Suas panturrilhas começaram a doer, e ela dava topadas com os dedos dos pés nas pedras do caminho.

Cada vez mais impaciente, resolveu deixar de lado o caminho em ziguezague e seguir por um atalho direto pelo paredão da montanha. Guiando-se pelo lago, precipitou-se pela encosta.

Uma aventura audaciosa, mas quase imediatamente ela descobriu que o declive era muito íngreme. Como estava descendo rápido demais para parar, sua única alternativa foi dobrar as pernas como se estivesse sentada e deslizar pelo terreno escorregadio – confiando que teria sorte.

A partir desse instante, as coisas aconteceram rapidamente. Seu ritmo foi aumentando a cada segundo, apesar de seus esforços para frear com os pés. Tufos azulados e esverdeados passavam por ela a toda velocidade, enquanto o vale vinha ao seu encontro e arremetia-se contra o céu. Antes de se chocar contra o chão, ela foi dirigindo o corpo aos solavancos na direção de uma faixa de árvores lá embaixo, na esperança de que elas pudessem salvá-la de um tombo completo.

Infelizmente, as árvores estavam apodrecidas pela idade avançada; ela passou arrebentando seus galhos e se estabacou bem no meio da trilha de pedras.

Sua queda foi parcialmente amortecida, mas ela se se sentiu bastante dolorida e abalada quando se pôs de pé. Apesar dos ferimentos, não se esqueceu de dar uma risada forçada que havia aprendido na escola como acompanhamento aos acidentes em partidas de esportes variados.

“Que divertido”, murmurou, retirando a sujeira das pernas.

Apesar da queda, ela ficou contente ao ver o santuário a poucos metros acima da trilha; um tributo definitivo à forma como havia manobrado sua queda. Como não estava longe do hotel, desceu tropeando pela ravina, pensando nos confortos que a esperavam. Uma bebida gelada, um banho quente, o jantar na cama. Quando vislumbrou o brilho da água na curva do desfiladeiro, começou a correr com toda sua vontade, ainda que mancando.

Completou a curva e então parou, em completa perplexidade pelo que via. Todos os seus pontos de referência haviam desaparecido, como se alguém tivesse passado uma borracha na paisagem. Não havia mais as casinhas de madeira, nem a estação de trem, nem o píer, muito menos o hotel.

Angustiada e apavorada, ela percebeu que tinha se orientado por uma bússola errada. Aquele não era o lago verde que ela conhecia, em que ela e os amigos se banhavam diariamente. Em vez de ser profundo e oval, era uma lagoa sinuosa e azul clara, com as margens rasas e cobertas de juncos.

Naquelas circunstâncias, só havia uma coisa a fazer: voltar pelo mesmo caminho até o santuário e continuar pela outra ravina. Uma diversão na certa, e ela soltou uma risada sonora antes de começar a refazer a penosa subida.

Estava muito mal-humorada para apreciar o selvagem esplendor do cenário. Era uma cena de desolação extrema, dilacerada por deslizamentos de terra e com montes de pedras estilhaçadas. Não havia vegetação alguma em meio aos pedregulhos, nem chilreio dos pássaros. O único som era o ruído rascante das pedras soltas que ela deslocava com os pés, e o chape de uma pequena queda d’água que espumava em seu curso semisseco, como uma meada de fios brancos embolados.

Acostumada a estar sempre acompanhada, Iris começou a desejar o rosto e a voz de outras pessoas. Em sua solidão, ela se reduziu à fraqueza de sentir pena de si mesma. Lembrou-se de que quando chegasse a hora de retornar à Inglaterra, não estaria voltando para casa como os outros. Estaria apenas voltando.

Atualmente ela morava num hotel, pois havia sublocado seu pequeno apartamento de luxo. Embora levasse um estilo de vida que ela mesma tinha escolhido, naquele momento e naquele lugar, sentiu que pagava um preço muito alto pela liberdade.

Aquele estado de espírito não durou muito, pois, no topo do desfiladeiro, ela se sentiu desafiada em sua coragem. Olhando ao redor para tentar se localizar, descobriu que o santuário era diferente da referência original onde ela tinha encontrado a trilha em ziguezague.

Dessa vez ela não riu, pois teve a impressão de que o humor seria exagero demais. Em vez disso, sentiu ódio de si mesma. Ela achava que conhecia aquelas montanhas porque, com os outros, havia subido e descido os desfiladeiros como num rebanho de cabras-selvagens.

Mas ela tinha apenas seguido os amigos – tinha sido conduzida por eles. No meio do grupo havia um líder necessário: o jovem com o mapa.

Tendo agora de se virar por conta própria, ela não tinha a menor ideia de direção. A única coisa que podia fazer era seguir o desfiladeiro até a próxima ramificação e confiar na sorte.

“Se eu continuar caminhando, chegarei a algum lugar”, pensou. “Além disso, quem tem boca não se perde nunca.”

Ela precisava ser estoica, pois tinha começado a ficar desesperadamente cansada, além de sentir dificuldade de andar por causa de um machucado no calcanhar. Quando chegou a uma bifurcação na trilha, perdeu toda a confiança no discernimento que tinha para experimentar. Sentou-se numa grande pedra e esperou que algum transeunte passasse por ali.

Era o seu momento crítico, quando sua independência parecia ser apenas o privilégio de preencher cheques para sacar o dinheiro obtido com o trabalho dos outros, e sua popularidade parecia nada menos do que o dividendo desses mesmos cheques.

“Eu fui carregada minha vida inteira”, pensou.