As faces largas e fortemente coradas ofereciam tons castanhos e amarelos que denotavam um vigor extraordinário. Sua fisionomia, dessas que a bravura marcou com um sinete, era o tipo que o artista hoje busca quando quer representar um dos heróis da França imperial. O cavalo banhado de suor, e cuja cabeça agitada exprimia uma extrema impaciência, com as duas patas dianteiras afastadas e paradas na mesma linha sem que uma ultrapassasse a outra, fazia flutuar as longas crinas da espessa cauda; e seu devotamento oferecia uma imagem material daquele que seu mestre tinha pelo imperador. Ao ver o namorado tão ocupado em captar os olhares de Napoleão, Júlia sentiu ciúme por um instante, pensando que ele ainda não havia olhado para ela. De repente, uma ordem é pronunciada pelo soberano, Vítor esporeia o cavalo e parte a galope; mas a sombra de um marco projetada na areia assusta o animal, que se amedronta, recua e empina-se tão bruscamente que o cavaleiro parece em perigo. Júlia lança um grito, empalidece; todos a olham com curiosidade; ela não vê ninguém; seus olhos estão fixos nesse cavalo impetuoso que o oficial castiga enquanto corre a levar as ordens de Napoleão. Essas cenas atordoantes absorviam tanto Júlia que, sem dar-se conta, ela havia se agarrado ao braço do pai, a quem revelava involuntariamente seus pensamentos pela pressão mais ou menos intensa dos dedos. Quando Vítor esteve a ponto de ser derrubado pelo cavalo, ela agarrou-se mais violentamente ainda ao pai, como se ela própria estivesse em perigo de cair. O velho contemplava com sombria e dolorosa inquietude o rosto expressivo da filha, e sentimentos de piedade, ciúme e até mesmo lástima insinuaram-se em todas as suas rugas contraídas. E, quando o brilho não habitual dos olhos de Júlia, o grito que ela dera e o movimento convulsivo de seus dedos acabaram por revelar-lhe um amor secreto, ele certamente deve ter tido algumas tristes revelações do futuro, pois seu semblante adquiriu uma expressão sinistra. Nesse momento, a alma de Júlia parecia ter passado para a do oficial. Um pensamento mais cruel que todos os que haviam assustado o velho crispou os traços de seu rosto, quando viu d’Aiglemont, ao passar diante deles, trocar um olhar de cumplicidade com Júlia, que tinha os olhos úmidos e cuja tez adquirira uma vivacidade extraordinária. Bruscamente, ele levou a filha para o jardim das Tulherias.
– Mas meu pai, dizia ela, ainda há na praça do Carrossel regimentos que vão manobrar.
– Não, filha, todas as tropas desfilaram.
– Acho que está enganado, meu pai. O sr. d’Aiglemont teve de fazê-las avançar...
– Mas não me sinto bem, minha filha, e não quero ficar.
Não foi difícil para Júlia crer em seu pai quando pôs os olhos em seu rosto, ao qual inquietudes paternas davam um ar abatido.
– Está sofrendo muito?, perguntou ela com indiferença, escondendo a preocupação.
– Cada dia não é um dia de clemência para mim?, respondeu o velho.
– Não venha afligir-me de novo falando de sua morte. Eu estava tão alegre! Por favor, afaste essas ideias negras e ruins!
– Ah!, exclamou o pai soltando um suspiro, criança mimada!, os melhores corações são às vezes bem cruéis. Dedicar-vos nossa vida, só pensar em vocês, preparar vosso bem-estar, sacrificar nossos gostos a vossas fantasias, adorar-vos, dar-vos nosso próprio sangue, isso não é nada? Ai, é verdade, vocês aceitam tudo com indiferença. Para obter sempre vossos sorrisos e vosso desdenhoso amor, seria preciso ter a força de Deus. Depois, enfim, um outro aparece! Um namorado, um marido nos arrebatam vosso coração.
Espantada, Júlia olhou para o pai, que caminhava lentamente e dirigia a ela olhares sem brilho.
– Vocês se ocultam de nós, ele prosseguiu, mas talvez também de vocês mesmos...
– Que está dizendo, meu pai?
– Penso, Júlia, que tens segredos para mim.
– Estás amando, retomou vivamente o velho ao perceber que a filha corava. Ah! eu esperava ver-te fiel a teu velho pai até a morte, esperava conservar-te junto a mim feliz e radiosa!, admirar-te como eras até pouco tempo atrás. Ignorando tua sorte, teria podido crer num futuro tranquilo para ti; mas agora é impossível que eu tenha uma esperança de felicidade para tua vida, pois amas o coronel mais do que se ama um primo. Não posso mais duvidar disso.
– Por que me seria proibido amá-lo?, ela perguntou com uma viva expressão de curiosidade.
– Ah!, minha Júlia, não me compreenderias, respondeu o pai suspirando.
– Diga assim mesmo, ela retrucou, deixando escapar um movimento de rebeldia.
– Pois bem, minha filha, escuta-me! As moças com frequência criam imagens nobres, deslumbrantes, figuras totalmente ideais, e forjam ideias quiméricas acerca dos homens, dos sentimentos, do mundo; depois atribuem inocentemente a um caráter as perfeições que sonharam, e entregam-se a isso; amam no homem que escolheram essa criatura imaginária; porém, mais tarde, quando não há mais tempo de livrar-se do infortúnio, a enganadora aparência que embelezaram, seu primeiro ídolo, transforma-se enfim num esqueleto odioso. Júlia, preferiria saber-te apaixonada por um velho do que ver-te amando o coronel. Ah! se pudesses transportar-te dez anos adiante na vida, reconhecerias o valor de minha experiência. Conheço Vítor: sua alegria é uma alegria sem espírito, uma alegria de caserna; ele é perdulário e sem talento. É um desses homens que o céu criou para fazer e digerir quatro refeições por dia, dormir, amar a primeira que aparece, e combater. Ele não entende a vida. Seu bom coração, pois ele tem bom coração, talvez o leve a dar seu dinheiro a um infeliz, a um companheiro; mas ele é negligente, mas ele não é dotado daquela delicadeza de coração que nos faz escravos da felicidade de uma mulher; mas ele é ignorante, egoísta... Há muitos mas.
– Entretanto, meu pai, ele deve ter espírito e meios para ter chegado a coronel...
– Minha querida, Vítor permanecerá coronel pelo resto da vida. Ainda não encontrei ninguém que me parecesse digno de ti, retomou o velho pai com certo entusiasmo.
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