E saiba que, se vier a ceder a um pensamento criminoso, a viúva do sr. d’Aiglemont entraria para um convento, na Itália ou na Espanha. O infortúnio quis que falássemos de nosso amor. Talvez essas confissões fossem inevitáveis; mas que seja a última vez que nossos corações vibraram tão fortemente. Amanhã, você fingirá receber uma carta que o chama à Inglaterra e deixaremos de nos ver para sempre.

Esgotada pelo esforço de dizer essas palavras, Júlia sentiu os joelhos dobrarem-se, um frio mortal apoderou-se dela e, por um pensamento muito feminino, sentou-se para não cair nos braços de Arthur.

– Júlia!, gritou Lorde Grenville.

Esse grito penetrante ressoou como um trovão. Esse dilacerado clamor exprimiu tudo o que o apaixonado, mudo até então, não pudera dizer.

– Ei, que houve com ela?, perguntou o general que, ao ouvir esse grito, apressou o passo e logo se achou diante dos dois enamorados.

– Não foi nada, disse Júlia com um admirável sangue-frio que a fineza natural das mulheres lhes permite ter muitas vezes nas grandes crises da vida. O frio desta nogueira quase fez-me perder a consciência e o doutor assustou-se. Não sou para ele como uma obra de arte ainda não acabada? Talvez tenha se assustado de vê-la destruída...

Tomou audaciosamente o braço de Lorde Grenville, sorriu para o marido, olhou a paisagem antes de deixar o alto dos rochedos e conduziu seu companheiro de viagem pegando-lhe a mão.

– Este é certamente o mais belo lugar que vimos, disse ela. Jamais o esquecerei. Veja, Vítor, que distâncias, que amplidão e que variedade! Este lugar me faz pensar no amor.

Rindo com um riso quase convulsivo, mas rindo de maneira a enganar o marido, ela correu alegremente pelos caminhos escarpados e desapareceu.

– Tão breve, não é mesmo?... disse ela ao ver-se longe do sr. d’Aiglemont. Dentro de um instante, meu amigo, não poderemos mais ser e nunca mais seremos nós mesmos; enfim, deixaremos de viver...

– Vamos devagar, respondeu Lorde Grenville, as carruagens ainda estão distantes. Caminharemos juntos e, se pudermos pôr palavras no olhar, nossos corações viverão um momento a mais.

Foram andando pelo caminho à beira d’água, às últimas luzes do entardecer, quase silenciosamente, dizendo vagas palavras, doces como o murmúrio do Loire, mas que revolviam a alma. O sol, ao se pôr, envolveu-os com reflexos rubros antes de desaparecer, imagem melancólica de seu fatal amor. Inquieto por não reencontrar a carruagem no lugar onde havia estacionado, o general seguia ou precedia os dois enamorados, sem intrometer-se na conversa. A nobre e delicada conduta que Lorde Grenville demonstrara durante a viagem havia eliminado as suspeitas do marquês, que há algum tempo deixava a esposa livre, confiando na fé púnica do lorde-doutor. Júlia e Arthur caminharam mais um pouco, na triste e dolorosa união de seus corações machucados. Há pouco, ao subirem as escarpas de Montcontour, ambos haviam sentido uma vaga esperança, uma inquieta felicidade que não ousavam indagar; mas ao descerem e seguirem junto ao rio, haviam derrubado o frágil edifício construído na imaginação, e sobre o qual nem ousavam respirar, como as crianças que preveem a queda de seus castelos de cartas. Estavam sem esperança. Na mesma noite, Lorde Grenville partiu. O último olhar que lançou a Júlia provou infelizmente que, desde o momento em que a simpatia lhes revelara a extensão de uma paixão tão forte, ele tivera razão de desconfiar de suas possibilidades.

No dia seguinte, quando o sr. d’Aiglemont e a esposa estavam sentados no fundo da carruagem, sem seu companheiro de viagem, percorrendo com rapidez a mesma estrada por onde em 1814 passara a marquesa, então ignorante do amor e quase amaldiçoando sua constância, ela reencontrou inúmeras impressões esquecidas. O coração tem uma memória que é só dele. Uma mulher incapaz de recordar os acontecimentos mais graves irá lembrar-se por toda a vida das coisas que importam a seus sentimentos. Assim, Júlia teve uma perfeita lembrança até mesmo de detalhes frívolos. Reconheceu com felicidade os mais leves acidentes de sua primeira viagem e inclusive pensamentos que lhe haviam ocorrido em certos trechos da estrada. Vítor, que voltara a ficar apaixonado pela mulher desde que ela recobrara o frescor da juventude e toda a sua beleza, estreitou-se junto a ela à maneira dos enamorados. Quando tentou tomá-la nos braços, ela afastou-se suavemente e encontrou algum pretexto para evitar essa inocente carícia. Logo em seguida, teve horror do contato de Vítor, de quem sentia e partilhava o calor pela maneira como estavam sentados.