Boxer era um animal de grande

porte, com perto de um metro e oitenta de altura e tão forte

como dois cavalos comuns. Uma lista branca no focinho dava-lhe

uma aparência um tanto imbecil e, de facto, não possuía uma

inteligência de primeira, mas era respeitado por todos devido

à sua firmeza de carácter e enorme capacidade de trabalho.

Depois dos cavalos chegaram Muriel, a cabra branca, e

Benjamin, o burro. Benjamin era o animal mais velho da quinta

e o mais mal-humorado. Raramente falava e, quando o fazia, era

geralmente para proferir alguma observação cínica. Dizia, por

exemplo, que Deus lhe havia dado uma cauda para enxotar as

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O TRIUNFO DOS PORCOS

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moscas, mas que preferiria não ter cauda, nem moscas. Era o

único dos animais da quinta que nunca se ria. Se lhe

perguntavam porquê, dizia que não via nada que lhe desse

vontade de rir. No entanto, sem o admitir abertamente, era

muito dedicado a Boxer; geralmente passavam os domingos

juntos, no pequeno cercado do outro lado do pomar, pastando

lado a lado, em silêncio.

Os dois cavalos tinham acabado de se deitar quando entrou no

celeiro uma ninhada de patinhos que tinham perdido a mãe,

piando debilmente e vagueando de um lado para o outro à

procura de um lugar onde não fossem esmagados. Clover fez uma

espécie de muro à volta deles, com a pata dianteira, e os

patinhos aninharam-se ali e prontamente adormeceram. No fim

entrou Mollie,,a estouvada e bonita égua branca que puxava a

charrete do Sr. Jones, requebrando-se com elegância e

mastigando um torrão de açúcar. Ocupou um lugar próximo da

frente e começou a sacudir a sua crina branca, esperando

atrair as atenções para as fitas vermelhas com que estava

entrançada. Por último veio o gato, que olhou em volta, como

de costume, procurando o lugar mais quente e aconchegando-se

finalmente entre Boxer e Clover; aí ficou ronronando com

satisfação durante todo o discurso de Major, sem prestar

atenção a uma única palavra do que ele dizia.

Agora todos os animais estavam presentes, excepto, Moses,

o corvo domesticado, que dormia num poleiro atrás da porta dos

fundos. Quando Maior viu que todos estavam confortavelmente

instalados,

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GEORGE ORWELL

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esperando atentamente, aclarou a garganta e começou:

joluso

- Camaradas! Já ouviram falar do estranho sonho que tive a

noite passada. Mas voltarei ao sonho mais tarde. Antes, tenho

outra coisa para vos dizer.

Não creio, camaradas, que esteja entre vós por muito mais

meses e, antes de morrer, sinto que é meu dever transmitir-vos

a sabedoria que adquiri. Tenho tido uma longa vida, e muito

tempo para reflectir quando estava sozinho no meu curral, e

julgo poder afirmar que compreendo a essência da vida nesta

terra tão bem como qualquer dos animais agora vivos. É acerca

disto que quero falar-lhes.

Camaradas: qual é o sentido desta nossa vida?

Encaremos a realidade: a nossa vida é miserável, penosa e

curta. Nascemos, somos alimentados apenas com a comida

necessária para nos mantermos vivos, e aqueles de entre nós

que têm capacidade para isso, são forçados a trabalhar até ao

limite das suas forças; e, no preciso momento em que a nossa

utilidade chega ao fim, somos abatidos com terrível crueldade.