Marx esforçou-se no sentido de eliminar esta transição imediata do conceito abstrato de valor à realidade empírica dos preços. E o fez descobrindo as mediações dialéticas que balizam o trajeto do valor aos preços de mercado.

A primeira mediação consiste na taxa de mais-valia, que se distingue da taxa de lucro. A taxa de mais-valia é a relação entre a mais-valia e o capital variável. A taxa de lucro é a relação entre a mais-valia e o capital individual total (soma do capital variável com 44

MARX

o capital constante). A taxa de mais-valia revela o grau de exploração da força de trabalho, ao passo que a taxa de lucro indica o grau de valorização do capital. Os capitalistas e os economistas, seus intelectuais orgânicos, só se interessam pela taxa de lucro, que dá origem à ilusão ideológica de que o sobreproduto é criado pelo capital em conjunto e não somente por sua parte variável. Ilusão que reforça o fetichismo do capital.

Como, porém, a composição orgânica do capital difere entre os vários ramos da produção, se a taxa de mais-valia for igual para todos eles (o que pode ser coerente, do ponto de vista teórico, e aproximado, do ponto de vista empírico), então as taxas de lucro serão desiguais de um ramo para outro. Ora, a observação mais trivial indica que as taxas de lucro não variam em função do coeficiente de capital variável de cada capital individual. Em períodos plurianuais, os capitais individuais valorizam-se de acordo com uma taxa geral média, que não tem relação com os diferentes quantitativos de força de trabalho empregados pelos capitais individuais.

A formação dessa taxa média de lucro resulta da concorrência, que força parte dos capitais a se transferir, nas circunstâncias dadas, dos ramos com taxa de lucro cadente para os ramos com taxa de lucro ascendente. Em conseqüência, o montante de mais-valia produzido por todos os capitais individuais se redistribui entre eles em proporção à cota-parte global de cada um e não à cota-parte da força de trabalho empregada. Certa proporção de mais-valia se transfere dos capitais com baixa composição orgânica para os capitais com alta composição orgânica, o que, em meio a inumeráveis e incessantes flutuações, estabelece a taxa geral ou taxa média de lucro. Esta, apesar de geral, não é uniforme em cada momento dado. Ao contrário, em cada momento dado, as taxas de lucro são diferentes nos vários ramos da produção, o que, precisamente, obriga os capitais concorrentes a se moverem de uns ramos para outros. É desse movimento que resulta a taxa média, em períodos que só podem ser plurianuais, emergindo a taxa média da alternância entre taxas altas e baixas.

A mediação entre a taxa de mais-valia e a taxa de lucro preside a transformação do valor em preço de produção. A fórmula do valor é: capital constante + capital variável + mais-valia. A fórmula do preço de produção é: capital constante + capital variável + lucro médio. Aos gastos correntes de capital constante e variável, num tempo de rotação delimitado, Marx denomina de preço de custo. Somado o preço de custo ao lucro médio, proporcional ao capital individual total investido, ob-tém-se o preço de produção.

Recorrendo a um modelo aritmético de cinco setores, Marx demonstrou, no Livro Terceiro, como é possível a transformação do valor em preço de produção com a simultânea satisfação de duas equações: a da igualdade entre o total dos valores e o total dos preços de produção; 45

OS ECONOMISTAS

e a da igualdade entre o total da mais-valia e o total dos lucros. Trata-se do que chamaremos doravante de teorema das duas igualdades.

No modo de produção capitalista, a lei do valor manifesta-se nestas duas igualdades ao nível do sistema em conjunto, dado que, nas transações singulares, já não é possível, senão por acaso, a troca de equivalentes. Uma vez que o preço de produção é inexplicável sem o pressuposto do valor, a lei do valor domina no modo de produção capitalista porém o faz sob a metamorfose que converte o valor em preço de produção.

Por conseguinte, o regulador do nível das oscilações dos preços de mercado já não é diretamente o valor, mas sua forma transfigurada de preço de produção. Contudo, entre o preço de produção e os preços de mercado, Marx colocou mais uma mediação categorial — a do valor de mercado. Cada mercadoria é lançada à venda com um valor individual, a partir do qual deverá concorrer com as mercadorias congêneres do mesmo setor. Grosso modo, conforme a produtividade técnica aplicada à sua produção e o grau de exploração da força de trabalho, as mercadorias se distribuem em três grupos: a) o de preço de produção igual à média socialmente necessária; b) o de preço de produção superior à média; c) o de preço de produção inferior à média.