Aquilo foi demais e Roberto d'Estouteville não conseguiu se conter:

— Você está zombando da corte, miserável! Sargentos, levem este palhaço ao pelourinho da Praça da Greve e apliquem nele uma surra durante uma hora. Ele irá me pagar!

O escrevente em poucos minutos redigiu o veredicto, contudo, no momento em que o senhor Florian Bardebienne lia a sentença para assiná-la, o escrivão sentiu-se comovido e teve piedade do pobre condenado. Assim, na esperança de obter alguma diminuição na pena, aproximou-se tanto quanto possível da orelha do ouvidor e disse-lhe, apontando Quasímodo:

— Este homem é surdo.

Esperava ele que tal coincidência de enfermidade despertasse o interesse do senhor Florian a favor do condenado. Mas, em primeiro lugar, já observamos que o ouvidor não se incomodava com o fato de as pessoas perceberem sua surdez. Além disso, ele era tão surdo que não compreendeu uma só palavra que o escrevente lhe disse. No entanto, quis dar a impressão de entender e respondeu:

— Ah, então é diferente. Eu não sabia disso. Neste caso, que fique uma hora a mais no pelourinho!

E assinou a sentença assim modificada.

CAPÍTULO 6

O buraco dos ratos

Na Praça da Greve, o espetáculo não é menos interessante. Às dez horas da manhã, tudo lembra o dia seguinte da festa. A calçada está coberta de restos, fitas, panos, plumas de penachos, gotas de cera das tochas, migalhas do banquete público. Os vendedores de cidra e cerveja rolam suas barricas. Alguns transeuntes ocupados vão e vêm. Os mercadores conversam e se chamam uns aos outros diante de suas lojas. Todos tentam falar melhor e rir mais. E, no entanto, quatro sargentos a cavalo que acabam de se postar nos quatro lados do pelourinho já concentram em torno de si a atenção geral.

Se o leitor dirigir agora seu olhar para a casa de Tour-Roland, que fica na esquina do cais, poderá observar, no canto da fachada, uma estreita janela fechada por duas barras de ferro em cruz, única abertura que deixa chegar um pouco de ar e de luz do dia a uma pequena cela sem porta no andar térreo.

Tal cela era a mais famosa em Paris há mais de três séculos, desde que madame Rolande de Ia Tour-Roland, de luto por seu pai morto numa cruzada, mandou escavá-la na muralha da própria casa para ali se encerrar para sempre, mantendo de seu palácio apenas este único local cuja porta era murada. Somente uma fresta permanecia aberta, tanto no inverno como no verão. A senhorita, que doara o resto de seus bens aos pobres e a Deus, havia esperado a morte vinte anos neste túmulo, rezando dia e noite pela alma do pai, dormindo nas cinzas, sem ter nem mesmo uma pedra como travesseiro, vestida com um saco preto e vivendo apenas daquilo que a piedade dos transeuntes depositava sobre o parapeito da pequena janela. Quando morreu, deixou a cela para as mulheres que queriam se enterrar vivas num momento de grande dor ou por uma grande penitência.

A Tour-Roland nunca deixou de aceitar mulheres reclusas. Muitas delas a habitavam até

a morte e o povo de Paris se habituou a chamar o local de "o buraco dos ratos". Na época em que se passa esta história, a cela da Tour-Roland estava ocupada justamente por aquela mulher que interrompeu a apresentação da cigana Esmeralda, mandando-a embora. A história desta reclusa será ouvida por meio da conversa de três boas comadres que se dirigiam precisamente para Iá, subindo do Palácio Châtelet para a Praça da Greve, ao longo do rio.

Duas destas mulheres vestiam-se como boas burguesas de Paris, a outra tinha um ar mais provinciano. Ela segurava pela mão um menino grande que, por sua vez, carregava um bolo.

A criança se deixava arrastar e tropeçava a todo instante, talvez porque olhasse mais para o bolo do que para a calçada, e algum motivo sério o impedia de mordê-lo, já que ele se satisfazia em observá-lo com carinho. As três senhoritas, que se chamavam Mahiette, Oudarde e Gervaise, falavam todas ao mesmo tempo.