Rejeitei sua oferta e imaginei ter triunfado ao ser expulso de Gênova para um solitário e paupérrimo exílio. Meus companheiros haviam sumido: tinham sido expulsos da cidade algumas semanas antes e já se encontravam na França. Eu estava sozinho, sem amigos, sem uma espada a meu lado e sem um ducado no bolso.
Perambulava ao longo da beira-mar, um redemoinho de paixão possuindo e dilacerando minha alma. Era como se uma brasa viva tivesse sido colocada, queimando, em meu peito. Inicialmente, meditei sobre o que deveria fazer. Juntar-me-ia a um bando de flibusteiros. Vingança! A palavra me pareceu um bálsamo: eu a abracei, a acariciei, até que, como uma serpente, me picou. Novamente eu renegaria e desprezaria Gênova, aquele cantinho do mundo. Voltaria a Paris, onde enxameavam muitos de meus amigos; onde meus serviços seriam avidamente aceitos; onde poderia entalhar uma fortuna com minha espada e, talvez, através do sucesso, voltar à minha desprezível cidade natal, e o falso Torella se arrependeria do dia em que expulsaram a mim, um novo Coriolano{1}, de seus muros. Eu voltaria a Paris, então, a pé – um mendigo – e me apresentaria em minha pobreza àqueles a quem outrora eu recebera tão suntuosamente? Havia um amargor só em pensar nisso.
A realidade das coisas começou a se patentear em minha mente, trazendo desespero em seu rastro. Por vários meses eu fora um prisioneiro: os demônios de minha masmorra haviam açoitado minha alma até a loucura, mas tinham subjugado minha forma corpórea. Estava fraco e abatido. Torella usara mil artifícios para me dar conforto; eu detectara e rejeitara todos – e colhi a safra de minha obstinação. O que tinha de ser feito? Deveria eu rastejar diante de meu inimigo e implorar perdão? Seria preferível morrer 10 mil mortes! Eles jamais obteriam essa vitória! Ódio – jurei ódio eterno! Ódio de quem, contra quem? De um desterrado errante contra um poderoso nobre. Eu e meus sentimentos éramos nada para eles: já teriam esquecido alguém tão indigno. E Juliet! Seu rosto angelical e sua forma silfídica{2} reluziam entre as nuvens de meu desespero com inútil beleza; pois eu a havia perdido – a glória e a flor do mundo! Outro a chamará de sua! Aquele sorriso de paraíso abençoará outro!
Mesmo agora meu coração fraqueja dentro de mim quando evoco essa rota de pensamentos de aspecto sombrio. Agora reduzido quase às lágrimas, agora enfurecido em minha agonia, eu ainda perambulava pela margem pedregosa, a qual, a cada passo, tornava-se mais selvagem e mais desolada. Pedras pendentes e precipícios brancos de gelo contemplavam do alto o mar sem ondas; cavernas negras bocejavam; e, para sempre, em meio à erosão do refluxo, murmuravam e quebravam as infrutíferas águas. Agora meu caminho estava praticamente bloqueado por um súbito promontório, tornado quase intransitável por fragmentos caídos do rochedo. A noite estava próxima, quando, na direção do mar, elevou-se, como se ao agitar da vara de um mago, uma escura teia de nuvens, maculando o firmamento azul-celeste de fim de tarde e escurecendo e perturbando o até então plácido oceano. As nuvens possuíam estranhas formas fantásticas e mudavam, e se misturavam, e pareciam ser impelidas por poderoso feitiço. As ondas ergueram suas cristas brancas; o trovão a princípio emudeceu, então rugiu através da amplidão das águas, que adquiriram um escuro tom púrpura, salpicado de espuma. O lugar onde eu estava dava, de um lado, para o extenso e largo oceano; do outro, era bloqueado por rugoso promontório.
Contornando esse cabo, surgiu de repente, tocado pelo vento, um navio. Em vão, os marujos tentavam forçar seu caminho para o mar aberto – o temporal o impelia para as rochas. Ele sucumbirá! Todos a bordo sucumbirão! Quisera estar entre eles!
E, para o meu jovem coração, a ideia da morte surgiu pela primeira vez misturada com a da alegria. Era uma visão terrível observar aquele barco lutar com seu destino. Eu mal conseguia distinguir os marinheiros, mas os ouvia. Logo estaria tudo acabado! – Uma pedra, mal coberta pelas ondas agitadas, e assim mesmo despercebida, jazia à espera de sua presa. O estrondo de um trovão rompeu sobre minha cabeça no momento em que, com um medonho impacto, o esquife projetou-se contra seu inimigo invisível. Num curto espaço de tempo, transformou-se em pedaços.
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