le commandant, j ‘suis français!

— Os legalistas são brasileiros. Ninguém aqui compreende línguas estrangeiras.

— Eu falo o português. Sou francês, senhores, peço explicar o fato.

— Você ainda quer explicar, hein? Que topete!

— Mas é um direito.

— Direitos para um sujeito pescado de madrugada!

— Eu exijo!... Você não exige nada; nós é que fazemos de você o que quisermos. Levem esse homem para a sala de armas, a aguardar as minhas ordens...

Os marinheiros foram levando o homem aos trancos. Nós ficamos na expectativa. O comandante, entretanto, fazia conduzir o saco à sua cabine.

— Boa noite, meus senhores.

— E o castigo, comandante?

— Ah ! o castigo... já pensei. Apenas só lho direi amanhã. É preciso faze-lo passar a noite fazendo palpites. Vocês não imaginam como é interessante passar a noite imaginando várias desgraças irremediáveis, que todas elas são perfeitamente possíveis e hão de se dar algumas horas depois... Até logo mais, meus amigos.

Recolhemos. Que castigo imaginaria aquele homem refinado e distinto? Como estaria o outro, nu, na madrugada álgida, lá em cima? Dormiria? Pensaria? Pensaria na morte decerto, porque era impossível outro gênero de castigo...

Um marinheiro descia.

— Como vai o homem? indagamos,

— Parece dormir; sim, senhor.

Nós é que não dormimos. Ficamos no beliche, nervosos, à espera daquela morte, daquela cena atroz, fatal dali a momentos. Que se daria, céus clementes?

No dia seguinte, às 8 da manhã, fomos convidados a ir à sala de armas. O homem nu lá estava, carrancudo, com o olhar turvo, mordendo o bigode. E quando o comandante chegou, houve um arrepio geral, um arrepio de medo. O comandante, porém, estava amável e sentara-se.

— Como se chama?

— Arsênio Godard.

— Ah ! muito bem.

— Eu desejava explicar...

— Oh! inteiramente inútil. Venho dizer-lhe o que resolvi a respeito. Sr. Arsênio Godard, o senhor vai viver conosco até o fim da nossa ação. Vê-se que o senhor é um homem, corajoso, forte. Excelente companheiro! Vou mandar-lhe uma roupa. Terá um beliche seu. O navio é inteiramente seu. Apenas, como o senhor nada bem e pode não gostar da nossa companhia, será acompanhado sempre. Não desejamos que nos abandone.

O francês olhava, tentando descobrir a insídia, procurando saber que castigo horrendo aquele vencedor arquitetava entre frases de mel.

— Mas, Sr. comandante, devo dizer...

— Eu é que devo dizer que jantará à nossa mesa. Ah! nós não passamos à vela de libra, como os patriotas da cidade. Mas, enfim, come-se.