Trata-se, sem dúvida, de importante campo da investigação econômica, em cujo âmbito as indicações de Marx são preciosas para marxistas e não-marxistas.
Por fim, Marx referiu-se ao que denominou de faux frais: falsos gastos inseridos no processo de produção, embora sem lhe dar contribuição do ponto de vista técnico e produtivo. Um desses falsos gastos é o do trabalho de vigilância ou controle da força de trabalho, que impõe um acréscimo de custos sem significação técnica para a produção propriamente dita, decorrendo tão-somente do caráter antagônico das relações de produção. Se, nesta questão, Marx estava certo do ponto de vista de suas premissas, tanto mais quanto os serviços de controle dos trabalhadores se sofisticaram nas grandes empresas modernas (com a expansão dos “serviços sociais” e congêneres), o mesmo não se podia dizer da imputação de faux frais à contabilidade. Afinal, a produção industrial moderna, sejam os países capitalistas ou socialistas, é tecnicamente impraticável sem contabilidade. Como, por igual, no capitalismo avançado dos dias atuais seria errôneo deixar de qualificar a pesquisa científica e o desenvolvimento de projetos como trabalho produtivo, ao passo que o marketing e a propaganda entram, sem dúvida, no âmbito do trabalho improdutivo, pois sua utilização não é suscitada senão pela natureza mercantil e concorrencial do modo de produção capitalista.
Mais-valia e acumulação de capital
Acumulação capitalista significa valorização do capital, o que, por sua vez, significa incremento do capital adiantado mediante produção de mais-valia.
Sob a compulsão da concorrência, que elimina as empresas estacionárias, os capitalistas, na condição de personificação do capital, anseiam por quantidades cada vez maiores de mais-valia. Nos primórdios do regime capitalista, quando as inovações técnicas avançavam 40
MARX
com lentidão, o aumento da quantidade de mais-valia por operário ocupado só era possível mediante criação de mais-valia absoluta, isto é, mediante prolongamento da jornada de trabalho ou intensificação das tarefas, de tal maneira que o tempo de sobretrabalho (criador de mais-valia) aumentasse, enquanto se conservava igual o tempo de trabalho necessário (criador do valor do salário). No entanto, a característica mais essencial do modo de produção capitalista não é a criação de mais-valia absoluta, porém de mais-valia relativa. Esta resulta do acúmulo de inovações técnicas, que elevam a produtividade social do trabalho e acabam por diminuir o valor dos bens de consumo nos quais se traduz o valor da força de trabalho, exigindo menor tempo de trabalho para a reprodução desta última. Por isso, sem que se alterem o tempo e a intensidade da jornada de trabalho, cuja grandeza permanece a mesma, altera-se a relação entre seus componentes: se diminui o tempo de trabalho necessário, deve crescer, em contrapartida, o tempo de sobretrabalho.
Cada capitalista forceja por ultrapassar os concorrentes e, para tanto, busca introduzir em sua empresa aperfeiçoamentos técnicos (na acepção mais ampla) que lhe dêem vantagem sobre os rivais. Enquanto tais aperfeiçoamentos forem exclusivos de uma empresa, suas mercadorias serão produzidas com um tempo de trabalho inferior ao socialmente necessário, o que lhe propiciará certa quantidade de mais-valia extra ou superlucro. Ao se difundirem os aperfeiçoamentos a princípio introduzidos numa empresa isolada, desaparecerá a mais-valia extra, mas terá ido adiante o processo de aumento da produtividade social do trabalho, cuja resultante é a criação de mais-valia relativa.
(O que Marx considera lucro ordinário, Marshall denomina de custo do fator capital. No sistema de Marshall, o superlucro marxiano entra no conceito de quase-renda. Schumpeter não considera o lucro ordinário como lucro, porém como remuneração do trabalho de administração, sendo o lucro verdadeiro equivalente apenas ao superlucro marxiano).
À medida que se implementam inovações técnicas poupadoras de mão-de-obra, tais ou quais contingentes de operários são lançados no desemprego, em que se mantêm por certo tempo, até quando a própria acumulação do capital requeira maior quantidade de força de trabalho e dê origem a novos empregos. Assim, a própria dinâmica do capitalismo atua no sentido de criar uma superpopulação relativa flu-tuante ou exército industrial de reserva.
Já Ricardo concluíra, com exemplar honestidade científica, que a introdução de maquinaria conduz ao crescimento da massa de trabalhadores desempregados e lhes traz os sofrimentos da desocupação.
Mas justificou a vantagem da maquinaria para os capitalistas, sem que, não obstante, enxergasse significação econômica estrutural na massa de desempregados. Do ponto de vista de Marx, o exército industrial de reserva representa elemento estrutural indispensável ao 41
OS ECONOMISTAS
modo de produção capitalista e daí sua incessante reconstituição mediante introdução de inovações técnicas, o que torna essa reconstituição independente do crescimento vegetativo da população. O exército industrial de reserva funciona como regulador do nível geral de salários, impedindo que se eleve acima do valor da força de trabalho ou, se possível e de preferência, situando-o abaixo desse valor. Outra função do exército industrial de reserva consiste em colocar à disposição do capital a mão-de-obra suplementar de que carece nos momentos de brusca expansão produtiva, por motivo de abertura de novos mercados, de ingresso na fase de auge do ciclo econômico etc.
Marx formulou uma lei geral absoluta da acumulação capitalista, segundo a qual se concentra, num pólo, a massa cada vez maior de riquezas à disposição do capital, enquanto, no pólo oposto, aumenta a miséria das massas trabalhadoras. Esta lei, apresentada no Livro Primeiro, tem sido objeto de variadas exegeses e acirradas discussões nos meios marxistas, ao passo que os antimarxistas encontram nela reiterado motivo para contestação.
Certa parte dos marxistas interpretou a formulação marxiana no sentido de inelutável pauperização absoluta ou queda secular do padrão da existência material da classe operária no regime capitalista, inclusive sob o aspecto dos salários reais, que tenderiam a ser cada vez mais baixos, conforme sustentam, por exemplo, os autores do Manual de Economia Política da Academia de Ciências da URSS. Já Ronald Meek viu na referida lei um dos erros mais clamorosos de Marx, em face das evidentes melhoras das condições de vida dos operários ingleses no decorrer do último século. Ambas as posições foram refutadas por Mandel e Rosdolsky através de exaustiva análise da questão à luz dos textos marxianos em confronto com os dados do desenvolvimento do capitalismo.
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