Mas eu bem os vejo moverem pelo ar suas flores amarelas.

JOÃO — É preciso esperar.

YERMA — Sim; querendo (Yerma abraça e beija o marido, tomando ela a iniciativa) JOÃO — Se precisas de alguma coisa, dize-me que a trarei. Já sabes que não gosto que saias.

YERMA — Nunca saio.

JOÃO — Estás melhor aqui.

YERMA — É.

JOÃO — A rua é para os desocupados.

YERMA — (Sombria) — Claro. (O marido sai e Yerma dirige-se para a costura. Passa a mão pelo ventre, levanta os braços num lindo bocejo e senta-se a coser) De onde é que vens, amor, meu filho?

Da crista do duro frio.

De que precisas, amor, meu filho?

Do morno pano de teu vestido.

(Enfia a agulha) Que se agitem as ramas ao sol e as fontes saltem todas, em redor!

(Como se falasse com uma criança) Ladra o cão pelo terreiro, na folhagem canta o vento.

Muge o boi ao boiadeiro e a lua me encrespa o cabelo.

Que pedes, filho, de tão longe?

(Pausa)

Os brancos montes que há no teu peito.

Que se agitem as ramas ao sol e as fontes saltem todas, em redor!

(Cosendo)

Filho meu, dir-te-ei que sim.

Despedaçada me dou a ti.

Sofre a cintura que te ofereço, e que será teu primeiro berço!

Quando, meu filho, poderás vir?

(Pausa)

Quando teu corpo cheire a jasmim.

que se agitem as ramas ao sol e as fontes saltem todas, em redor!

(Yerma continua a cantar. Pela porta entra Maria, que vem com um embrulho de roupa)

YERMA — De onde vens?

MARIA — Da loja.

YERMA — Da loja? Tão cedo?

MARIA — Por mim, teria ficado à porta., esperando que abrissem... Quem é capaz de saber o que comprei?

YERMA — Deves ter comprado café, para de manhã, açúcar e pão.

MARIA — Nada disso. Comprei rendas, três varas de linho, fitas de lã de cor para fazer borlas. O dinheiro era de meu marido e foi ele mesmo que me deu.

YERMA — Vais fazer uma blusa.

MARIA — Não. É por que... Sabes?

YERMA — Que é?

MARIA — Por que... Já chegou! (Fica de cabeça baixa. Yerma levanta-se e deixa-se estar contemplando-a com admiração) YERMA — Aos cinco meses!

MARIA — É.

YERMA — E já o percebeste?

MARIA — Naturalmente.

YERMA — (Com curiosidade) — E que sentes?

MARIA — Não sei. Angústia.

YERMA — Angústia (Agarrada a ela) — Mas... Quando chegou? Dize-me. Tu estavas descuidosa.

MARIA — É, descuidosa...

YERMA — Estarias cantando, não é? Eu canto. Tu... Dize-me...

MARIA — Não me perguntes. Nunca tiveste um pássaro vivo apertado na mão?

YERMA — Já.

MARIA — Pois é o mesmo... Mas por dentro do sangue.

YERMA — Que maravilha! (Mira-a extasiada) MARIA — Estou aturdida. Não sei nada.

YERMA — De quê?

MARIA — Do que tenho que fazer. Vou perguntá-lo a minha mãe.

YERMA — Para quê? Já está velha e terá esquecido estas coisas. Não andes muito, e, quando respirares, respira de leve, como se tivesses uma rosa entre os dentes.

MARIA — Ouve: dizem que, mais para adiante, empurra suavemente com as perninhas.

YERMA — E então é quando se lhe tem mais amor; quando já se diz: “meu filho!”

MARIA — No meio de tudo, tenho vergonha.

YERMA — Teu marido, que disse?

MARIA — Nada.

YERMA — Gosta muito de ti?

MARIA — Não me fala nisso, mas põe-se ao pé de mim e seus olhos tremem como duas folhas verdes.

YERMA — Ele sabia que tu...?

MARIA — Sabia.

YERMA — E como o sabia?

MARIA — Não sei. Mas na noite do nosso casamento me dizia tantas vezes isso, com a boca na minha face, que até me parece que o meu filho é um pombinho de luz que ele deixou escorregar pelo meu ouvido.

YERMA — Criatura feliz!

MARIA — Mas tu estás mais inteirada disto do que eu.

YERMA — De que me serve?

MARIA — É verdade. Por que será? De todas as noivas de teu tempo, és a única...

YERMA — Assim é. Claro que ainda é tempo. Helena levou três anos; e outras, antigas, do tempo de minha mãe, levaram muito mais. Mas dois anos e vinte dias, como eu, já é esperar demasiado. Acho que não é justo que me consuma aqui. Muitas noites saio descalça pelo pátio, para pisar a terra, não sei por quê. Se continuo assim, acabarei tornando-me má.

MARIA — Mas, criatura, vem cá: falas como se fosses uma velha.