Mas qual! Rosanna não era Nancy, a verdade é essa!
— Agora me diga, querida — disse eu por que está chorando?
— Por causa dos anos que passaram, Sr. Betteredge —, disse Rosanna baixinho. — Minha vida pregressa ainda me atormenta às vezes.
— Vamos, minha garota — disse eu —, sua vida pregressa foi apagada. Por que não consegue esquecê-la?
Ela segurou uma das golas do meu casaco. Sou um velho desastrado, e muito da minha comida e bebida caem em minhas roupas. Às vezes uma das mulheres, às vezes outra, limpa minha sujeira. Na véspera, Rosanna havia tirado uma mancha da gola do meu casaco para mim, com um produto novo que garantia remover qualquer mancha. A gordura havia saído, mas uma parte mais opaca na ponta do tecido mostrava onde a mancha havia estado. A garota apontou para o local e balançou a cabeça.
— A mancha saiu — disse ela. — Mas ainda se pode ver Sr. Betteredge: ainda se pode ver!
Tal observação feita a um homem usando como exemplo seu próprio casaco não é fácil de responder. Algo na própria garota também me fazia ter pena dela naquele momento específico. Ela tinha belos olhos castanhos, mesmo sendo feia em tudo o mais — e me olhava com muito respeito por minha idade e meu caráter, qualidades fora de seu alcance, o que fez com que meu coração pesasse por nossa segunda arrumadeira. Sentindo-me incapaz de confortá-la, havia apenas uma coisa a fazer. Isto é: levá-la para jantar.
— Ajude-me a me levantar — disse eu. — Você está atrasada para o jantar, Rosanna, e eu vim buscá-la.
— O senhor, Sr. Betteredge! — disse ela.
— Disseram a Nancy para vir buscá-la — disse eu. — Mas pensei que iria preferir ser repreendida por mim, querida.
Em vez de me ajudar a me levantar, a pobre menina colocou sua mão na minha e apertou de leve. Tentou com força não tomar a chorar e conseguiu — pelo que teve meu respeito.
— O senhor é muito gentil, Sr. Betteredge — disse ela. — Não quero jantar hoje; deixe-me ficar aqui mais um pouco.
— O que a faz gostar de estar aqui? — perguntei. — O que a traz sempre a este feio lugar?
— Algo me atrai aqui — disse a garota, desenhando figuras com os dedos na areia. — Tento ficar longe e não consigo. Algumas vezes — falou ela em voz baixa, como se tivesse medo do que ia dizer —, algumas vezes, Sr. Betteredge, penso que meu túmulo me espera aqui.
— Há carneiro na brasa e torta esperando por você! — disse eu.
— Vá jantar imediatamente. É isso que acontece, Rosanna, quando se pensa de estômago vazio.
Falei com severidade, naturalmente indignado (na minha idade) ao escutar uma jovem de 25 anos falar de seu fim derradeiro!
Ela não pareceu escutar-me: colocou a mão em meu ombro, mantendo-me onde estava, sentado ao seu lado.
— Penso que o lugar me amaldiçoou — disse ela. — Sonho com ele noite após noite; penso nele quando estou costurando. O senhor sabe que eu sou muito grata, Sr. Betteredge; sabe que tento merecer sua gentileza e a confiança de minha senhora. Mas algumas vezes me pergunto se a vida aqui não é demasiado calma e boa para uma mulher como eu, depois de tudo por que passei, Sr.
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