“Eu lhe direi”, falou Hallward, e em seu rosto surgiu uma expressão de perplexidade.
“Espero com ansiedade, Basil”, murmurou o companheiro, olhando para ele.
“Ó, na verdade há muito pouco a dizer, Harry”, respondeu o jovem pintor; “e receio que você dificilmente entenda. Talvez dificilmente acredite.”
Lorde Henry sorriu e, inclinando-se, arrancou uma margarida de pétalas cor-de-rosa da grama, e pôs-se a examiná-la. “Tenho plena certeza de que vou entender”, respondeu ele, contemplando atentamente o pequeno disco dourado de plumas brancas, “e posso acreditar em qualquer coisa, desde que seja inacreditável.”
O vento derrubou algumas flores das árvores, e os pesados brotos do lilás, com seus cachos de estrelas, balançaram de um lado para outro no ar lânguido. Um gafanhoto começou a gorjear na grama, e uma libélula comprida e fina flutuou no ar com suas asas marrom rendadas. Lorde Henry tinha a impressão de ouvir o coração de Basil Hallward batendo, e se perguntou o que estava por vir.
“Bem, é algo inacreditável”, repetiu Hallward, com certo amargor, “inacreditável até para mim, às vezes. Não sei o que significa. A história é simplesmente esta. Dois meses atrás fui a uma reunião em casa de lady Brandon. Você sabe que nós, pobres pintores, temos que frequentar a sociedade de vez em quando, só para lembrar ao público que não somos selvagens. Com um casaco de noite e uma gravata branca, como você me disse certa vez, qualquer pessoa, mesmo um corretor da bolsa de valores, pode ganhar uma reputação de civilizado. Bem, depois de estar na sala por cerca de dez minutos, conversando com viúvas enormes em trajes exagerados e acadêmicos maçantes, de repente me dei conta de que alguém estava olhando para mim. Virei-me e vi Dorian Gray pela primeira vez. Quando nossos olhos se encontraram, senti que empalidecia. Um curioso instinto de terror tomou conta de mim. Sabia que estava frente a frente com alguém cuja mera personalidade era tão fascinante que, se eu permitisse, absorveria toda a minha natureza, toda a minha alma, até a minha própria arte. Não queria nenhuma influência externa em minha vida. Você bem sabe, Harry, o quanto sou independente por natureza. Meu pai me destinou para o exército. Insisti em ir para Oxford. Então ele fez com que me inscrevesse em Middle Temple. Antes de ter aproveitado metade dos doze jantares[5], renunciei à advocacia[6] e anunciei minha intenção de me tornar pintor. Sempre fui senhor de mim mesmo; ou pelo menos sempre fui até encontrar Dorian Gray. Então... Mas não sei como lhe explicar isso. Algo parecia me dizer que eu estava à beira de uma crise terrível em minha vida. Tive a estranha sensação de que o Destino tinha me reservado alegrias extraordinárias e tristezas extraordinárias. Sabia que se falasse com Dorian acabaria inteiramente dedicado a ele, e que não devia falar-lhe. Tive medo, e me virei para deixar a sala. Não foi a consciência que me levou a fazê-lo: foi a covardia.
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