O tio prometera-lhe, quando fizesse dezasseis anos, prepará-lo para ingressar na escola naval. Dava-lhe, para que lesse, histórias de almirantes famosos e de insignes navegadores. O quarto de Emil parecia o camarote de um navio. Robinson e Simbad o Marinheiro eram os seus heróis favoritos. Andava gingando-se como um lobo do mar e empregava termos náuticos para a esquerda e para a direita. Os pequenos chamavam-lhe o "Almirante" e admiravam a esquadra que possuía, a qual, com frequência, sofria graves desastres.
"Meio-Brooke" era uma prova viva dos prodígios que a educação opera ao estabelecer uma harmonia perfeita entre a matéria e o espírito. De carácter meigo, simples nas maneiras, carinhoso e inocente, como reflexo de uma mãe excelsa, forte e vigoroso, como resultado de um pai atento ao seu desenvolvimento, desempoeirado e culto, como consequência das sensatas lições de um prudente avô, "Meio-Brooke" abria-se para a vida intelectual como as rosas desabrocham às carícias do sol e ao orvalho da manhã. Não era um menino perfeito, mas os seus defeitos eram poucos e ligeiros.
Aprendera a arte de conter-se e dominar-se. Arte difícil que muitos homens não chegam a possuir nunca! "Meio-Brooke" ignorava que era famoso e inteligente. Admirava a beleza e a inteligência dos outros. Vivia alegremente. Gostava de ler livros de histórias fantásticas e por causa disso e pela sua tendência para a espiritualidade os pais procuravam, à força duma vida sã e de lições de carácter útil, evitar qualquer desequilíbrio, pois não queriam transformá-lo num desses meninos pálidos e precoces que são efemeramente o orgulho das famílias.
A mudança de "Meio-Brooke" para Plumfield deu magníficos resultados. O contacto com os outros rapazes tornou-o de certo modo prático e limpou-lhe o cérebro das suas levianas fantasmagorias. Quando foi de férias os pais ficaram radiantes ao ouvi-lo falar com voz forte e ao ouvi-lo pedir umas "botas" que rangessem como as do pai. Rira-se este satisfeito, comprando-lhas. E pensou:
"Quero e muito me agrada que ele seja varonil. Esta sua rudeza de agora não me preocupa. Pouco a pouco ir-lhe-emos limando as arestas e polindo-o. No que respeita ao ensino,recebê-lo-á como as pombas comem o milho. Não há que ter pressas. "
Daisy era um encanto, uma mulher pequenina, possuidora de excelentes qualidades. Cuidava maravilhosamente das coisas da casa. Tinha em perfeita ordem uma família de bonecas. Não dava um passo que não levasse o seu cestinho de costura, cosendo com tal esmero que "Meio-Brooke" ostentava com orgulho um lenço embainhado por sua irmã. Josy tinha um colete de flanela cosido por Daisy. A pequena enxugava a louça, cuidava dos saleiros, punha os talheres, limpava o pó e ajudava em todas as lidas domésticas. "Meio-Brooke" defendia-a sempre com heroísmo nas batalhas de almofadas e nunca se cansava de elogiar os dotes espirituais da sua irmãzinha. Esta tinha o irmão gémeo na conta do menino mais importante do mundo e todas as manhãs, assim que punha o penteador, calçava-se e corria a acordá-lo, dizendo-lhe:
– Levanta-te. São horas de tomar o pequeno-almoço.
Rob era um rapaz travesso que parecia ter resolvido, na prática, o problema do moto contínuo.
Era muito irrequieto, sem, no entanto,ser indócil nem conflituoso. Era,na verdade,um grande palrador e vivia agitando-se como um pêndulo entre o pai e a mãe.
Teddy era muito pequeno para tomar parte ativa nos assuntos de Plumfield. Todavia, tinha também a sua esfera de ação e nela movimentava-se bem. Todos sentiam, de vez em quando, a necessidade de um garoto pequenino a quem pudessem acariciar, e Teddy, que muito gostava de mimos, estava sempre disposto a deixar-se acarinhar.
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