Fazia muito tempo ela queria olhar aquelas glórias ocultas e conhecer o rapaz Laurence, o qual parecia que queria se dar a conhecer, se ao menos soubesse por onde começar. Desde a festa, ela andava mais ansiosa do que nunca e planejou muitos modos de se tornar amiga dele, mas ultimamente não o tinha visto e começou a pensar que o rapaz tinha viajado, até que um dia avistou um rosto moreno numa janela do andar superior, olhando melancólico para o jardim onde Beth e Amy jogavam bolas de neve uma na outra.

“Este rapaz sofre por falta de amizade e diversão”, ela disse para si mesma. “Seu avô não sabe o que é bom para ele e o mantém trancado sozinho. Ele precisa de um grupo de rapazes alegres para brincar, ou de alguém jovem e animado. Tenho muita vontade de ir até lá e dizer isso para o velho senhor!”

A ideia divertiu Jo, que gostava de fazer coisas atrevidas e sempre escandalizava Meg com suas desconcertantes proezas. O plano de “ir até lá” não foi esquecido. E quando a tarde nevada veio, Jo resolveu ver o que podia ser feito. Ela viu o sr. Laurence saindo e arremeteu para cavar seu caminho até a cerca, onde parou e ficou olhando. Tudo estava quieto, as cortinas fechadas nas janelas de baixo. Os empregados fora de vista e nada de humano visível fora uma cabeça de cachos negros apoiada numa mão fina, na janela de cima.

“Lá está ele”, pensou Jo, “pobre rapaz! Todo sozinho e indisposto nesse dia triste. Que lástima! Vou jogar uma bola de neve para ele olhar para fora e aí lhe digo alguma palavra gentil.”

Um punhado de neve macia foi jogada e a cabeça virou-se na hora, mostrando o rosto que perdeu seu ar indiferente num segundo, enquanto seus grandes olhos brilhavam e a boca começava a sorrir. Jo balançou a cabeça, sorriu e agitou sua vassoura enquanto gritava:

– Como vai você? Está doente?

Laurie abriu a janela e grasnou roucamente como um corvo:

– Melhor, obrigado. Tive um resfriado feio e fiquei trancado uma semana.

– Sinto muito. O que faz para se divertir?

– Nada. É maçante feito uma sepultura aqui.

– Você não lê?

– Não muito. Eles não me deixam.

– Não pode alguém ler para você?

– Vovô às vezes o faz, mas meus livros não interessam a ele e não gosto de ficar o tempo todo pedindo para Brooke.

– Alguém tem vindo ver você?

– Não tem ninguém que eu queira ver. Os rapazes fazem muito barulho e estou com a cabeça fraca.

– Não há alguma menina gentil que leia e o entretenha? Meninas costumam ser quietas e gostam de brincar de enfermeira.

– Não conheço nenhuma.

– Você nos conhece – começou Jo; daí riu e parou.

– É mesmo! Você viria, por favor? – exclamou Laurie.

– Não sou quieta nem gentil, mas vou, sim, se mamãe permitir. Vou perguntar a ela. Feche a janela, como um bom rapaz, e espere até eu chegar.

Com isso, Jo colocou a vassoura nos ombros e marchou para casa, imaginando o que diria à família. Laurie estava muito empolgado com a ideia de ter companhia e voou para se preparar, pois, como dizia a srta. March, ele era um “pequeno cavalheiro”; em honra à visita que estava para chegar, ele penteou o cabelo encaracolado, pôs um colarinho limpo e tentou arrumar o quarto, que, apesar da meia dúzia de criados, vivia desorganizado. Logo se ouviu uma campainha alta, em seguida uma voz decidida perguntando pelo “sr. Laurie”, e uma empregada veio correndo anunciar, surpresa, uma jovem senhora.

– Muito bem, diga para subir, é a srta. Jo – falou Laurie, indo até a porta do quarto para esperar Jo, que apareceu, corada e bastante à vontade, com um prato coberto numa mão e os três gatinhos de Beth na outra.

– Aqui estou, com malas e bagagens – disse ela animada. – Mamãe manda seu carinho e fica contente que eu possa fazer algo por você. Meg quis que eu lhe trouxesse um pouco de manjar branco, que ela sabe fazer muito bem, e Beth achou que os gatinhos dela poderiam animá-lo. Sei que você vai rir dela, mas eu não podia recusar, e ela estava muito ansiosa em fazer alguma coisa.

Ocorreu que o empréstimo engraçado de Beth veio bem a calhar, pois, ao rir com os gatinhos, Laurie esqueceu a timidez e se tornou sociável na hora.

– Parece bonito demais para ser comido – disse ele rindo com gosto, quando Jo tirou a tampa do prato e mostrou o manjar branco, rodeado por uma grinalda de folhas verdes e flores vermelhas do gerânio favorito de Amy.

– Não é nada demais, elas ficaram contentes e só queriam demonstrá-lo. Diga para a criada guardar para o chá. É tão simples, e você pode comer, pois sendo macio não vai arranhar sua garganta.