Tarde demais, decidiu brincar e ofereceu a ele um sorriso envergonhado.
Warren ficou incomodado. Embora não estivesse acostumado que levassem a observação a sério, ela ainda assim costumava provocar um riso ou uma porção de brincadeiras sentimentais. E detestava ser chamado de atrevido, a não ser por gozação. Seu impulso generoso morreu, e ele mudou de assunto.
– Jim Strain e Ethel Demorest estão aqui fora, como sempre – comentou.
Isso estava mais de acordo com Bernice, mas um débil arrependimento se misturou ao seu alívio com a mudança de assunto. Os homens não lhe falavam sobre bocas beijáveis, mas ela sabia que eles falavam disso com outras garotas.
– Ah, sim – disse ela, rindo. – Ouvi dizer que os dois vêm se enrolando há anos por não terem um tostão furado. Não é uma chatice?
O enfado de Warren aumentou. Jim Strain era um bom amigo de seu irmão e, de qualquer modo, ele considerava falta de educação desprezar alguém por não ter dinheiro. Mas Bernice não tivera intenção de demonstrar desprezo. Apenas estava nervosa.
II
Quando Marjorie e Bernice chegaram em casa meia hora depois da meia-noite, desejaram-se boa noite no alto da escada. Embora fossem primas, não tinham intimidade. Na verdade, Marjorie não tinha amigas íntimas – achava as garotas burras. Bernice, pelo contrário, durante toda esta visita arranjada pelos pais das duas havia desejado muito trocar aquelas confidências temperadas com risos e lágrimas que considerava fatores indispensáveis em todos os relacionamentos femininos. Mas, nesse sentido, Marjorie mostrou-se bastante fria; de certo modo, para conversar com ela, sentia a mesma dificuldade que experimentava ao conversar com os homens. Marjorie nunca ria, nunca ficava assustada, raramente sentia-se envergonhada e, na realidade, tinha muito poucas das qualidades que Bernice considerava apropriada e abençoadamente femininas.
Enquanto se ocupava da escova e da pasta de dentes naquela noite, Bernice perguntou-se pela centésima vez por que nunca recebia qualquer atenção quando estava longe de casa. O fato de que a sua família fosse a mais rica de Eau Claire, de que a sua mãe fizesse festas frequentes, oferecesse jantares para a filha antes de todos os bailes e de que tivesse lhe comprado um carro para que desse as suas voltas nunca lhe ocorreu como fatores relacionados ao sucesso social de que gozava em sua cidade natal. Como a maioria das garotas, ela havia sido criada com o leite morno de Annie Fellows Johnston[2] e romances nos quais a mulher é amada por certas qualidades femininas misteriosas, sempre mencionadas, mas jamais reveladas.
Bernice sentia uma dor vaga por não estar sendo popular naquele momento. Não sabia que, se não fosse pela campanha de Marjorie, teria dançado a noite toda com apenas um rapaz; mas sabia que, mesmo em Eau Claire, outras garotas com menos posição e menos beleza física recebiam muito mais atenção. Atribuía isso a algo sutilmente inescrupuloso por parte dessas garotas. Era algo que nunca a havia preocupado e, se houvesse, sua mãe teria lhe assegurado que as outras garotas se desvalorizavam, e que os homens realmente respeitavam garotas como Bernice.
Desligou a luz do banheiro e, num impulso, resolveu entrar e conversar por um instante com sua tia Josephine, cuja luz ainda estava acesa. Seus chinelos macios a levaram silenciosamente pelo corredor acarpetado, mas, ao escutar vozes vindo do quarto, parou perto da porta entreaberta. Então ouviu o próprio nome e, sem qualquer intenção clara de escutar atrás da porta, permaneceu ali – e o assunto da conversa que ocorria lá dentro atingiu sua consciência de modo afiado, como se ela tivesse sido atravessada com uma agulha.
– Ela é um caso absolutamente perdido! – era a voz de Marjorie. – Ah, eu sei o que você vai dizer! Que muita gente lhe disse o quanto ela é bonita e doce, e como ela sabe cozinhar! E daí? Ela é chata. Os homens não gostam dela.
– Ah, e que diferença faz esse tipo de popularidade?
A sra. Harvey pareceu irritada.
– Isso é tudo quando se tem dezoito anos – disse Marjorie, enfaticamente. – Eu fiz o melhor que pude. Fui educada e fiz homens dançarem com ela, mas eles simplesmente não suportam ficar entediados. Quando penso naquela maravilhosa pele desperdiçada numa bobona dessas e penso no que Martha Carey poderia fazer com ela... ah!
– Não há mais cortesia hoje em dia.
A voz da sra. Harvey dava a entender que as situações modernas eram demais para ela.
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