Nosso projeto, no primeiro encontro, de ir a uma academia de desenho; a mentira do telefone que ela repetiria naquela noite a seus pais, mentira à qual se acrescentaria a das rosas — eram favores mais doces que um beijo. Pois, tendo beijado muitas vezes lábios de meninas pequenas, sem grande prazer, esquecendo que era porque não as amava, eu desejava pouco os lábios de Marthe. Ao passo que tal cumplicidade era até então desconhecida para mim.
Marthe saiu do correio, radiante após a primeira mentira. Dei ao chofer o endereço de um bar na rue Daunou.
Ela se extasiava como uma aluna de internato ante a roupa branca do barman, a graça com que ele sacudia as coqueteleiras de prata, os nomes bizarros ou poéticos das misturas. Aspirava de quando em quando as rosas vermelhas, de que pretendia fazer uma aquarela que me daria como lembrança daquele dia. Pedi-lhe para me mostrar uma fotografia de seu noivo. Achei-o bonito. Sabendo a importância que ela dava à minha opinião, levei a hipocrisia ao ponto de dizer que ele era muito bonito, mas com ar pouco convencido, fazendo-a pensar que o dizia por delicadeza. O que, segundo meus cálculos, deveria perturbar seu espírito e granjear seu reconhecimento.
À tarde, entretanto, precisamos considerar o motivo de sua saída. Seu noivo, cujos gostos ela conhecia, deixara inteiramente em suas mãos a tarefa de escolher a mobília. Mas sua mãe queria por força acompanhá-la. Enfim, prometendo-lhe não cometer extravagâncias, Marthe conseguira sair só. Naquele dia ela devia escolher uns móveis para o quarto de dormir. Embora eu me houvesse prometido não demonstrar extremo prazer ou desagrado ante as palavras de Marthe, precisei fazer esforço para continuar andando no bulevar com um passo que agora não mais condizia com o ritmo do meu coração.
A obrigação de acompanhar Marthe pareceu-me má sorte. Ajudá-la a escolher um quarto para ela e um outro! Vislumbrei então uma maneira de escolher um quarto para Marthe e eu.
Esqueci tão depressa seu noivo que, em quinze minutos de caminhada, ficaria surpreso se alguém me lembrasse que naquele quarto um outro dormiria junto a ela.
Seu noivo apreciava o estilo Luís XV.
O mau gosto de Marthe era outro: ela preferia o estilo japonês. Logo, eu tinha de combater ambos. À menor insinuação de Marthe, adivinhando o que a atraía, tinha de mostrar-lhe o oposto, a fim de dar a impressão de ceder a seus caprichos quando abandonasse um móvel em favor de outro menos desagradável a seus olhos.
Ela murmurava: "E ele que queria um quarto rosa!". Não mais ousando sequer confessar seu próprio gosto, ela o atribuía ao noivo. Eu previa que dentro de alguns dias troçaríamos dele juntos.
Entretanto, não compreendia bem sua fraqueza. "Se ela não me ama", pensava, "que motivo tem para ceder, para sacrificar suas preferências, e as desse moço, às minhas?" Não encontrava nenhum. A explicação mais simples seria que ela estivesse apaixonada por mim. Mas eu estava certo do contrário.
Marthe me dissera: "Vamos deixar-lhe ao menos o papel de parede rosa". "Deixar-lhe!" A essas palavras, quase cedi. Mas "deixar-lhe o papel rosa" equivalia a abandonar tudo. Fiz ver a Marthe como a parede rosa estragaria a harmonia dos móveis simples que "nós havíamos escolhido" e, ainda hesitando ante a audácia, sugeri que caiasse as paredes do quarto!
Era o golpe de misericórdia. Ela fora tão atormentada o dia inteiro que o recebeu sem reagir. Limitou-se a dizer: "É, você tem razão".
Ao fim desse dia exaustivo, felicitei-me pelo passo que havia dado. Móvel por móvel, conseguira transformar aquele casamento de amor — ou melhor, de amorico — num casamento de razão ou conveniência, em que a razão, porém, não tinha nenhum papel, um não encontrando no outro senão as vantagens de um casamento de amor.
Ao se despedir naquela noite, em vez de evitar daí em diante meus conselhos, pediu-me que a ajudasse a escolher os outros móveis nos dias seguintes. Concordei, com a condição de ela jurar jamais contar a seu noivo, pois o único motivo que poderia eventualmente fazê-lo aceitar os móveis, se amava Marthe, seria pensar que tudo partira dela — da vontade dela, futuramente de ambos.
Quando voltei para casa acreditei ler no olhar de meu pai que ele já sabia de minha escapada. Claro que nada sabia; como poderia?
"Ah, Jacques vai se habituar a esse quarto!", dissera Marthe.
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