Esse jogo infantil poderia sem dúvida continuar eternamente, pois ela queria me acompanhar de volta. Aceitei, com a condição de que me deixasse na metade do caminho.

Cheguei meia hora atrasado para o jantar. Era a primeira vez. Culpei o trem pelo atraso. Meu pai fingiu acreditar.

Nada mais me pesava. Na rua eu andava tão leve quanto em meus sonhos.

Até então, eu tivera de renunciar a tudo que cobiçara enquanto criança. Por outro lado, a gratidão estragava os brinquedos que eu ganhava. Que prestígio devia ter para uma criança um brinquedo que se oferece a si mesmo! Eu estava inebriado de amor. Marthe era minha. Ela mesma o dissera; não eu. Podia tocar em seu rosto, beijar seus olhos, seus braços, vesti-la, feri-la, como quisesse. Em meu delírio, eu a mordia em lugares onde a pele ficava à mostra, para que sua mãe suspeitasse de um amante. Eu queria poder marcá-la com minhas iniciais. Minha selvageria de criança redescobria o velho sentido da tatuagem. Marthe dizia: "Sim, me morda, me marque, quero que todo mundo saiba".

Eu queria poder beijar seus seios. Mas não ousava pedir, imaginando que ela mesma saberia oferecê-los, como fizera com os lábios. Ao fim de alguns dias, habituado a seus lábios, não pensava em outras delícias.

Costumávamos ler juntos à luz do fogo, onde ela jogava frequentemente as cartas que seu marido lhe enviava a cada dia do fronte. Pela inquietação dessas cartas, adivinhava-se que as de Marthe se tornavam cada vez menos carinhosas e mais raras. Não era sem algum mal-estar que eu via essas cartas arderem. Elas avivavam um segundo o fogo e, tudo somado, eu tinha medo de ver tão claro.

Marthe, que agora me perguntava com frequência se era verdade que eu a amara desde o nosso primeiro encontro, me censurava por não tê-lo dito antes do casamento. Ela não teria se casado, dizia; pois, se sentira uma espécie de amor por Jacques no princípio do noivado, este, muito longo devido à guerra, apagara pouco a pouco seu amor. Ela esperava que os quinze dias de licença concedidos a Jacques pudessem transformar seus sentimentos.

Ele foi canhestro. Aquele que ama irrita sempre aquele que não ama. E Jacques a amava cada vez mais. Suas cartas eram as de alguém que sofre, mas colocando alto demais sua Marthe para crê-la capaz de traição. Daí culpar a si mesmo, suplicando a Marthe que lhe dissesse somente que mal lhe podia ter feito: "Sinto-me tão rude a seu lado, tenho a impressão de que cada palavra minha fere você". Marthe respondia-lhe simplesmente que ele se enganava, que ela nada lhe censurava.

Estávamos então no começo de março. A primavera foi precoce. Nos dias em que não me acompanhava a Paris, Marthe esperava que eu voltasse da aula de desenho, nua sob o penhoar, estendida diante da lareira onde queimava sempre a oliva de seus sogros. Ela havia pedido que renovassem a provisão.