Era uma loucura, um delírio. Não sou mais senhor de mim. Examinei-me bem, estou muito fraco, vou morrer. Mas morrer sem ter visto você, sem ter escutado o sussurrar de seu vestido, sem ter recolhido suas lágrimas, que morte!

Quis afastar-se de Júlia, mas seu brusco movimento fez cair uma pistola no chão. A marquesa olhou essa arma com um olhar que não exprimia mais nem paixão nem pensamento. Lorde Grenville recolheu a pistola e pareceu muito contrariado por um acidente que podia passar por uma especulação de apaixonado.

– Arthur!, disse Júlia.

– Senhora, ele respondeu baixando os olhos, eu vinha cheio de desespero, queria...

Calou-se.

– Queria matar-se em minha casa! ela exclamou.

– Não sozinho, ele disse com voz suave.

– O quê! meu marido, talvez?

– Não, não! ele respondeu com a voz sufocada. Mas fique tranquila, meu projeto fatal dissipou-se. Quando entrei, quando vi você, tive então coragem de calar-me, de morrer sozinho.

Júlia levantou-se, lançou-se nos braços de Arthur, que, apesar dos soluços de sua amada, distinguiu duas palavras cheias de paixão.

– Conhecer a felicidade e morrer, ela disse. Então, que seja assim!

Toda a história de Júlia estava contida nesse grito profundo, grito da natureza e do amor ao qual as mulheres sem religião sucumbem; Arthur abraçou-a e arrastou-a para o canapé com um movimento marcado pela violência que uma felicidade inesperada produz. Mas, de repente, a marquesa arrancou-se dos braços de seu amado, lançou-lhe o olhar fixo de uma mulher desesperada, tomou-o pela mão, pegou um candelabro e levou-o até seu quarto de dormir; depois, chegando ao leito onde dormia Helena, afastou suavemente as cortinas e descobriu a filha, pondo a mão diante da vela para que a claridade não ferisse as pálpebras transparentes e mal cerradas da menina. Helena tinha os braços abertos e sorria ao dormir. Júlia mostrou por um olhar sua filha a Lorde Grenville. Esse olhar dizia tudo.

– Um marido podemos abandonar, mesmo que ele nos ame. Um homem é um ser forte, tem seus consolos. Podemos desprezar as leis da sociedade. Mas uma criança sem mãe...! Todos esses pensamentos e muitos outros mais enternecedores estavam ainda nesse olhar.

– Podemos levá-la conosco, disse o inglês murmurando, eu a amarei muito...

– Mamãe!, disse Helena despertando.

A essa palavra, Júlia caiu em lágrimas. Lorde Grenville sentou-se e permaneceu de braços cruzados, mudo e sombrio.

“Mamãe!” Essa bela e ingênua interpelação suscitou tantos sentimentos nobres e simpatias tão irresistíveis que o amor foi por um momento esmagado sob a voz poderosa da maternidade. Júlia não era mais mulher, era mãe. Lorde Grenville não resistiu por muito tempo, as lágrimas de Júlia o contagiaram. Nesse momento, uma porta aberta com violência fez um grande ruído, e as palavras: “Senhora d’Aiglemont, está acordada?” soaram como um trovão no coração dos dois amantes. O marquês havia voltado. Antes que Júlia pudesse recuperar seu sangue-frio, o general dirigiu-se de seu quarto ao da esposa. As duas peças eram contíguas. Júlia fez então um sinal a Lorde Grenville para esconder-se num quarto de vestir, cuja porta foi prontamente fechada pela marquesa.

– Pois é, minha esposa, disse-lhe Vítor, estou de volta! A caçada não se realizou. Vou deitar-me.

– Boa noite, farei o mesmo, ela respondeu. Permita-me agora que me dispa.

– Está muito rabugenta esta noite. Mas obedeço, senhora marquesa!

O general tornou a seu quarto, Júlia o acompanhou para fechar a porta de comunicação e correu a libertar Lorde Grenville. Recuperou toda a presença de espírito e pensou que a visita de seu ex-médico era muito natural; podia tê-lo deixado no salão para vir deitar a filha, e ia dizer-lhe que voltasse para lá sem ruído; mas, quando abriu a porta do quarto de vestir, soltou um grito lancinante. Os dedos de Lorde Grenville tinham se prendido e esmagado na ranhura da janela.

– Ei! Que aconteceu?, perguntou-lhe o marido.

– Nada, nada, ela respondeu, apenas piquei o dedo com um alfinete.

A porta de comunicação tornou a abrir-se. A marquesa acreditou que o marido vinha por causa dela, e maldisse essa solicitude em que o coração não importava.