Meus pôneis estão cansados, eu ainda tenho um longo caminho a percorrer e vou parar para que descansem por uma hora nesta encosta.”
O viajante mais velho assentiu com indiferença, e o vendedor de almagre levou seus cavalos e a carroça para a turfa, dizendo “Boa noite”. O outro respondeu e seguiu seu caminho como antes.
O vendedor de almagre observou sua silhueta diminuir até se transformar em um pontinho na estrada e ser absorvida pelo espesso véu da noite. Então, pegou um pouco de feno de um fardo que estava pendurado embaixo da carroça e, jogando uma porção em frente aos cavalos, espalhou o restante no chão como se fosse uma almofada ao lado do veículo. Sentou-se ali, recostando-se na roda. Do interior chegava aos seus ouvidos uma respiração suave. Ele pareceu satisfeito com isso e observou reflexivamente a paisagem, como se considerasse qual seria seu próximo passo.
Fazer as coisas de modo reflexivo e gradativo parecia, de fato, uma obrigação nos vales de Egdon naquela hora de transição, pois havia algo na condição da própria charneca que era similar a uma incerteza prolongada e vacilante. Era o tipo de calmaria que combinava com a paisagem. Não era a calmaria de estagnação real, e sim a aparente calmaria de uma lentidão inacreditável. Uma condição de vida saudável que lembre tanto o torpor da morte é algo marcante desse tipo; demonstrar a inércia do deserto e, ao mesmo tempo, exercer poderes semelhantes aos do prado, e até mesmo da floresta, despertava naqueles que pensam nisso a atenção geralmente resultante de entendimento e reserva.
A paisagem diante dos olhos do vendedor de almagre era uma série gradual de elevações desde o nível da estrada até o coração da charneca. Incluía outeiros, depressões, saliências, escarpas, uns atrás dos outros, até terminarem todos em uma colina alta que se destacava contra o céu ainda claro. Os olhos do viajante vagaram por essas coisas durante um tempo, e afinal pousaram em um objeto que chamava a atenção: um monte sepulcral. Aquela projeção altiva de terra acima de seu nível natural ocupava o lugar mais alto da elevação mais isolada da charneca. Seu volume real era grande – embora, quando visto do vale, parecesse apenas uma verruga na fronte de Atlas. Era o mastro e o eixo desse mundo pantanoso.
Conforme o homem que descansava olhou para o monte sepulcral, percebeu que em seu topo– até então o objeto mais elevado em toda a paisagem ao redor– havia algo ainda mais alto. Era algo que saía de um montículo semicircular como se fosse o espigão de um elmo. O primeiro instinto de um forasteiro imaginativo seria supor que algum celta havia sido enterrado no monte sepulcral, já que a paisagem não tinha nada que lembrasse a época moderna. Parecia ser o último de sua espécie, refletindo por um momento antes de ser engolido pela noite eterna com o restante de sua raça.
Ali permanecia a silhueta, tão imóvel quanto a colina abaixo de si. Acima da planície erguia-se a colina, acima da colina erguia-se o monte sepulcral, e acima do monte sepulcral erguia-se a silhueta. Acima desta não havia nada que pudesse ser de outro modo identificado além da abóbada celeste.
A silhueta dava à série de elevações escuras um acabamento tão perfeito, delicado e necessário que parecia ser o único motivo óbvio para sua existência. Sem ela, era apenas uma cúpula sem lanterna; com ela, as exigências arquitetônicas da construção eram atendidas. A paisagem era estranhamente homogênea, pois aquele vale, o planalto, o monte sepulcral e a silhueta que se erguia da elevação formavam uma só unidade. Observar este ou aquele elemento do grupo era não enxergar o todo, e sim uma fração apenas.
A forma parecia tanto ser uma parte orgânica da estrutura imóvel que vê-la se mover impressionaria a mente como se fosse um fenômeno estranho. Visto que a imobilidade era a principal característica do todo do qual a pessoa fazia parte, interromper a imobilidade de algum modo sugeria confusão.
Mesmo assim, foi o que aconteceu. A silhueta perceptivelmente desistiu de sua imobilidade, deu um passo ou dois e virou-se. Desceu pelo lado direito do monte sepulcral como se estivesse assustada, deslizando feito uma gota d’água em um botão de flor, e então desapareceu. O movimento fora suficiente para revelar mais claramente as características da silhueta, e que era de uma mulher.
A razão de seu deslocamento repentino agora aparecia. Conforme ela sumiu pelo lado direito, uma nova figura, que carregava um fardo, surgiu no céu pelo lado esquerdo, subiu no monte sepulcral e depositou o fardo ali em cima. Então surgiu uma terceira, uma quarta, uma quinta figura, até que todo o monte sepulcral ficou tomado por silhuetas que carregavam fardos.
O único significado inteligível para essa pantomima de silhuetas contra o céu era que a mulher não tinha ligação com as formas que tomaram seu lugar, que as evitava diligentemente e que chegara até ali por um motivo diferente dos demais. A imaginação do observador preferiu se prender àquela figura solitária e desaparecida, como se fosse algo mais interessante, mais importante e mais provavelmente tivesse uma história que valesse a pena conhecer do que a dos recém-chegados, e inconscientemente considerou-os intrusos. Mas eles permaneceram ali e se estabeleceram, e naquele momento não parecia provável que a figura solitária que até então fora a rainha do ermo pudesse retornar.
CAPÍTULO 3
O Costume da Região
Se um observador se posicionasse ao lado do túmulo, saberia que essas pessoas eram homens e meninos dos povoados vizinhos.
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