— Maldita festa — gritou ele — que irá me perseguir por toda parte! Ah, meu Deus! Até

nesta pequena ilha quase deserta!

Em seguida, ele observou o rio Sena a seus pés e uma terrível sensação invadiu-lhe o corpo:

— Com que boa vontade eu me afogaria se a água não estivesse tão fria!

Então, surgiu nele uma resolução desesperada. Já que não podia escapar do Papa dos Loucos, das bandeiras do pintor Jehan Fourbault e dos fogos de artifício, que mergulhasse bravamente no próprio coração da festa e fosse para a Praça da Greve!

"Pode ser", pensou, "que eu consiga uma centelha de fogueira para me aquecer e até

mesmo jante por lá."

Quando Pierre Gringoire chegou à Praça da Greve, congelava de frio. Ele havia evitado a multidão e as bandeirolas de Jehan Fourbault, mas as rodas de todos os moinhos pelos quais passou o haviam molhado, encharcando sua blusa.

Ele apressou-se em se aproximar da fogueira que queimava magnificamente no meio da praça, mas uma multidão considerável estava à sua volta. Examinando mais de perto, percebeu que o círculo era grande demais para que todos desejassem se aquecer no fogo e que este grupo de espectadores não fora atraído unicamente pela beleza dos galhos que queimavam.

Num vasto espaço deixado livre entre a multidão e a fogueira, uma moça dançava. Ela não era grande, mas parecia, de tanto que sua pequena figura se lançava aos movimentos. Era morena, mas percebia-se que durante o dia sua pele devia ter o reflexo dourado das mulheres espanholas ou italianas. Seus pés pequenos dançavam à vontade nos sapatos graciosos. Ela girava e se contorcia sobre um velho tapete persa e, cada vez que a face radiante passava diante de alguém, seus grandes olhos negros atiravam um raio.

Em torno dela, concentravam-se olhares fixos e bocas entreabertas. Enquanto ela dançava assim ao som do tambor, os braços se elevavam acima da cabeça pequena, frágil e viva como uma vespa, com seu corpete de ouro, seu vestido colorido, seus cabelos negros, seus olhos de chamas. Com efeito, ela era uma cigana!

"Na verdade", pensou Gringoire, "é uma deusa". Neste momento, uma das tranças dos cabelos da "divindade" desprendeu-se e um pedaço de cobre amarelo rolou por terra.

— Oh, não! — ele exclamou. — É uma cigana!

Toda ilusão havia desaparecido, pois ela de fato era uma cigana. Entre os rostos que o fogo tingia de escarlate, havia um que parecia absorvido pela contemplação da dançarina mais que todos os outros. Era severo, calmo e sinistro. Este homem, cujos trajes estavam escondidos pela multidão que o cercava, não parecia ter mais que trinta e cinco anos e, no entanto, era careca. As têmporas mal sustentavam alguns raros tufos de cabelo, já brancos. A testa larga e alta começava a se encher de rugas, mas nos olhos fundos brilhava uma juventude extraordinária. Ele os mantinha sem cessar presos à cigana e, enquanto a moça de dezesseis anos dançava e esvoaçava para o prazer de todos, seus devaneios tornavam-se cada vez mais sombrios.

A jovem, sem fôlego, enfim parou e o povo a aplaudiu.

— Djali — disse a cigana.

Gringoire viu, então, chegar uma pequena cabra branca, alegre e lustrosa, com chifres dourados, pés dourados e uma coleira dourada.

— Djali — disse a dançarina —, é sua vez. Sentando-se, ela apresentou graciosamente seu tambor à cabra.

— Djali — continuou —, em que mês nós estamos?

A cabra levantou a pata dianteira e bateu uma única vez no tambor. Realmente, era o primeiro mês do ano e a multidão aplaudiu.

— Djali — prosseguiu a cigana —, em que dia do mês estamos?

O animal levantou o pé dourado e bateu seis vezes no tambor.