É morte certa andar pela charneca à noite, conforme ocorreu com diversos desafortunados. Algum horror abominável assombra a estrada e reclama os homens como suas vítimas.

– E daí? Como é essa coisa?

– Nenhum homem sabe. Ninguém jamais a viu e sobreviveu, mas quem caminha pela noite já escutou terríveis gargalhadas vindas do brejo, e os homens também escutaram os gritos das suas vítimas. Senhor, em nome de Deus, retorne ao vilarejo, pernoite lá e amanhã tome o caminho do pântano para Torkertown.

No fundo dos olhos melancólicos de Kane, uma luz cintilante começou a brilhar, como a vela de uma feiticeira reluzindo sob braças de gelo cinzento. Seu sangue avivou-se. Aventura! O fascínio do risco e do drama! Não que Kane reconhecesse aquelas sensações como tal. Ele, sinceramente, acreditava dar voz aos seus sentimentos mais sinceros quando afirmou:

– Essas coisas são ações de um poder do mal. Os senhores das trevas jogaram uma maldição nesta Terra. É preciso um homem forte para enfrentar Satanás e seu poder. Portanto, eu irei, já que o desafiei diversas vezes.

– Senhor... – o rapaz começou a dizer, mas fechou a boca ao perceber a futilidade que seria discutir. Apenas acrescentou: – Os cadáveres das vítimas são despedaçados.

Então, ficou ali, na encruzilhada, suspirando, cheio de arrependimento, enquanto observava a figura alta e esguia subir em direção à estrada da charneca.

O Sol estava se pondo quando Kane atingiu o cume do monte baixo que desemboca no brejo. Enorme e vermelho, cor de sangue, o astro afundou atrás do horizonte sombrio da charneca, parecendo atear fogo à grama fétida. Então, por um momento, o observador pareceu contemplar um mar de sangue. A seguir, as sombras vieram deslizando do leste, o fogo no poente se extinguiu, e Solomon Kane seguiu em frente, com audácia, para as entranhas das trevas.

Apesar da falta de uso, a estrada era claramente definível. Kane avançou rápido, porém com sensatez, com a espada e duas pistolas à mão. Ventos noturnos sussurraram por entre a relva, como o choro de espectros. A Lua começou a nascer, magra e abatida, como uma caveira entre as estrelas.

Então, Kane deteve-se de súbito. De algum lugar, à sua frente, soou um estranho e sinistro eco... Ou algo que se parecia com um eco soou mais uma vez, só que agora mais alto. Kane recomeçou a caminhada. Seus sentidos o estavam enganando? Não!

Ao longe, ribombou o sussurro de uma gargalhada assustadora, que, em seguida, se repetiu, mais perto dessa vez. Nenhum ser humano jamais rira daquela maneira; não havia júbilo nela, apenas ódio e horror, um pavor de destroçar a alma. Kane deteve-se. Ele não estava com medo, mas por um segundo quase se desencorajou. Então, após aquelas gargalhadas assustadoras, veio o som de um grito que era, sem dúvida, humano. Kane seguiu adiante e acelerou o passo. Amaldiçoou as luzes ilusórias e as sombras trêmulas que velavam a charneca ao nascer da Lua, tornando impossível a acuidade da visão. As gargalhadas continuavam, cada vez mais altas, assim como os gritos. Então, ouviu-se debilmente o rufar frenético de pés humanos.