Minha única hesitação resultava do temor de que ele não estaria sendo verdadeiro em seu acordo. Então, pensei: “Em breve morrerei aqui nestas areias solitárias, e os membros que ele cobiça já não serão meus. Vale a pena arriscar”. E, além do mais, eu sabia que, pelas regras da arte da magia, havia fórmulas e juramentos que nenhum de seus praticantes ousaria quebrar. Hesitei em responder, e ele prosseguiu, num momento exibindo sua fortuna, em outro falando do baixo preço que exigia em troca, até parecer loucura recusar. É assim: coloque seu barco na corrente do riacho, e ele descerá e cairá da cachoeira para onde correu; se desistirmos de guiar a forte correnteza da paixão, nos distanciaremos, sem saber para onde.

Ele jurou mil vezes, e eu o esconjurei com muitos nomes sagrados, até que vi aquela maravilha de poder, aquele senhor dos elementos tremer como uma folha de outono diante de minhas palavras; e, como se o espírito falasse a contragosto e forçosamente dentro dele, finalmente, prostrado, com a voz falhada, revelou o feitiço com o qual seria obrigado, caso desejasse trapacear comigo, a devolver o espólio ilegítimo. Nosso quente sangue vital precisava ser misturado para fazer e desfazer o encanto.

Basta desse tema profano. Fui persuadido, a coisa foi feita. A manhã seguinte alvoreceu sobre mim enquanto me encontrava caído sobre o cascalho, e não reconheci minha própria sombra, que se projetava de mim. Senti-me mudado para uma forma de horror e amaldiçoei minha crença fácil e minha cega credulidade. O baú estava ali. Havia ouro e pedras preciosas pelos quais eu vendera a carcaça de carne que a natureza me dera. A visão aliviou um pouco minhas emoções: três dias logo passariam.

E passaram. O anão me abastecera com um farto suprimento de comida. A princípio, eu mal conseguia andar, tão estranhos e desconjuntados estavam todos os meus membros; e minha voz era de um espírito maligno. Mas me mantinha calado, voltava o rosto para o Sol, pois assim talvez não visse minha sombra, e contava as horas e ruminava planos. Colocaria Torella a meus pés e possuiria minha Juliet, a despeito dele. Tudo isso minha fortuna poderia facilmente conseguir. Durante a noite escura dormi e sonhei com a realização dos meus desejos. Dois sóis já haviam se posto, e o terceiro alvorecia. Fiquei agitado, temeroso. Ó expectativa, que coisa terrível és tu quando despertada mais pelo temor do que pela esperança! Como deves serpear em volta do coração, torturando suas pulsações! Como deves dardejar pontadas desconhecidas por todo o nosso frágil mecanismo, ora parecendo nos despedaçar como vidro quebrado, ora dando-nos uma força renovada, a qual nada pode fazer, e desse modo nos atormenta com uma sensação, como a que um homem forte deve sentir quando não consegue romper os seus grilhões, embora estes se dobrem em suas mãos. Lentamente caminhou a brilhante esfera para cima no céu oriental; muito ela demorou-se em seu zênite e ainda mais lentamente vagueou para baixo, para oeste; tocou a beira do horizonte – estava perdida! Seu resplendor estava no cume do rochedo. Ele se tornava pálido e cinzento. A estrela vespertina mostrou seu brilho. Ele logo estará aqui.

Ele não veio! Pelos céus viventes, ele não veio! – e a noite arrastou sua exausta extensão, e, no declínio de sua era, “o dia começou a grisalhar seu cabelo escuro” (em Werner, de LORD Byron){4}, e o Sol ergueu-se novamente sobre o mais infeliz miserável que sempre repreendeu sua luz. Três dias assim eu passei. As joias e o ouro – oh, como os abominei!

Ora, ora, não enegrecerei estas páginas com demoníacos desvarios. Eram todos terríveis – os pensamentos, o feroz tumulto de ideias que enchiam minha alma. Ao final desse período, dormi; não o fazia desde o terceiro pôr do sol; e sonhei que me encontrava aos pés de Juliet, e ela sorria, em seguida dava um grito agudo, pois via a minha transformação, e novamente sorria, pois seu belo amado continuava ajoelhado à sua frente.