Enquanto ela discorria minuciosamente sobre os talentos de seus filhos e sobre a beleza de suas filhas, ou relatava as diferentes situações e opiniões – John estava em Oxford, Edward, em Merchant Taylors’, e Willian, ao mar –, sendo todos eles mais amados e respeitados em suas diferentes localizações do que quaisquer outros três seres jamais seriam, a senhora Allen não tinha informação similar a dar, nenhum triunfo semelhante a pressionar contra o ouvido relutante e incrédulo de sua amiga, assim sendo forçada a se sentar e ouvir a todas essas efusões maternais, consolando-se, porém, com a descoberta que seu olho afiado logo realizou: que o laço da peliça da senhora Thorpe não tinha nem metade da beleza que o dela.
“Lá vêm minhas queridas garotas”, exclamou a senhora Thorpe, apontando para três mulheres de aparência esperta que, de braços dados, seguiam em sua direção. “Minha querida senhora Allen, quero apresentá-las. Ficarão deliciadas em vê-la: a mais alta é Isabella, a mais velha. Ela não é uma fina e jovem mulher? As outras são bem admiradas também, mas acho que Isabella é a mais bonita”.
As senhoritas Thorpe foram apresentadas, e a senhorita Morland, que tinha sido esquecida por pouco tempo, foi igualmente apresentada. O nome pareceu surpreender a todas, e depois de lhe falar com grande civilidade, a jovem dama primogênita observou em voz alta para as demais, “Como a senhorita Morland se parece demais com seu irmão!”
“De fato, o próprio retrato dele!”, exclamou a mãe – e “eu deveria reconhecê-la em qualquer lugar, pela sua irmã!” foi repetido por todas elas, duas ou três vezes. Por um momento Catherine ficou surpresa. Mas a senhora Thorpe e suas filhas mal tinham começado a história de seu relacionamento com o senhor James Morland, quando ela se lembrou de que seu irmão mais velho já tinha formado intimidade com um jovem de seu próprio colégio, de nome Thorpe, e que ele já tinha passado a última semana das férias natalinas na casa do amigo, próximo a Londres.
Sendo tudo explicado, muitas coisas gentis foram ditas pelas senhoritas Thorpe, como o desejo delas de se tornarem melhor relacionadas com Catherine, de serem consideradas já como amigas, devido à amizade de seus irmãos etc. Tudo Catherine ouvia com prazer e respondia com todas as bonitas expressões que ela podia comandar. E, como primeira prova de amizade, ela logo foi convidada a aceitar um braço da senhorita Thorpe primogênita e dar uma volta com ela pelo salão. Catherine ficou deliciada com essa extensão dos seus relacionamentos em Bath, e quase se esqueceu do senhor Tilney enquanto falava com a senhorita Thorpe. A amizade é, certamente, o melhor bálsamo para as dores do amor frustrado.
A conversa logo se voltou para estes assuntos, dos quais a discussão aberta geralmente aperfeiçoa uma súbita intimidade entre duas jovens damas, tais como vestidos, bailes, flertes e esquisitices. A senhorita Thorpe, porém, sendo quatro anos mais velha que a senhorita Morland, e pelo menos quatro anos mais informada, tinha uma vantagem decididamente ampla em discutir tais temas. Ela podia comparar os bailes de Bath com os de Tunbridge, suas modas com as de Londres; podia corrigir as opiniões de sua nova amiga em muitos artigos do bom vestir; podia descobrir um flerte entre qualquer cavalheiro e dama que apenas sorrissem um para o outro; identificar um estranho por meio da espessura de uma multidão. Estes poderes receberam a devida admiração de Catherine, a quem eles eram inteiramente novos. E o respeito que eles naturalmente inspiravam poderiam ser muito grandes para familiaridade, não fosse a fácil alegria dos modos da senhorita Thorpe e suas frequentes expressões de prazer nesse relacionamento, atenuando, assim, qualquer sentimento de pavor, e deixando apenas uma terna afeição. Sua crescente ligação não se satisfaria com meia dúzia de voltas pela casa de bombas, mas exigiria, quando fossem embora juntas, que a senhorita Thorpe acompanhasse a senhorita Morland até a porta da casa do senhor Allen, que elas se separassem com o mais afetuoso e extenso aperto de mãos, depois de saberem, para alívio de ambas, que se encontrariam no teatro à noite, e que rezariam na mesma capela, na manhã seguinte. Catherine então disparou escada acima e observou a senhorita Thorpe prosseguir pela rua através da janela da sala de vestir. Admirou o gracioso espírito de seu caminhar, o ar moderno de sua figura e de seu vestido, e sentiu-se grata, como bem poderia, pela sorte de ter conseguido uma amiga dessas.
A senhora Thorpe era uma viúva e não das mais ricas. Ela era uma mulher bem-humorada e de boas intenções, e uma mãe bem indulgente. Sua filha mais velha tinha uma grande beleza pessoal e as mais jovens, ao fingirem ser tão belas quanto à irmã, imitavam seu ar e se vestiam no mesmo estilo, fazendo isso muito bem.
Este breve relato da família pretende suplantar a necessidade de uma exposição minuciosa da própria senhora Thorpe, de suas aventuras e sofrimentos passados, os quais poderiam, ao invés, ocupar bem três ou quatro capítulos seguintes, nos quais a falta de valor de lordes e advogados seria evidenciada e as conversas que se passaram vinte anos antes seriam detalhadamente repetidas.
CAPÍTULO 5
Naquela noite, no teatro, Catherine não estava tão empenhada em retribuir os meneios e os sorrisos da senhorita Thorpe – embora estes certamente exigissem muito do seu lazer – quanto em procurar com olhos inquisidores pelo senhor Tilney em cada assento que sua visão podia alcançar. Mas ela o procurou em vão. O senhor Tilney não gostava tanto da peça quanto da casa de bombas. Ela esperava ter mais sorte no dia seguinte e, quando seus desejos por um bom tempo foram respondidos com a visão de uma bela manhã, ela não tinha dúvida disto, pois um belo domingo, em Bath, esvaziara todas as casas de seus habitantes, e o mundo inteiro aparecera a desfilar e dizer aos seus conhecidos como aquele dia era belo.
Assim que o serviço divino terminou, os Thorpe e os Allen se juntaram ansiosamente. Depois de ficarem o tempo suficiente na casa de bombas e descobrirem que a multidão estava insuportável e que não havia um rosto gentil a ser visto – o que todos descobrem a cada domingo, por toda a estação – eles se apressaram para o Crescent, a fim de respirar o ar fresco em melhor companhia. Neste local, Catherine e Isabella, de braços dados novamente, saborearam a doçura da amizade em uma conversa aberta. Falaram bastante e com muito prazer. Mas, novamente, Catherine estava desapontada em sua esperança de rever seu companheiro. Ele não estava em lugar algum para ser encontrado. Cada busca por ele era frustrada. Nas reuniões matinais ou festas vespertinas, nos Salões Superiores ou Inferiores, nos bailes de gala ou não, ele não se encontrava.
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