Nenhum dos garotos perdidos conhece histórias.

— Que coisa mais triste! — respondeu Wendy.

— Você sabe por que as andorinhas fazem seus ninhos nas calhas das casas? — Peter perguntou. — É para ouvir histórias. Ah, Wendy, sua mãe estava contando uma história tão linda para vocês.

— Qual era?

— Sobre um príncipe que não conseguia encontrar a moça do sapato de cristal.

— Peter! — disse Wendy, empolgada. — Era a Cinderela. No final, o príncipe a encontra e eles vivem felizes para sempre!

Peter ficou tão animado que ficou em pé e correu até a janela.

— Aonde você vai? — perguntou Wendy, apreensiva.

— Contar para os outros garotos!

— Não vá ainda, Peter — pediu ela. — Eu conheço muitas outras histórias.

Foram exatamente essas as palavras que Wendy disse, para que fique bem claro que foi ela a iniciar a provocação.

Peter voltou com uma expressão de cobiça no olhar que deveria ter deixado Wendy alarmada, mas isso não ocorreu.

— Ah, quantas histórias eu poderia contar para os garotos! — exclamou ela, e Peter a agarrou e começou a arrastá-la para a janela.

— Me solta! — ela ordenou.

— Wendy, venha comigo e conte a história para os garotos.

Obviamente ela estava lisonjeada com o convite, mas respondeu:

— Minha nossa, não posso. Pense na minha mãe! Além disso, não sei voar.

— Eu te ensino!

— Ah, deve ser uma delícia!

— Te ensino a pular no vento e sair voando!

— Aaah! — exclamou, maravilhada.

— Wendy, Wendy, em vez de ficar dormindo aí nessa sua cama chata, você podia estar voando comigo por aí, contando piadas para as estrelas.

— Aaah!

— E também, Wendy, tem as sereias.

— Sereias? Com caudas?

— Com caudas enormes!

— Ah! — exclamou Wendy. — Imagine só ver uma sereia!

— Além disso, Wendy — Peter ficava cada vez mais envolvente —, todos iriam te adorar por lá.

O corpo de Wendy tremia. Era como se ela fizesse um esforço para manter os pés colados no chão, mas Peter não dava trégua:

— Wendy — disse, tentador —, você poderia nos colocar para dormir à noite.

— Aaah...

— Ninguém nunca nos pôs para dormir.

— Aaah! — exclamou, estendendo seus braços para ele.

— Você também poderia remendar nossas roupas e fazer bolsinhos novos para nós. Ninguém tem roupas com bolsos por lá.

Como ela poderia resistir?

— Sem dúvida, isso tudo parece fascinante! — ela exclamou. — Peter, você ensina John e Michael a voar também?

— Se você quiser — respondeu Peter com indiferença.

Wendy correu para acordar John e Michael:

— Acordem! — gritou. — Peter Pan está aqui e vai nos ensinar a voar!

John esfregou os olhos:

— Nesse caso eu me levanto — disse ele, que já estava no chão. — Ei! Eu já estou levantado!

Michael também já havia acordado, mais pronto do que um canivete suíço. Peter fez sinal para que ficassem quietos. Seus rostos ficaram com aquela expressão maliciosa de crianças que querem escutar o que está se passando no mundo dos adultos. Tudo ficou quieto e imóvel. Então chegou o momento certo. Não, espera! Nada estava certo. Nana, que tinha passado a noite toda latindo contrariada, de repente ficou em silêncio. Era o silêncio dela que eles estavam ouvindo:

— Apaguem as luzes! Se escondam! — ordenou John, assumindo o comando pela única vez em toda a aventura.

Assim, quando Liza entrou segurando Nana, o quarto parecia o mesmo de todas as noites: bem escuro, aliás dava para jurar que as três crianças dormiam pesado em suas camas. Mas, na verdade, estavam escondidas atrás das cortinas.

Liza estava de mau humor, pois preparava os pudins de Natal na cozinha e foi obrigada a eliminar as suspeitas absurdas de Nana. Tinha até uma uva-passa grudada na bochecha. Achou que a melhor forma de ter um pouco de paz seria levar Nana para olhar o quarto, mas bem segura na coleira, claro.

— Pronto, bicho desconfiado! — disse, sem se compadecer com o desespero de Nana. — Estão completamente seguros, está vendo? Podemos ouvir os três anjinhos dormindo em suas camas. Ouça como roncam tranquilos.

Michael, orgulhoso por sua artimanha estar dando certo, roncou tão alto que quase foram desmascarados. Nana conhecia aquela respiração e tentou se desvencilhar, mas Liza não estava para brincadeiras:

— Chega disso, Nana! — exclamou severa, arrastando Nana para fora do quarto. — E fique sabendo que se você latir outra vez, vou direto chamar o patrão e a patroa lá na festa. E aí eu quero só ver se o patrão não vai te dar uma bela surra!

Amarrou novamente a pobre cachorra, mas você acha que a Nana parou de latir? Que nada! Podem chamar o patrão e a patroa da festa! Isso era exatamente o que ela queria. Nana não se importava em levar umas palmadas, desde que seus protegidos estivessem seguros. Mas, infelizmente, Liza voltou às suas sobremesas, e Nana, vendo que ninguém viria ajudá-la, esticou tanto a corrente que conseguiu arrebentá-la.