Poemas De Ricardo Reis

Poemas de Ricardo Reis

Ricardo Reis (heterônimo de Fernando Pessoa)

Fonte: http://www.cfh.ufsc.br/~magno/

Poemas:

A Abelha que voando

A Cada Qual

Acima da Verdade

A Flor que És

Aguardo

Aqui, dizeis, na cova a que me abeiro

Aqui, Neera, longe

Aqui, neste misérrimo desterro

Ao Longe

Aos Deuses

Antes de Nós

Anjos ou Deuses

A Palidez do Dia

Atrás Não Torna

A Nada Imploram

As Rosas

Azuis os Montes

Bocas Roxas

Breve o Dia

Cada Coisa

Cada dia sem gozo não foi teu

Cada Um

Como

Coroai-me

Cuidas, Índio

Da Lâmpada

Da Nossa Semelhança

De Apolo

De Novo Traz

Deixemos, Lídia

Dia Após Dia

Do que Quero

Domina ou Cala

Estás só. Ninguém o sabe.

Este Seu Escasso Campo

É tão Suave

Feliz Aquele

Felizes

Flores

Frutos

Gozo Sonhado

Inglória

Já Sobre a Fronte

Lenta, Descansa

Lídia

Melhor Destino

Mestre

Meu Gesto

Nada Fica

Não a Ti, Cristo, odeio ou te não quero

Não a Ti, Cristo, odeio ou menosprezo

Não Canto

Não Consentem

Não Queiras

Não quero as oferendas

Não quero, Cloe, teu amor, que oprime

Não quero recordar nem conhecer-me

Não Só Vinho

Não só quem nos odeia ou nos inveja

Não sei de quem recordo meu passado

Não sei se é amor que tens, ou amor que finges

Não Tenhas

Nem da Erva

Negue-me tudo a sorte, menos vê-la

Ninguém a outro ama, senão que ama

Ninguém, na vasta selva virgem

No Breve Número

No Ciclo Eterno

No Magno Dia

A Abelha que voando

A abelha que, voando, freme sobre

A colorida flor, e pousa, quase

Sem diferença dela

À vista que não olha,

Não mudou desde Cecrops.

Só quem vive

Uma vida com ser que se conhece

Envelhece, distinto

Da espécie de que vive.

Ela é a mesma que outra que não ela.

Só nós — ó tempo, ó alma, ó vida, ó morte! —

Mortalmente compramos

Ter mais vida que a vida.

A Cada Qual

A cada qual, como a 'statura, é dada

A justiça: uns faz altos

O fado, outros felizes.

Nada é prêmio: sucede o que acontece.

Nada, Lídia, devemos

Ao fado, senão tê-lo.

Acima da verdade

Acima da verdade estão os deuses.

A nossa ciência é uma falhada cópia

Da certeza com que eles

Sabem que há o Universo.

Tudo é tudo, e mais alto estão os deuses,

Não pertence à ciência conhecê-los,

Mas adorar devemos

Seus vultos como às flores,

Porque visíveis à nossa alta vista,

São tão reais como reais as flores

E no seu calmo Olimpo São outra Natureza.

A flor que és

A flor que és, não a que dás, eu quero.

Porque me negas o que te não peço.

Tempo há para negares

Depois de teres dado.

Flor, sê-me flor!

Se te colher avaro

A mão da infausta esfinge, tu perere

Sombra errarás absurda,

Buscando o que não deste.

Aguardo

Aguardo, equânime, o que não conheço

— Meu futuro e o de tudo.

No fim tudo será silêncio, salvo

Onde o mar banhar nada.

Aqui dizeis na cova a que me abeiro

Aqui, dizeis, na cova a que me abeiro,

Não 'stá quem eu amei.

Olhar nem riso

Se escondem nesta leira.

Ah, mas olhos e boca aqui se escondem!

Mãos apertei, não alma, e aqui jazem.

Homem, um corpo choro!

Aqui, Neera, longe

Aqui, Neera, longe

De homens e de cidades,

Por ninguém nos tolher

O passo, nem vedarem

A nossa vista as casas,

Podemos crer-nos livres.

Bem sei, é flava, que inda

Nos tolhe a vida o corpo,

E não temos a mão

Onde temos a alma;

Bem sei que mesmo aqui

Se nos gasta esta carne

Que os deuses concederam

Ao estado antes de Averno.

Mas aqui não nos prendem

Mais coisas do que a vida,

Mãos alheias não tomam

Do nosso braço, ou passos

Humanos se atravessam

Pelo nosso caminho.

Não nos sentimos presos

Senão com pensarmos nisso,

Por isso não pensemos

E deixemo-nos crer

Na inteira liberdade

Que é a ilusão que agora

Nos torna iguais dos deuses.

Aqui, neste misérrimo desterro

Aqui, neste misérrimo desterro

Onde nem desterrado estou, habito,

Fiel, sem que queira, àquele antigo erro

Pelo qual sou proscritoquerer ser igual a alguém Feliz em suma — quanto a sorte deu A cada .

O erro de coração o único bem

De ele poder ser seu.

Ao Longe

Ao longe os montes têm neve ao sol,

Mas é suave já o frio calmo

Que alisa e agudece

Os dardos do sol alto.

Hoje, Neera, não nos escondamos,

Nada nos falta, porque nada somos.

Não esperamos nada E ternos frio ao sol.