Teria acrescentado ainda mais uma prece ao fim, não fosse a jovem patroa interrompê-lo com a ordem de ir depressa à estrada e encontrar Heathcliff onde quer que pudesse ter se metido, e trazê-lo imediatamente de volta!

– Quero falar com ele. Tenho que falar, antes de me deitar – disse ela. – O portão está aberto. Deve ter ido longe, porque não respondeu quando chamei, embora gritasse com toda a força dos meus pulmões.

Joseph a princípio objetou, mas ela falava a sério demais para ser contrariada; por fim, ele pôs o chapéu na cabeça e saiu, resmungando. Enquanto isso, Catherine andava de um lado para outro, exclamando:

– Onde será que está... onde poderia estar? O que foi que eu disse, Nelly? Já esqueci. Será que ficou zangado com meu mau humor esta tarde? Diga-me, o que foi que fiz para magoá-lo? Queria tanto que voltasse. Queria muito!

– Tanto barulho por nada! – exclamei, embora eu mesma estivesse inquieta. – Qualquer coisinha a deixa fora de si! Certamente não é motivo de preocupação se Heathcliff decidiu dar um passeio na charneca à luz da lua, ou mesmo ficar deitado sobre o feno no palheiro, ofendido demais para aparecer. Aposto que é lá que está escondido. Vou ver se não o descubro!

Saí para fazer nova busca, mas o resultado foi desapontamento, e a missão de Joseph terminou do mesmo modo.

– Esse rapaz vai de mal a pior! – observou ele, ao voltar. – Deixou o portão escancarado, e o pônei da senhorita saiu pisando na plantação de milho, até o prado! Mas amanhã de manhã o patrão vai ficar furioso, e isso vai ser bem feito. Ele é a paciência em pessoa com gente que não merece... a paciência em pessoa! Mas não vai ser sempre assim. Vocês vão ver, todos vocês! Vão aprender que não vale a pena aborrecer o patrão!

– Encontrou Heathcliff, sua mula? – indagou Catherine. – Procurou por ele, como mandei?

– Teria sido muito melhor procurar o cavalo – respondeu ele. – Teria feito mais sentido. Mas não se pode procurar nem cavalo nem homem numa noite como esta... preta feito breu! E Heathcliff não é o tipo de rapaz que vem quando eu assobio... vai ouvir melhor se vocês chamarem!

Estava mesmo escuro demais para uma noite de verão. Parecia que ia começar a trovejar, e sugeri que nos sentássemos e esperássemos; a chuva que estava para cair com certeza ia trazê-lo de volta para casa.

Catherine, contudo, não se deixou tranquilizar. Continuava andando de um lado para o outro, do portão até a porta, num estado de agitação que não a deixava sossegar; por fim, parou num lado do muro, perto da estrada. Apesar de minhas repreensões, dos trovões que aumentavam e das gotas grandes da chuva que tinha começado a cair ao seu redor, continuou ali, chamando de tempos em tempos, depois aguçando os ouvidos e finalmente irrompendo em lágrimas. Seus acessos de choro eram mais arrebatados que os de Hareton ou qualquer outra criança.

Perto da meia-noite, quando ainda estávamos acordados, a tempestade desabou sobre Heights com toda fúria. Ventava muito e trovejava, e, fosse por um ou pelo outro, uma árvore num canto da casa foi rachada ao meio. Um galho enorme desabou sobre o telhado, derrubando uma parte do cano da chaminé que ficava a leste e lançando um monte de pedras e fuligem na lareira da cozinha.

Pensamos que um raio nos havia atingido, e Joseph caiu de joelhos, implorando ao Senhor que se lembrasse dos patriarcas Noé e Ló e que, como fizera na antiguidade, poupasse os justos, ainda que fulminasse os pecadores.50 Senti que isso não deixava de ser um julgamento da nossa atitude, também. Jonas,51 para mim, era o sr. Earnshaw; e sacudi a maçaneta de seu quarto para me certificar de que ainda estava vivo. Ele respondeu de forma suficientemente audível, o que fez o criado vociferar, de modo ainda mais clamoroso, que uma distinção nítida deveria ser feita entre os santos, como ele, e os pecadores, como seu patrão. Mas a tempestade passou vinte minutos depois, deixando-nos a todos ilesos – à exceção de Cathy, que ficou ensopada, graças à sua obstinação em não se abrigar, em ficar lá fora sem uma touca ou um xale, cabelo e roupas expostos ao aguaceiro.

Ela entrou e se deitou no banco, encharcada como estava, virando o rosto para a parede e escondendo-o nas mãos.

– Bem, senhorita! – exclamei, tocando-lhe o ombro.