Elogiei enfaticamente sua residência e o bom gosto em que vivia. Lá permaneci até que, na passagem seguinte da ilha voadora, acenei para que descessem a cadeirinha e subi. Em Labuta, me informaram que a próxima parada seria na ilha de Glubbdubdrib, e o que me contaram sobre os fantásticos seres que a habitavam me fez ter vontade de conhecê-la.

Feiticeiros, fantasmas e imortais

Glubbdubdrib fica ao norte do continente que forma o reino de Labuta e a menos de 150 milhas náuticas de Lagado. Segundo entendi, o nome da ilha significa “a terra dos feiticeiros”.

Logo que chegamos, fui visitar o castelo, que na verdade era a residência do chefe da tribo dos feiticeiros. Fiquei horrorizado com os guardas que se postavam de um lado e outro da alameda da entrada. Acontece que a horrorosa expressão no rosto daqueles guardas era de quem não pertencia a este mundo havia anos...

Mal entrei, fui conduzido por um desses seres sobrenaturais à presença do rei. Sua Majestade era um homem alto, moreno, de olhos estranhamente brilhantes, cercados de cavernosas olheiras. Tive a certeza de que ele era um ser humano igual a mim, ao apertar sua mão – que ele me estendeu jovialmente, dispensando a formalidade devida às majestades. O toque quente de sua pele me tranquilizou.

A seguir, entretanto, ele estalou os dedos, e o guarda que me havia levado como que se evaporou subitamente no ar.

– Não se preocupe... – disse ele. – Há muitos outros como ele para nos servir, no reino dos mortos.

Disse aquilo com uma naturalidade que me deu arrepios. Mas fez questão de que eu me sentasse ao seu lado e relatasse todas as minhas viagens e aventuras. Escutou por horas, bastante interessado. Vez por outra, algum espectro doméstico atravessava o salão. Percebi que esses seres não caminhavam com os pés no chão. De fato, não podia deixar de me sobressaltar, por estar cercado de servos tão espantosos.

Ao final de nossa conversa, Sua Majestade ofereceu-se para convocar algum falecido a quem eu tivesse o desejo de perguntar qualquer coisa. Apesar do medo que isso me causou, não resisti e pedi que chamasse Alexandre Magno, o grande guerreiro que, da Macedônia, conquistou o mundo de sua época. Com um estalo de dedos, Sua Majestade trouxe-o ao salão. Aí foi a vez de Alexandre contar suas histórias, o que fez de muito boa vontade... Foi inesquecível escutar da própria boca do imperador grego a sua versão das batalhas, das intrigas políticas e de seus escandalosos amores.

Depois de alguns dias, o ambiente lúgubre da ilha já começava a me dar nos nervos. Aconselharam-me a ir de barco até uma ilha vizinha, chamada Luggnagg, por onde Labuta passaria voando, em breve. Assim fiz. Luggnagg era conhecida também como a Ilha dos Imortais.

No alto dos morros, em casebres rústicos, moravam esses seres, sem contato com os demais habitantes da ilha. A princípio, me encantei com a existência de pessoas que não precisavam temer a morte. Aos poucos, entretanto, foram me esclarecendo sobre o padecimento sem fim a que estavam condenados...

Todos sentiam-se exaustos, com o peso dos séculos sobre seus pensamentos, e impedidos de descansar. Não falavam mais com ninguém, não tinham vontade de fazer mais nada, já que para eles tanto fazia realizar, fosse o que fosse, hoje, amanhã ou daqui a mil anos. Viviam, enfim, à espera de uma salvação que não viria... nunca!

Confesso que, de todas as coisas extraordinárias que conheci naquelas ilhas, foram exatamente os imortais que mais me impressionaram. Senti uma angústia profunda, apenas por saber de sua existência. Creio que esse sentimento foi o que fez crescer dentro de mim o desejo de retornar à minha própria terra, ao meu lar.

Quando Labuta passou de novo pelos céus, embarquei nela, decidido a empreender a viagem de volta.