O pai Goriot
Honoré
de Balzac
O PAI GORIOT
Tradução
gomes da silveira

Copyright © 1932 by Laura Huxley
Copyright da tradução © by Editora Globo s.a.
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Texto fixado conforme as regras do novo Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa (Decreto Legislativo no 54, de 1995)
Título original:
Le Père Goriot
Editor responsável: Ana Lima Cecilio
Editores assistentes: Erika Nogueira Vieira
Editor de arte: Adriana Bertolla Silveira
Editor digital: Erick Santos Cardoso
Revisão: Lucimara Carvalho
Estampa da capa: papel marmorizado de Luiz Fernando Machado
1a edição, 2014
cip-brasil. catalogação na publicação
sindicato nacional dos editores de livros, rj
B158p
Balzac, Honoré de, 1799-1850
O pai Goriot / Honoré de Balzac ; tradução Gomes da Silveira. - 1. ed. - São Paulo: Globo, 2014.
Tradução de: Le Père Goriot
ISBN 978-85-250-6000-6
1. Romance francês. I. Silveira, Gomes da. II. Título.
14-12998 CDD: 843
CDU: 821.133.1-3
Direitos de edição em língua portuguesa para o Brasil adquiridos por Editora Globo s.a.
Av. Jaguaré, 1485 — 05346-902 — São Paulo — sp
www.globolivros.com.br
Sumário
Capa
Folha de rosto
Créditos
Dedicatória
i
ii
iii
iv
v
vi
Ao grande e ilustre Geoffroy Saint-Hilaire, como testemunho de admiração de seus trabalhos e de seu gênio.
De Balzac
i
Uma pensão burguesa
A sra. Vauquer, nascida de Conflans, é uma velha que há quarenta anos mantém em Paris uma pensão burguesa, estabelecida à Rue Neuve-Sainte-Geneviève entre o Quartier Latin e o Faubourg Saint-Marceau. Essa pensão, conhecida pelo nome de Casa Vauquer, aceita igualmente homens e mulheres, moços e velhos, sem que jamais a maledicência tenha atacado os costumes desse respeitável estabelecimento. É verdade que há trinta anos não se via ali uma moça, e que para um rapaz morar ali era preciso que a família lhe desse uma mesada muito pequena. Em 1819, porém, época em que este drama começa, vivia lá uma pobre moça. Qualquer que seja o descrédito em que tenha caído a palavra drama, pela maneira abusiva e iníqua com que tem sido usada nestes tempos de dolorosa literatura, é necessário empregá-la aqui, não que esta história seja dramática no verdadeiro sentido da palavra, mas porque, terminada a obra, talvez se tenham derramado algumas lágrimas intra e extramuros. Será ela compreendida fora de Paris? A dúvida é permitida. As particularidades desta cena, cheia de observação e de cor local, não podem ser apreciadas senão entre os montículos de Montmartre e as eminências de Montrouge, nesse ilustre vale de caliça sempre prestes a cair e de sarjetas negras de lama — vale cheio de sofrimentos reais, de alegrias muitas vezes falsas, e tão terrivelmente agitado que somente um acontecimento extraordinário é capaz de causar ali uma sensação um pouco duradoura. Encontram-se nele, porém, aqui e ali, dores que a aglomeração dos vícios e das virtudes torna tão grandes e tão solenes que, diante delas, os egoísmos e os interesses se detêm e se compadecem; mas a impressão que delas recebem é como um fruto saboroso que imediatamente devoram. O carro da civilização, semelhante ao do ídolo de Jaggernat, retardado apenas por um coração menos fácil de triturar que os outros e que lhe calça a roda, rapidamente o despedaça e continua sua marcha gloriosa. Assim fareis vós, que, com este livro em vossas mãos alvas, mergulhais numa poltrona macia pensando: “Talvez isso me divirta.” Após terdes lido os secretos infortúnios do pai Goriot, jantareis com apetite, levando vossa insensibilidade à conta do autor, tachando-o de exagero, acusando-o de poesia. Ah! Sabei-o: este drama não é ficção nem romance. All is true: ele é tão verídico que qualquer um pode reconhecer em si mesmo e, talvez em seu próprio coração, os elementos que o compõem.
O prédio da pensão burguesa pertence à sra. Vauquer. Está situado na parte baixa da rue Neuve-Sainte-Geneviève, no ponto em que o terreno se inclina para a rue de l’Arbalète de maneira tão íngreme que raramente os cavalos a sobem ou descem. Dessa circunstância resulta o silêncio que reina nessas ruas, apertadas entre o zimbório do Val-de-Grâce e o zimbório do Panthéon, dois monumentos que alteram as condições da atmosfera, lançando nela tons amarelados e cobrindo tudo ali com uma sombra por efeito dos tons severos que suas cúpulas projetam. Ali as calçadas são secas, as sarjetas não têm lama nem água, a erva cresce ao longo das paredes. O homem mais despreocupado ali se sente constrangido, os transeuntes mostram-se tristes, o ruído de uma carruagem transforma-se num acontecimento, as casas parecem taciturnas, as paredes lembram uma prisão.
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