Assim, se há pessoas imparciais presentes, recorre-se a elas, em busca de ajuda por causa de suas ideias titubeantes.

“Turkey”, eu disse, “o que você acha disso? Não estou certo?”.

“Com todo o respeito, senhor”, disse Turkey, com um tom muito afável, “creio que sim”.

“Nippers”, eu disse, “o que você acha?”.

“Acho que deveria expulsá-lo do escritório a chutes.”

(O leitor perspicaz há de perceber que, sendo de manhã, a resposta de Turkey foi expressa com termos educados e tranquilos, mas que a resposta de Nippers foi mal-humorada. Ou, em outras palavras, o mau humor de Nippers estava em serviço e o de Turkey, de folga.)

“Ginger Nut”, eu disse, disposto a angariar o mínimo apoio a meu favor, “o que você pensa disso?”.

“Penso que ele é meio doido”, respondeu Ginger Nut, sorrindo.

“Ouviu o que eles disseram”, eu disse, virando-me para o biombo, “venha cá e cumpra com o seu dever”.

Mas ele não se dignou a responder. Fiquei pensando por uns instantes, numa perplexidade dolorosa. Mas outra vez o trabalho urgia. Outra vez decidi adiar a reflexão sobre o dilema para quando tivesse tempo. Com um pouco de dificuldade, conseguimos conferir os documentos sem Bartleby, embora, a cada uma ou duas páginas, Turkey opinasse que tal comportamento era incomum, enquanto Nippers se contorcia na cadeira com um nervosismo dispéptico, rangendo os dentes e de vez em quando soltando uma blasfêmia contra o imbecil teimoso atrás do biombo. Quanto a ele (Nippers), esta era a primeira e a última vez que faria o trabalho de outro sem ser pago.

Enquanto isso, Bartleby permanecia sentado no eremitério, indiferente a tudo que não fosse o seu próprio trabalho.

Passaram-se uns dias e o escrivão estava ocupado com novo trabalho extenso. A sua extraordinária conduta anterior levou-me a observá-lo com atenção. Reparei que nunca saía para almoçar; na verdade, nunca saía para lugar algum. Nunca saía do meu escritório, que eu soubesse. Era uma sentinela perpétua no canto. Mas, lá pelas onze horas da manhã, eu via que Ginger Nut avançava para a abertura do biombo de Bartleby, como se tivesse sido silenciosamente chamado por um gesto que eu não conseguia ver do lugar onde estava sentado. O rapaz saía do escritório, com moedas de centavos tinindo, e voltava com um punhado de pães de mel que entregava no eremitério, recebendo dois deles por seu trabalho.

Alimenta-se de pão de mel, pensei; nunca faz uma refeição propriamente dita; deve ser vegetariano, então; mas, não, nunca come legumes, apenas pão de mel. Fiquei pensando sobre os efeitos prováveis no organismo humano de uma alimentação à base de pão de mel. Esse pão de mel é basicamente feito de gengibre, que lhe dá o sabor final. Ora, o que é o gengibre? Algo picante e condimentado. Seria Bartleby picante e condimentado? De modo algum. O gengibre, portanto, não tinha efeito sobre Bartleby. Provavelmente ele achava melhor que não tivesse.

Nada irrita mais uma pessoa honesta do que a resistência passiva. Se o indivíduo ao qual se resiste não for desumano, e o que resiste, inofensivo, então o primeiro, com a maior boa vontade, vai se empenhar para que a sua imaginação construa com caridade aquilo que foi impossível resolver com a razão. Mesmo assim, continuei observando Bartleby e os seus modos. Coitado!, eu pensava. Não tem a intenção de fazer o mal; é claro que não quer ser insolente; a sua aparência é prova suficiente de que as suas excentricidades são involuntárias. Ele me é útil. Consigo me relacionar com o rapaz. Se mandá-lo embora, é possível que arrume um patrão menos indulgente e será tratado com descortesia, talvez seja inclusive compelido a morrer de fome na miséria. Isso mesmo. Posso conseguir aqui, por bem pouco, uma sensação agradável de indulgência. Ajudar Bartleby. Não me custa nada, ou quase nada, ser indulgente com a sua teimosia esquisita e, ao mesmo tempo, guardar no fundo da alma algo que possivelmente servirá de consolo à minha consciência.