Que digo! Ninguém se pode queixar destas coisas. Uma irmã de minha mãe teve-o depois de quatorze anos!... e se visses que lindeza de criança!

YERMA — (Com ansiedade) — Que fazia?

MARIA — Chorava como um tourinho, com a força de mil cigarras cantando ao mesmo tempo, e nos molhava, e nos puxava as tranças, e quando fazia quatro meses nos enchia a cara de arranhões.

YERMA — (Rindo) — Mas essas coisas não doem.

MARIA — Eu sei!...

YERMA — Ora! Eu vi minha irmã dar de mamar ao filho com o peito cheio de gretas e lhe produzia uma grande dor, mas era uma dor fresca, boa, necessária à saúde.

MARIA — Dizem que se sofre muito com os filhos.

YERMA — Mentira. Isso é o que dizem as mães fracas, queixosas. Para que os têm? Ter um filho não é ter um ramo de rosas. Precisamos sofrer, para vê-los crescer. Acho que nisso se vai metade do nosso sangue. Mas isso é bom, sadio, belo. Toda mulher tem sangue para quatro ou cinco filhos, e quando os filhos não vêm, o sangue torna-se veneno, como me vai acontecer.

MARIA — Não sei o que tenho.

YERMA — Sempre ouvi dizer que, da primeira vez, as mulheres têm medo.

MARIA — (Tímida) — Vamos a ver... Como coses bem...

YERMA — (Apanhando o embrulho) — Dá cá. Cortarei duas roupinhas. E isto?

MARIA — São as fraldas.

YERMA — Está bem. (Senta-se)

MARIA — Então... Até logo. (Aproxima-se e Yerma toma-lhe amorosamente o ventre nas mãos)

YERMA — Não corras pelas pedras da rua.

MARIA — Adeus. (Beija-a e sai)

YERMA — Volta, assim que puderes (Yerma fica na mesma atitude do começo. Apanha a tesoura e começa a cortar. Entra Victor) Olá, Victor.

VICTOR — (Sério, de aspecto grave) — Por onde anda João?

YERMA — Pelo campo.

VICTOR — Que está cosendo?

YERMA — Estou cortando umas fraldas.

VICTOR — (Sorrindo) — Muito bem!

YERMA — (Rindo) — Vou botar-lhes uma cercadura de renda.

VICTOR — Se for menina, dar-lhe-ás teu nome.

YERMA — (Tremendo) — Como?

VICTOR — Alegro-me por ti.

YERMA — (Quase sufocada) — Não... Não são para mim. São para o filhinho de Maria.

VICTOR — Bem, pois vamos a ver se, com o exemplo, te animas. Nesta casa faz falta uma criança.

YERMA — (Com angústia) — Se faz!

VICTOR — Pois, para a frente! Dize ao teu marido que pense menos no trabalho. Quer juntar dinheiro e há de juntá-lo, mas para quem o deixará, quando morrer? Eu me vou com as ovelhas. Dize ao João que recolha as duas que me comprou. E quanto ao resto... É preciso lavrar mais fundo! (Vai-se embora sorrindo)

YERMA — (Com paixão) É isso! Lavrar mais fundo!

Pois, meu filho, dir-te-ei que sim, despedaçada me dou a ti.

Sofre a cintura que te ofereço para ser teu primeiro berço!

Quando, meu filho, virás a mim?

Quando teu corpo cheire a jasmim!

(Yerma, que em atitude pensativa se levanta e corre para o lugar onde esteve Victor e respira, — fortemente como se aspirasse ar de montanha — vai depois para o outro lado da sala, como à procura de alguma coisa, e de lá volta a sentar-se, e torna a pegar na costura. Começa a coser, e fica de olhos fitos num ponto. Cortina)




SEGUNDO QUADRO


(Campo. Aparece Yerma. Traz uma cesta. Aparece a 1ª Velha)


YERMA — Bons dias.

1ª VELHA — Bons os tenhas, formosa rapariga.