(Sai a rapariga) Senta-te.

VICTOR — Estou bem assim.

YERMA — (Chamando) — João!

VICTOR — Venho despedir-me. (Estremece levemente, mas logo torna a serenar)

YERMA — Vais com teus irmãos?

VICTOR — Assim o quer meu pai.

YERMA — Já deve estar velho.

VICTOR — Está: muito velho. (Pausa)

YERMA — Fazes bem em mudar de campo.

VICTOR — Todos os campos são iguais.

YERMA — Não. Eu iria para muito longe.

VICTOR — Tudo é o mesmo. As mesmas ovelhas têm a mesma lã.

YERMA — Para os homens, sim; mas nós mulheres somos outra coisa. Nunca ouvi dizer a um homem, comendo: como são boas estas maçãs! Ides ao que é vosso, sem reparardes nas delicadezas. Por mim, posso dizer: detesto a água destes poços.

VICTOR — Pode ser. (A cena está numa suave penumbra)

YERMA — Victor.

VICTOR — Fala.

YERMA — Por que te vais? Aqui, as pessoas te querem.

VICTOR — Portei-me bem. (Pausa)

YERMA — Portaste-te bem. Quando eras rapazote, levaste-me uma vez nos braços, não te lembras? Nunca se sabe o que vai acontecer.

VICTOR — Tudo muda.

YERMA — Algumas coisas não mudam. Há coisas fechadas dentro de paredes, que não podem mudar porque ninguém as ouve.

VICTOR — Assim é. (Aparece a 2ª Irmã e dirige-se lentamente para a porta, onde fica, firme, iluminada pela última claridade da tarde) YERMA — Mas se saíssem de repente, e gritassem, encheriam o mundo.

VICTOR — Não adiantaria nada. A acéquia em seu lugar, o rebanho no redil, a lua no céu e o homem com seu arado.

YERMA — Que imensa pena, não poder sentir os sentimentos dos velhos! (Ouve-se o longo e melancólico som dos búzios dos pastores)

VICTOR — Os rebanhos.

JOÃO — (Entra) — Já estás de partida?

VICTOR — E quero passar o porto antes do amanhecer.

JOÃO — Levas alguma queixa de mim?

VICTOR — Não. Foste bom pagador.

JOÃO — (a Yerma) — Comprei-lhe os rebanhos.

YERMA — É?

VICTOR — (a Yerma) — São teus.

YERMA — Não sabia.

JOÃO — (Satisfeito) — Pois é.

VICTOR — Teu marido há de ver sua fazenda repleta.

YERMA — O fruto vem às mãos do trabalhador que o procura. (A Irmã, que está à porta, vem para dentro)

JOÃO — Já não temos onde meter tantas ovelhas.

YERMA — (Sombria) — A terra é grande. (Pausa)

JOÃO — Iremos juntos até o arroio.

VICTOR — Desejo a esta casa a maior felicidade. (Dá a mão a Yerma)

YERMA — Deus te ouça! Saúde! (Victor deixa-o passar e, a um movimento imperceptível de Yerma, volta-se)

VICTOR — Dizias alguma coisa?

YERMA — (Drástica) — Disse-te “Saúde”!

VICTOR — Obrigado. (Saem. Yerma continua imóvel, angustiada, mirando a mão que deu a Victor. Dirige-se rapidamente para a esquerda e apanha um xale)

2ª RAPARIGA — (em silêncio, tapando-lhe a cabeça) — Vamos.

YERMA — Vamos. (Saem sigilosamente. A cena está quase na escuridão. Entra a Irmã mais velha com uma candeia que não deve dar ao teatro luz nenhuma senão a natural que leva. Dirige-se ao fim da cena, buscando Yerma. Soam os búzios dos rebanhos)

1ª CUNHADA — (em voz baixa) — Yerma! (Entra a segunda Cunhada. Miram-se as duas e dirigem-se para a porta)

2ª CUNHADA — (mais alto) — Yerma!

1ª CUNHADA — (dirigindo-se à porta e com voz imperiosa) — Yerma! (Ouvem-se os búzios e as cornetas dos pastores. A cena está escuríssima. Cortina)




Terceiro Ato




PRIMEIRO QUADRO


(Casa de Dolores, a rezadeira. Vai amanhecendo, Entra Yerma com Dolores e duas Velhas)


DOLORES — Foste corajosa.

1ª VELHA — Não há nada no mundo como a força do desejo.

2ª VELHA — Mas o cemitério estava escuro demais.

DOLORES — Muitas vezes tenho feito estas orações no cemitério com mulheres que ansiavam por crianças, e todas tiveram medo. Todas, menos tu.

YERMA — Eu vim pelo resultado.