Damião reparou que tossia, mas para dentro, surdamente, a fim de não
interromper a conversação. Teve pena da negrinha, e resolveu apadrinhá-la, se não acabasse a tarefa.
Sinhá Rita não lhe negaria o perdão... Demais, ela rira por achar-lhe graça; a culpa era sua, se há culpa em
ter chiste.
Nisto, chegou João Carneiro. Empalideceu quando viu ali o afilhado, e olhou para Sinhá Rita, que não
gastou tempo com preâmbulos. Disse-lhe que era preciso tirar o moço do seminário, que ele não tinha
vocação para a vida eclesiástica, e antes um padre de menos que um padre ruim. Cá fora também se podia
amar e servir a Nosso Senhor. João Carneiro, assombrado, não achou que replicar durante os primeiros
minutos; afinal, abriu a boca e repreendeu o afilhado por ter vindo incomodar "pessoas estranhas", e em seguida afirmou que o castigaria.
— Qual castigar, qual nada! interrompeu Sinhá Rita. Castigar por quê? Vá, vá falar a seu compadre.
— Não afianço nada, não creio que seja possível...
— Há de ser possível, afianço eu. Se o senhor quiser, continuou ela com certo tom insinuativo, tudo se há
de arranjar. Peça-lhe muito, que ele cede. Ande, Senhor João Carneiro, seu afilhado não volta para o
seminário; digo-lhe que não volta...
— Mas, minha senhora...
—Vá, vá.
João Carneiro não se animava a sair, nem podia ficar. Estava entre um puxar de forças opostas. Não lhe
importava, em suma que o rapaz acabasse clérigo, advogado ou médico, ou outra qualquer cousa, vadio
que fosse, mas o pior é que lhe cometiam uma luta ingente com os sentimentos mais íntimos do
compadre, sem certeza do resultado; e, se este fosse negativo, outra luta com Sinhá Rita, cuja última
palavra era ameaçadora: "digo-lhe que ele não volta". Tinha de haver por força um escândalo. João
Carneiro estava com a pupila desvairada, a pálpebra trêmula, o peito ofegante. Os olhares que deitava a
Sinhá Rita eram de súplica, mesclados de um tênue raio de censura. Por que lhe não pedia outra cousa?
Por que lhe não ordenava que fosse a pé, debaixo de chuva, à Tijuca, ou Jacarepaguá? Mas logo persuadir
ao compadre que mudasse a carreira do filho... Conhecia o velho; era capaz de lhe quebrar uma jarra na
cara. Ah! se o rapaz caísse ali, de repente, apoplético, morto! Era uma solução — cruel, é certo, mas
definitiva.
— Então? insistiu Sinhá Rita.
Ele fez-lhe um gesto de mão que esperasse. Coçava a barba, procurando um recurso.
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