Lança-me olhares acusadores que não sustento. Às vezes temo encontrar nela um tribunal em que serei condenada sem ser ouvida. Praza aos céus que o ódio não se instale um dia entre nós! Oh Deus!, abra-me antes o túmulo, faça-me morrer em Saint-Lange! Quero voltar ao mundo e encontrar minha outra alma, para ser inteiramente mãe! Oh, perdão, senhor, estou louca! Estas palavras sufocavam-me e precisava dizê-las. Ah! o senhor também chora! Não me desprezará. – Helena! Helena! Vem cá, minha filha!, exclamou com uma espécie de desespero ao ouvir a filha que voltava de seu passeio.
A menina chegou rindo e gritando; trazia uma borboleta que havia pego; mas, vendo a mãe em lágrimas, calou-se, ficou junto dela e deixou-se beijar na testa.
– Ela vai ser muito bonita, disse o padre.
– É a cara do pai, respondeu a marquesa abraçando a filha com uma expressão calorosa, como para pagar uma dívida ou para apagar um remorso.
– A senhora está quente, mamãe.
– Vai, deixa-nos, meu anjo, respondeu a marquesa.
A menina afastou-se sem opor-se, sem olhar a mãe, quase feliz por fugir de um rosto triste e compreendendo já que os sentimentos que nele se exprimiam lhe eram contrários. O sorriso é o apanágio, a língua, a expressão da maternidade. A marquesa não podia sorrir. Olhando para o padre, corou: quisera mostrar-se mãe, mas nem ela nem a filha tinham sabido mentir. De fato, os beijos de uma mulher sincera têm um mel divino que parece pôr nessa carícia uma alma, um fogo sutil que penetra o coração. Os beijos despidos dessa unção saborosa são ásperos e secos. O padre percebera essa diferença: pôde sondar o abismo que há entre a maternidade da carne e a maternidade do coração. Assim, após ter lançado a essa mulher um olhar inquisidor, disse-lhe:
– A senhora tem razão, seria melhor que estivesse morta.
– Ah! vejo que o senhor compreende meus sofrimentos, ela respondeu, pois, sendo padre cristão, adivinha e aprova as funestas resoluções que eles me inspiraram. Sim, eu quis matar-me; mas não tive a coragem necessária para realizar meu propósito. Meu corpo acovardou-se quando minha alma era forte, e quando minha mão não mais tremia, minha alma vacilava! Ignoro o segredo desses combates e dessas alternativas. Sem dúvida, sou muito tristemente mulher, sem persistência em minhas vontades, com força apenas para amar. Desprezo-me! À noite, quando todos na casa dormiam, dirigia-me corajosamente até o lago; ao chegar, minha frágil natureza tinha horror à destruição. Confesso-lhe minhas fraquezas. De volta ao leito, sentia vergonha de mim, tornava-me de novo corajosa. Num desses momentos tomei láudano; mas sofri e não morri. Pensei ter bebido tudo o que continha o frasco, e não fui além da metade.
– A senhora está perdida, disse o cura gravemente e numa voz cheia de lágrimas. A senhora voltará à sociedade e a enganará; nela buscará, nela encontrará o que julga ser uma compensação a seus males; depois sofrerá, um dia, o castigo de seus prazeres...
– Pensa que entregarei, ela exclamou, ao primeiro patife que souber desempenhar a comédia de uma paixão, as últimas, as mais preciosas riquezas de meu coração e corromper minha vida por um momento de duvidoso prazer? Não! Minha alma será consumida por uma chama pura. Senhor, todos os homens têm a sensualidade de seu sexo; mas aquele que tem a alma sensual, e assim satisfaz a todas as exigências de nossa natureza, cuja melodiosa harmonia jamais se comove senão sob a pressão dos sentimentos, esse não se encontra duas vezes em nossa existência. Meu futuro é horrível, eu sei: a mulher não é nada sem o amor, a beleza não é nada sem o prazer; mas não reprovaria o mundo minha felicidade se ela voltasse a apresentar-se a mim? Devo à minha filha uma mãe honrada. Ah! fui jogada num círculo de fogo do qual não posso sair sem ignomínia. Os deveres de família, cumpridos sem recompensa, me aborrecerão; amaldiçoarei a vida; mas minha filha terá ao menos uma digna aparência de mãe. Entregar-lhe-ei tesouros de virtude, para substituir os tesouros de afeição de que a terei frustrado. Não desejo sequer viver para saborear os prazeres que a felicidade dos filhos proporciona às mães. Não acredito na felicidade. Qual será o destino de Helena? O meu, com certeza. Que meios têm as mães de garantir a suas filhas que o homem a quem as entregam será um esposo segundo seu coração? Vocês amaldiçoam pobres criaturas que se vendem por uns vinténs a um homem que passa; a fome e a necessidade absolvem essas uniões efêmeras.
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