— Ódio! E será que eu consigo odiar essa moça? Preciso fugir, voltar à minha Mompracem, para junto dos meus filhotes!... Se ficar aqui, a febre vai acabar devorando toda a minha energia, sei que a minha força vai acabar para sempre, que não serei mais o Tigre da Malásia... Vamos lá, é hora de ir embora!

Olhou para baixo: apenas três metros o separavam do solo. Prestou atenção, mas não ouviu ruído nenhum.

Pulou por cima do peitoril, caiu com agilidade entre os canteiros e se dirigiu para a árvore sob a qual Marianna estava sentada pouco tempo atrás.

— Era aqui que ela estava descansando — murmurou ele com voz triste. — Mas como você é linda, Marianna!... E nós nunca mais vamos nos rever!... E não vou mais ouvir a sua voz, não... não!...

Curvou-se sob a árvore e pegou uma flor, uma rosa silvestre que a jovem Lady deixara cair. Admirou-a por muito tempo, cheirou-a diversas vezes e apaixonadamente escondeu-a no peito. Depois disso se dirigiu rapidamente para a muralha do parque, murmurando:

— Vamos, Sandokan; acabou!...

Estava perto da paliçada e prestes a saltá-la quando se virou depressa, com as mãos nos cabelos, o olhar turvo, e emitiu uma espécie de soluço.

— Não!... Não!... — exclamou ele desesperado. — Não posso, não posso!... Mompracem que se afunde, meus filhotes que se matem, a minha força que se vá, eu fico!...

Começou a correr pelo parque, como se tivesse medo de se encontrar de novo sob a paliçada da muralha, e só parou quando chegou embaixo da janela do seu quarto.

Hesitou mais uma vez e, com um salto, se agarrou ao ramo de uma árvore e alcançou o peitoril.

Quando se viu novamente naquela casa que deixara com a firme decisão de nunca mais voltar, um segundo soluço subiu do fundo da garganta.

— É isto... — exclamou ele. — O Tigre da Malásia está acabado!...

 

 


 

No entanto, continuou ali, como se estivesse pregado em frente à janela... 

8. A caça ao tigre

Quando, às primeiras horas do dia, o Lorde veio bater na porta, Sandokan ainda não pregara os olhos. Lembrando-se do programa da caça, num instante saiu da cama, colocou o fiel kriss entre as pregas da faixa e abriu a porta, dizendo:

— Cá estou, milorde.

— Ótimo — disse o inglês. — Não achei que fosse

encontrar você pronto, caro príncipe. Como está passando?

— Estou tão forte que poderia derrubar uma árvore.

— Então vamos depressa. Seis bravos cavaleiros estão nos esperando no parque, impacientes para encontrar o tigre que os meus batedores encurralaram num bosque.

— Estou pronto para acompanhá-lo; Lady Marianna vem conosco?

— Com certeza, acho que já está nos esperando.

Sandokan sufocou a muito custo um grito de alegria.

— Vamos, milorde — disse — mal posso esperar para encontrar o tigre.

Saíram e entraram em um pequeno salão, cujas paredes estavam cobertas de toda espécie de armas. Foi lá que Sandokan encontrou a jovem Lady, mais bonita do que nunca, fresca como uma rosa, fantástica em sua roupa azul que realçava vivamente os cabelos louros.

Ao vê-la, Sandokan se deteve fascinado, foi depressa ao seu encontro, pegou sua mão e disse:

— Você também vai caçar?

— Vou, príncipe; disseram-me que os seus compatriotas são muitíssimo valentes nesse tipo de caça e quero assistir.

— Vou matar o tigre com o meu kriss e dar a pele de presente para você.

— Não!... Não!... — exclamou ela assustada. — Poderia acontecer uma nova desgraça com você.

— Por você, milady, eu poderia ser feito em pedaços, mas não tenha medo, o tigre de Labuan não me assusta.

Enquanto isso, o Lorde se aproximou e estendeu uma bela carabina a Sandokan.

— Tome, príncipe — disse. — Uma bala às vezes vale mais do que o kriss mais afiado. Agora vamos que meus amigos estão esperando.

Desceram para o parque, onde estavam cinco caçadores; quatro eram colonos da região, o quinto, por sua vez, era um elegante oficial da marinha.

Assim que o viu, Sandokan, sem saber direito por que, sentiu imediatamente uma violenta antipatia pelo rapaz, mas reprimiu o sentimento e estendeu a mão a todos.

Nesse momento, o oficial olhou fixamente para ele durante muito tempo, de uma maneira estranha, e depois, se aproveitando de um momento em que ninguém prestava atenção, chegou mais perto do Lorde, que estava examinando o arreio de um cavalo, e disse à queima-roupa:

— Capitão, acho que já vi aquele príncipe malásio antes.

— Onde? — perguntou o Lorde.

— Não me lembro bem, mas tenho certeza.

— Bah! Você está imaginando coisas, meu amigo.

— Vamos ver, milorde.

— Que seja. Montem, amigos, que está tudo pronto!... Tomem cuidado porque o tigre é enorme e tem garras poderosas.

— Vou matá-lo com uma única bala para oferecer a pele à Lady Marianna —, disse o oficial.

— Espero matá-lo primeiro, senhor — disse Sandokan.

— Isso veremos, amigos — disse o Lorde. — Vamos lá, montem!

Os caçadores montaram os cavalos que haviam sido conduzidos até ali por algum serviçal, enquanto Lady Marianna saltava para um belíssimo pônei com pêlos brancos como a neve.

A um sinal do Lorde, todos saíram do parque, precedidos por diversos batedores e por duas dúzias de cães enormes.

Assim que saiu, o grupo de dividiu para explorar um grande bosque que se prolongava até o mar.

Sandokan, que montava um animal fogoso, se embrenhou por um caminho estreito, tomando a dianteira com audácia para ser o primeiro a descobrir a fera; os outros foram em direções diferentes e por outros caminhos.

— Voe, voe! — exclamou o pirata, incitando furiosamente o nobre animal que seguia o latido de alguns cachorros.