A consequência é que ele nada deixa para a vida senão seus orgulhos, seus princípios e seu senso comum. Os únicos artistas que eu conheci que são pessoalmente prazerosos são os maus artistas. Os bons dão tudo à sua arte e, consequentemente, são perfeitamente desinteressantes em si mesmos. Um grande poeta, um verdadeiro grande poeta, é a criatura mais sem poesia de todas. Mas os poetas inferiores são de fato fascinantes. Quanto piores forem as suas rimas, mais pitorescos eles serão. O simples fato de ter publicado um livro com sonetos de segunda categoria torna um homem bem irresistível. Ele vive a poesia que não consegue escrever. Os outros escrevem a poesia que não ousam empreender”.

“Eu me pergunto se é realmente assim, Harry”, disse Dorian Gray, despejando um pouco de perfume de um grande frasco de tampa dourada, que estava sobre a mesa, sobre o seu lenço. “Deve ser, se você assim o diz. E agora devo ir. Imogênia me aguarda. Não se esqueça de amanhã. Adeus”.

Enquanto ele deixava a sala, as pesadas pálpebras de lorde Henry se fecharam e ele começou a pensar. Certamente poucas pessoas lhe interessaram tanto quanto Dorian Gray e, ainda assim, a louca adoração do rapaz por outro alguém não lhe trazia a menor pontada de irritação ou de ciúmes. Ele estava satisfeito com isso. Isso o tornava um estudo ainda mais interessante. Ele sempre fora fascinado pelos métodos científicos, mas os temas comuns de pesquisa da ciência lhe pareciam triviais e sem importância. E, assim, ele começara fazendo uma vivisseção em si mesmo e terminara repetindo a experiência nos outros. A vida humana parecia ser para ele a única coisa valiosa a ser investigada. Comparado a ela, não havia nada mais de valor. Era verdade que para aquele que observava a vida em seu curioso cadinho de dor e prazer, não era possível cobrir o rosto com uma máscara de vidro, ou evitar que os sulfurosos fumos perturbassem o seu cérebro, tornando a imaginação turva com monstruosas fantasias e sonhos deformados. Havia venenos tão sutis que, para saber suas propriedades, era necessário se envenenar com eles. Havia doenças tão estranhas que alguém teria de passar por elas, se buscasse entender sua natureza. E, mesmo assim, que grande recompensa se recebia! Quão maravilhoso o mundo inteiro se pareceria! Notar a curiosa e intrincada lógica da paixão, e a vida colorida e emocional do intelecto... observar onde se encontraram e onde se separaram, em que ponto se tornaram una e em qual ponto entraram em discórdia... havia um prazer nisso! Que importa a que custo? Ninguém poderia pagar um preço tão alto por qualquer sensação.

Ele sabia – e a ideia trouxera-lhe um lampejo de prazer em seus olhos de ágata escura – que era por meio de certas palavras dele, palavras musicais ditas com expressão musical, que a alma de Dorian Gray se voltara para aquela garota pura, inclinando-se em reverência por ela. O rapaz era a própria criação dele, em grande parte. Ele o fizera prematuro. Isso era alguma coisa.