e, caso ele se recusasse a responder francamente e sem reservas (supus que ele acharia melhor não), eu lhe daria uma nota de vinte dólares a mais do que lhe devia, e diria que não mais precisava dos seus serviços; mas, se pudesse ajudá-lo de outro modo, ficaria feliz em fazê-lo; especialmente se ele desejasse voltar à sua terra natal, fosse lá onde fosse, eu o ajudaria com as despesas. Além disso, se ao chegar em casa se visse necessitado de ajuda, bastaria me escrever que teria uma resposta.
O dia seguinte chegou.
“Bartleby”, chamei-o gentilmente por detrás de seu biombo.
Não houve resposta.
“Bartleby”, disse num tom ainda mais gentil, “venha cá! Não vou pedir que faça nada que você ache melhor não fazer. Só quero conversar”.
Ele apareceu em silêncio diante de mim.
“Diga-me onde você nasceu, Bartleby.”
“Acho melhor não.”
“Você poderia me contar qualquer coisa a seu respeito?”
“Acho melhor não.”
“Mas qual o obstáculo para você poder conversar comigo? Sou seu amigo.”
Ele não me olhou enquanto eu falava, mas mantinha o olhar fixo no busto de Cícero, bem atrás de onde eu estava sentado, a uns centímetros da minha cabeça.
“Qual é a sua resposta, Bartleby?”, eu disse, depois de esperar bastante tempo por uma resposta, durante o qual a sua expressão teria permanecido impassível não fora um fraco tremor nos lábios pálidos.
“Acho melhor não dar nenhuma resposta no momento”, ele disse, retirando-se para o seu eremitério.
Confesso que fui um pouco fraco, mas os seus modos naquela ocasião me irritaram. Não apenas assumiu um ar calmo de desprezo, mas também a sua impertinência parecia uma ingratidão, considerando o bom tratamento e a tolerância que lhe dispensara.
Outra vez estava eu sentado pensando no que deveria fazer. Apesar de ofendido pelo seu comportamento e resolvido a demiti-lo quando chegasse ao meu escritório, sentia uma espécie de agouro invadindo o meu coração, que me impedia de cumprir o meu propósito, dizendo-me que só um canalha se atreveria a pronunciar uma palavra amarga contra o mais desamparado dos homens. Por fim, puxei a minha cadeira para trás do biombo, sentei-me e disse:
“Bartleby, não é preciso contar a sua história, mas rogo-lhe, como amigo, que obedeça ao máximo os costumes desse escritório. Diga agora que vai me ajudar a verificar os documentos amanhã ou nos próximos dias. Em suma, diga agora que dentro de um ou dois dias você se tornará sensato… prometa, Bartleby”.
“Acho melhor não ser sensato no momento”, foi a sua resposta um tanto soturna.
Naquele momento as portas dobráveis se abriram e Nippers se aproximou. Parecia estar padecendo de uma noite mal dormida, acrescida de certa má digestão mais severa do que de costume. Ouviu as últimas palavras de Bartleby.
“Acha melhor não, hein?”, rangeu Nippers, dirigindo-se a mim. “Eu o acharia melhor, se fosse o senhor, eu o acharia melhor, eu lhe daria achismos melhores, a essa mula teimosa! O que é, senhor, afinal, que ele acha melhor não fazer desta vez?”
Bartleby não mexeu um dedo.
“Sr. Nippers”, eu disse, “acho melhor o senhor sair agora”.
Não sei por que, eu também tinha adquirido o hábito de usar a expressão “acho melhor”, mesmo nas ocasiões menos adequadas. Tremia ao pensar que o contato com o escrivão tivesse afetado seriamente meu estado mental. Que outra aberração mais profunda ainda poderia ocasionar? Essa preocupação foi importante para eu me decidir a tomar umas providências drásticas.
Enquanto Nippers se retirava, muito aborrecido e mal-humorado, Turkey se aproximou, afável e respeitoso.
“Com todo o respeito, senhor”, disse, “ontem estive pensando sobre Bartleby e creio que se ele achasse melhor tomar um copo de uma boa cerveja por dia, seria muito bom para a sua recuperação e o habilitaria a ajudar a conferir os seus documentos”.
“Então você também adotou a expressão”, eu disse, inquieto.
“Com todo o respeito, que expressão, senhor?”, perguntou Turkey, comprimindo-se respeitosamente no exíguo espaço atrás do biombo, fazendo com que eu esbarrasse no escrivão. “Que expressão, senhor?”
“Acho melhor eu ficar sozinho aqui”, disse Bartleby, ofendido por ter sido molestado na sua privacidade.
“Essa expressão, Turkey”, eu disse. “Essa!”
“Ah! Acho melhor? Ah, sim! Esquisita. Nunca a uso. Mas como dizia, senhor, se ele achasse melhor…”
“Turkey”, interrompi, “queira se retirar, por favor”.
“Ah! claro. Se o senhor acha melhor.”
Quando abriu as portas dobráveis para sair, Nippers, sentado à sua mesa, ao me ver perguntou se eu achava melhor copiar um documento em papel azul ou branco. Não pronunciou a expressão “achar melhor” com malícia. Era evidente que tinha saído involuntariamente da sua boca. Pensei com meus botões que deveria me livrar desse demente, que já estava interferindo na minha maneira de falar e de pensar, e na dos meus empregados. Mas achei prudente não o despedir de imediato.
No dia seguinte, notei que Bartleby não fazia nada além de ficar em frente à janela olhando para a parede, entregue a um devaneio. Quando lhe perguntei por que não escrevia, respondeu que tinha decidido não escrever mais.
“Como assim? O que é isso, agora?”, exclamei, “não vai mais escrever?”.
“Não.”
“Por qual motivo?”
“Não percebe qual é o motivo?”, respondeu com indiferença.
Olhei atônito para ele e vi que os seus olhos estavam sem brilho e vítreos. Naquele instante, ocorreu-me que a sua diligência ímpar em copiar com pouca luz, nas primeiras semanas da sua estadia, pudesse ter prejudicado temporariamente a sua vista.
Fiquei comovido. Ofereci-lhe as minhas condolências. Dei-lhe a entender que fazia bem em se abster de escrever por algum tempo e o estimulei a aproveitar a oportunidade para fazer exercícios ao ar livre. No entanto, ele não fez isso. Alguns dias mais tarde, estando os outros funcionários ausentes, e tendo muita pressa para despachar umas cartas, pensei que Bartleby, por não ter mais nada a fazer, seria menos inflexível do que de costume e levaria as cartas ao correio. Mas ele se recusou solenemente.
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