Cinco Minutos

Cinco Minutos, de José de Alencar

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Cinco Minutos

 

José de Alencar

 

A D...

 

I

 

É uma história curiosa a que lhe vou contar, minha prima.

 

Mas é uma história e não um romance.

 

Há mais de dois anos, seriam seis horas da tarde, dirigi-

 

-me ao Rocio para tomar o ônibus de Andaraí.

 

Sabe que sou o homem menos pontual que há neste mun-

 

do; entre os meus imensos defeitos e as minhas poucas quali-

 

dades, não conto a pontualidade, essa virtude dos reis e esse

 

mau costume dos ingleses.

 

Entusiasta da liberdade, não posso admitir de modo algum

 

que um homem se escravize ao seu relógio e regule as suas

 

ações pelo movimento de uma pequena agulha de aço ou pelas

 

oscilações de uma pêndula.

 

Tudo isto quer dizer que, chegando ao Rocio, não vi mais

 

ônibus algum ; o empregado a quem me dirigi respondeu :

 

-- Partiu há cinco minutos.

 

Resignei-me e esperei pelo ônibus de sete horas. Anoiteceu.

 

Fazia uma noite de inverno fresca e úmida; o céu estava

 

calmo, mas sem estrelas.

 

A hora marcada chegou o ônibus e apressei-me a ir tomar

 

o meu lugar.

 

Procurei, como costumo, o fundo do carro, a fim de ficar

 

livre das conversas monótonas dos recebedores, que de ordiná-

 

rio têm sempre uma anedota insípida a contar ou uma queixa

 

a fazer sobre o mau estado dos caminhos.

 

O canto já estava ocupado por um monte de sedas, que

 

deixou escapar-se um ligeiro farfalhar, conchegando-se para

 

dar-me lugar.

 

Sentei-me; prefiro sempre o contato da seda à vizinhan-

 

ça da casimira ou do pano.

 

O meu primeiro cuidado foi ver se conseguia descobrir o

 

rosto e as formas que se escondiam nessas nuvens de seda.

 

e de rendas.

 

Era impossível.

 

Além de a noite estar escura, um maldito véu que caía

 

de um chapeuzinho de palha não me deixava a menor espe-

 

rança.

 

Resignei-me e assentei que o melhor era cuidar de outra

 

coisa.

 

Já o meu pensamento tinha-se lançado a galope pelo mun-

 

do da fantasia, quando de repente fui obrigado a voltar por

 

uma circunstância bem simples.

 

Senti no meu braço o contato suave de um outro braço,

 

que me parecia macio e aveludado como uma folha de rosa.

 

Quis recuar, mas não tive ânimo; deixei-me ficar na mes-

 

ma posição e cismei que estava sentado perto de uma mulher

 

que me amava e que se apoiava sobre mim.

 

Pouco a pouco fui cedendo àquela atração irresistível e

 

reclinando-me insensivelmente; a pressão tornou-se mais for-

 

te; senti o seu ombro tocar de leve o meu peito; e a minha

 

mão impaciente encontrou uma mãozinha delicada e mimosa,

 

que se deixou apertar a medo.