Referência ao poema homônimo “Old familiar faces” (1798), do poeta inglês Charles Lamb.
21. Referência ao médico inglês William Harvey, que em 1628 descreveu pela primeira vez, em detalhes, a circulação do sangue no corpo humano, e aos estudos de Robert Boyle e seu assistente, Robert Hooke, que descobriram diversas características do ar, incluindo seu papel na combustão, na respiração e na transmissão do som.
CAPÍTULO 4
A partir desse dia, a filosofia natural e particularmente a química, no sentido mais amplo do termo, tornaram-se quase minha única ocupação. Lia com ardor as obras, tão cheias de genialidade e discernimento, que questionadores modernos haviam escrito sobre esses assuntos. Frequentava as aulas e cultivava relações com homens de ciência da universidade; e até encontrei no sr. Krempe uma boa dose de bom senso e informação verdadeira, combinados, é verdade, com uma fisionomia e modos repulsivos, mas não por isso menos valiosos. No sr. Waldman encontrei um verdadeiro amigo. Sua gentileza nunca era marcada pelo dogmatismo, e suas instruções eram dadas com um ar de franqueza e bondade que afastavam qualquer ideia de pedantismo. De diversas formas, ele suavizou o caminho do conhecimento para mim e tornou claros e fáceis à minha compreensão os questionamentos mais obtusos. Minha dedicação, de início vacilante e incerta, ganhou força conforme eu seguia e logo se tornou tão ardente e ávida que as estrelas frequentemente desapareciam na luz da manhã enquanto eu ainda estava entretido em meu laboratório.
Com tanto empenho é fácil imaginar que meu progresso foi rápido. Meu ardor foi de fato o espanto dos alunos e minha proficiência, o dos mestres. O professor Krempe frequentemente me perguntava, com um sorriso dissimulado, como ia Cornelius Agrippa, enquanto o sr. Waldman expressava a mais sincera exultação pelo meu progresso. Dois anos se passaram dessa maneira, durante os quais não fui a Genebra, ocupado como estava, de coração e alma, com a busca de algumas descobertas que esperava fazer. Só quem as vivenciou pode compreender as seduções da ciência. Em outros estudos, você vai até onde os outros foram antes de você, e não há mais nada a saber; mas na busca científica existe um fomento contínuo para a descoberta e o espanto. Uma mente de capacidade moderada que se dedica a um estudo deve invariavelmente alcançar grande proficiência nesse estudo; e eu, que buscava sem descanso a conquista de meus objetos de pesquisa e estava envolvido exclusivamente nisso, melhorava tão rápido que, no final de dois anos, havia feito algumas descobertas no desenvolvimento de certos instrumentos químicos que me trouxeram grande estima e admiração na universidade. Quando cheguei a esse ponto, e estava tão familiarizado com a teoria e a prática da filosofia natural quanto as lições de qualquer professor em Ingolstadt permitiam, minha residência lá deixou de ser propícia a meus desenvolvimentos, e pensei em voltar para meus amigos e minha cidade natal, mas um acidente prolongou a estada.
Um dos fenômenos que haviam particularmente atraído minha atenção era a estrutura da constituição humana e, de fato, de qualquer animal dotado de vida. De onde, frequentemente me perguntava, surgira o princípio da vida? Era uma questão densa, que sempre foi considerada um mistério; ainda assim, quantas coisas não descobriríamos se a covardia e o descuido não contivessem nossos questionamentos. Revolvi essas circunstâncias em minha mente e decidi, daí em diante, me aplicar mais particularmente aos ramos da filosofia natural que se relacionam à fisiologia. Se não estivesse imbuído de um entusiasmo quase sobrenatural, minha aplicação a esse estudo teria sido maçante e quase intolerável. Para examinar as causas da vida, precisamos primeiro entender a morte. Familiarizei-me com a ciência da anatomia, mas isso não foi suficiente; devia também observar a decadência natural e a corrupção do corpo humano. Na minha educação, meu pai havia tomado as maiores precauções para que minha mente não se impressionasse com horrores sobrenaturais. Não me lembro de jamais ter tremido diante de um conto de superstição ou de ter receado a aparição de um espírito. A escuridão não tinha efeito sobre minha imaginação, e um cemitério era para mim meramente o receptáculo de corpos desprovidos de vida, que, de repositório de beleza e força, haviam passado a comida de minhoca. Agora eu era induzido a examinar a causa e o progresso desse apodrecimento e forçado a passar dias e noites em catacumbas e mausoléus. Minha atenção fixou-se nos objetos mais insuportáveis para a delicadeza dos sentimentos humanos. Observava como a bela forma de um homem era degradada e desgastada; contemplava a corrupção da morte sucedendo-se ao florescente corar da vida; via como o verme herda os encantos do olho e do cérebro. Detinha-me a examinar e a analisar todas as minúcias da causalidade, como exemplificadas na passagem da vida para a morte e da morte para a vida, até que, no meio dessas trevas, uma luz repentina irrompeu sobre mim – uma luz tão brilhante e maravilhosa, e ainda assim tão simples, que, embora tenha ficado tonto com a imensidade do prospecto que ela ilustrava, me surpreendi que, entre tantos intelectuais que haviam dirigido suas questões à mesma ciência, estivesse eu destinado a descobrir um segredo tão espantoso.
Lembre-se de que não estou registrando a visão de um louco.
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