fato de o porta-cigarros conter precisamente cigarros “Nossa Marca”, mas sim com o próprio porta-cigarros. De proporções enormes e ouro de lei, ao ser aberto, sua tampa brilhou com uma luz azul e branca de um triângulo de brilhantes.
Nesse instante, os escritores pensaram diferente. Berlioz: “Não, não é estrangeiro!”, e Bezdômny: “Ah, o diabo que o carregue!...”
O poeta e o dono do porta-cigarros puseram-se a fumar, e o não fumante Berlioz recusou.
“Tenho que retrucar da seguinte forma”, resolveu Berlioz, “é, o ser humano é mortal, ninguém discute isso. Mas a questão é que...”
Só que ele não conseguiu pronunciar essas palavras, pois o estrangeiro começou a dizer:
— É, o ser humano é mortal, mas isso ainda seria só metade da desgraça. O ruim é que às vezes ele é mortal de repente, aí é que mora o perigo! E em geral ele não pode nem dizer o que fará na tarde de hoje.
“Que maneira mais disparatada de apresentar o problema...”, raciocinou Berlioz, e retrucou:
— Ah, vá lá, existe um certo exagero nisso. Sei mais ou menos com certeza como será a tarde de hoje.
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