Durante o dia inteiro o dr. Armitage leu, às vezes fazendo pausas enlouquecedoras quando a reaplicação da complexa chave do criptograma se fazia necessária. Levaram-lhe o almoço e o jantar, porém não conseguiu comer mais do que uma fração ínfima de cada um. No meio da noite seguinte, tirou um cochilo na cadeira, mas logo acordou de uma teia de pesadelos quase tão horrenda quanto as verdades e ameaças à existência da humanidade que havia descoberto.

Na manhã do dia quatro de setembro o professor Rice e o dr. Morgan insistiram em vê-lo e em seguida saíram pálidos e trêmulos. Naquela noite o dr. Armitage foi para a cama, mas dormiu um sono intranquilo. Na quarta-feira — o dia seguinte —, voltou ao manuscrito e começou a tomar notas copiosas, tanto do trecho em que trabalhava quanto dos trechos já decifrados. Durante a madrugada, dormiu um pouco em uma poltrona no escritório, porém mais uma vez tornou ao manuscrito antes do amanhecer. Pouco antes do meio-dia o dr. Hartwell fez-lhe uma visita e insistiu em que parasse de trabalhar. Armitage se recusou, alegando que terminar e leitura do diário era de suma importância e dizendo que no momento oportuno haveria de explicar tudo.

Naquela noite, assim que escureceu, terminou o exame do terrível volume e deixou-se afundar na cadeira, exausto. A esposa, ao servir o jantar, encontrou-o em estado semicomatoso; mas Armitage estava consciente o bastante para alertá-la com um grito estridente quando viu seu olhar correr na direção das notas que havia tomado. Depois de se erguer, juntou os papéis rabiscados e selou-os em um grande envelope, que no mesmo instante guardou no bolso interno do casaco. Teve forças suficientes para voltar para casa, mas a necessidade de assistência médica era tanta que o dr. Hartwell foi chamado no mesmo instante. Quando o médico o pôs na cama, o paciente conseguia apenas repetir, “Mas o que podemos fazer, em nome de Deus?”.

O dr. Armitage dormiu, mas sofreu com delírios intermitentes no dia seguinte. Não ofereceu nenhuma explicação a Hartwell, porém nos momentos de maior lucidez falava sobre a necessidade absoluta de uma longa conferência com Rice e Morgan. Os devaneios mais fantasiosos eram muito impressionantes e incluíam apelos frenéticos para que se destruísse alguma coisa no interior de uma casa pregada com tábuas e referências fantásticas a um plano de extermínio de toda a raça humana e de todas as formas de vida animal e vegetal da Terra por parte de terríveis seres ancestrais de outra dimensão. Gritou que o mundo estava em perigo, uma vez que as Coisas Ancestrais desejavam arrancá-lo da órbita e arrastá-lo para longe do sistema solar e do cosmo material em direção a outro plano ou outra fase da entidade de onde havia se afastado vigintilhões de éons atrás. Em outros momentos, pedia que lhe trouxessem o temível Necronomicon e o Daemonolatreia de Remigius, nos quais tinha a esperança de encontrar alguma fórmula para conter o perigo conjurado.

“Precisamos detê-los, precisamos detê-los!”, gritava. “Os Whateley queriam abrir a passagem para eles, e o pior ainda está por vir! Diga a Rice e a Morgan que precisamos tomar alguma providência — é um tiro no escuro, mas eu sei preparar o pó… A coisa não se alimenta desde o dia dois de agosto, quando Wilbur veio morrer aqui, e nesse ritmo…”

Mesmo aos 73 anos, Armitage tinha um físico robusto e curou o distúrbio com uma boa noite de sono, sem apresentar nenhum sintoma de febre. Acordou tarde na sexta-feira, com os pensamentos lúcidos, mas também estava sóbrio por conta de um medo insidioso e de um tremendo sentimento de responsabilidade. Na tarde de sábado sentiu-se apto a ir até a biblioteca e a chamar Rice e Morgan para uma conferência, e pelo restante do dia e da noite os três homens torturaram os próprios pensamentos com as mais desvairadas especulações e o mais desesperado debate. Livros estranhos e terríveis foram retirados às pilhas das estantes e dos locais de armazenagem seguros; e fórmulas e diagramas foram copiados com uma pressa febril em quantidade espantosa. Não se percebia ceticismo algum. Todos os três tinham visto o corpo de Wilbur Whateley estirado no chão em uma sala daquele mesmo prédio, e após essa experiência nenhum deles tinha a menor inclinação para tratar o diário como o simples delírio de um louco.

Não houve acordo quanto à notificação da polícia de Massachusetts, e por fim a negativa prevaleceu. Havia coisas que simplesmente não podiam ser aceitas por aqueles que não tivessem visto uma amostra, como de fato ficou claro durante certas investigações subsequentes. Tarde da noite a conferência chegou ao fim sem ter estabelecido um plano claro, mas Armitage passou o domingo inteiro comparando fórmulas e misturando químicos obtidos no laboratório da universidade. Quanto mais refletia sobre o diário infernal, mais se via inclinado a duvidar da eficácia de qualquer agente material na supressão da entidade que Wilbur Whateley havia deixado para trás — a entidade que ameaçava toda a Terra e que, sem que tomasse ciência, estava prestes a ressurgir dentro de algumas horas e a tornar-se o memorável horror de Dunwich.

A segunda-feira foi uma repetição do domingo para o dr. Armitage, pois a tarefa a que se dedicava exigia uma infinitude de pesquisas e experimentos. Consultas mais aprofundadas ao monstruoso diário provocaram diversas mudanças no plano, mas ele sabia que mesmo assim haveria uma grande margem de incerteza. Na quinta-feira já havia estabelecido uma linha de ação bem definida e planejava fazer uma viagem a Dunwich dentro de uma semana. Porém na quarta-feira veio o grande choque. Escondido em um canto do Arkham Advertiser havia uma pequena peça satírica da Associated Press falando sobre o monstro colossal que o uísque destilado ilegalmente em Dunwich havia criado. Armitage, estupefato, conseguiu apenas telefonar para Rice e para Morgan.