Heathcliff, pensei, dirigia-se para o celeiro. Mas ele só atravessara a sala, deixando-se cair num banco junto à parede, longe da lareira, onde permaneceu em silêncio.

Eu ninava Hareton sobre o joelho e cantarolava uma canção que começava: “Tarde da noite, a criança chorava... Sob a terra, sua mãezinha escutava”,48 quando a srta. Cathy, que ouvira toda a cena de seu quarto, meteu a cabeça pela porta e sussurrou:

– Está sozinha, Nelly?

– Sim, senhorita – respondi.

Ela entrou e se aproximou da lareira. Supondo que fosse dizer alguma coisa, ergui os olhos. A expressão em seu rosto parecia perturbada e ansiosa. Seus lábios estavam entreabertos, como se fosse falar, e inspirou, mas deixou sair um suspiro em vez de uma frase.

Retomei minha cantiga; não esquecera seu comportamento recente.

– Onde está Heathcliff? – perguntou, interrompendo-me.

– Cuidando do trabalho, no estábulo – foi minha resposta.

Ele não me contradisse; talvez estivesse cochilando.

Seguiu-se mais uma pausa longa, durante a qual notei uma lágrima ou duas pingando do queixo de Catherine sobre o chão.

“Será que está arrependida pela conduta vergonhosa?”, perguntei-me. “Seria novidade. Mas ela que se vire, não vou ajudá-la!”

Não, Cathy não sentia o menor remorso; estava preocupada com seus próprios problemas.

– Ah, céus! – exclamou, por fim. – Estou tão infeliz!

– Que pena – observei. – É difícil satisfazê-la; tem tantos amigos e tão poucas preocupações, e não consegue ficar satisfeita!

– Nelly, pode guardar um segredo? – prosseguiu, ajoelhando-se ao meu lado e erguendo para mim aqueles olhos encantadores, com aquela expressão capaz de pôr fim a qualquer ressentimento, até o mais justificado do mundo.

– É um segredo que vale a pena guardar? – perguntei, já menos aborrecida.

– É, e ele me preocupa, preciso desabafar! Quero saber o que devo fazer. Hoje, Edgar Linton me pediu em casamento, e lhe dei uma resposta. Antes que lhe conte se foi afirmativa ou negativa, diga-me você qual deveria ter sido.

– Ora, srta. Catherine, como posso saber? – retruquei. – Certamente, considerando-se o espetáculo que a senhorita apresentou em presença dele hoje à tarde, eu diria que seria mais sábio recusá-lo. Deve ser ou um completo idiota ou um tolo aventureiro, para ter feito o pedido depois de tudo.

– Se vai falar desse jeito, não conto mais nada – replicou ela, impertinente, pondo-se de pé. – Eu aceitei, Nelly. Agora me diga, depressa, se errei!

– A senhorita aceitou! Então de que adianta discutir o assunto? Já deu sua palavra e não pode mais voltar atrás.

– Mas diga-me se eu devia ter feito isso, diga logo! – exclamou ela, num tom irritado, torcendo as mãos, a testa franzida.

– Há muitas coisas a considerar antes que eu possa dar uma resposta apropriada à sua pergunta – falei, sentenciosamente. – Antes de mais nada, ama o sr. Edgar?

– Quem não ama? É claro que sim – respondeu ela.

Então, a fiz passar pelo seguinte interrogatório – para uma moça de vinte e dois anos, era mais do que razoável:

– Por que o ama, srta. Cathy?

– Não faça perguntas tolas. Amo, e basta.

– De jeito nenhum. Precisa me dizer por quê.

– Bem, porque é bonito, e é uma companhia agradável.

– Não basta! – foi meu comentário.

– E porque é jovem e alegre.

– Ainda não basta.

– E porque me ama.

– Isso não vem ao caso.

– E vai ser rico. Vou gostar de ser a mulher mais importante da região, e vou sentir orgulho de ter um marido como ele.

– Pior ainda. Agora me diga, de que maneira o ama?

– Como todo mundo ama... você parece boba, Nelly.

– Não sou, não. Responda.

– Amo o chão que ele pisa, e o ar sobre sua cabeça, e tudo o que ele toca, e cada palavra que pronuncia. Amo sua aparência, e todas as suas atitudes, e ele todo, por completo. Pronto!

– E por quê?

– Não, você está zombando de mim, e isso é muito mau. A situação não é uma brincadeira para mim! – exclamou a jovem, franzindo o cenho e se voltando para a lareira.

– Estou longe de estar zombando, srta.