Não me sentia mais capaz de empreender o que me propusera. Começava a respeitar Marthe, porque começava a amá-la.
Voltei todas as noites. Não me ocorreu sequer pedir que me mostrasse o quarto, nem lhe perguntar o que Jacques pensara dos móveis. Não desejava nada além daquele eterno noivado, nossos corpos vizinhos e imóveis junto ao fogo, eu não ousando mover-me, receando que um só gesto bastasse para afugentar a felicidade.
Mas Marthe, que experimentava o mesmo encanto, acreditava fazê-lo só. Em minha indolência feliz ela via indiferença. Pensando que não a amava, ela imaginou que eu me cansaria logo daquela sala silenciosa, se ela não fizesse algo para me prender.
Permanecíamos calados. Eu via nisso uma prova de felicidade.
Eu me sentia tão próximo de Marthe, com a certeza de que pensávamos ao mesmo tempo nas mesmas coisas, que falar-lhe teria parecido absurdo, como falar alto quando se está só. Esse silêncio atormentava a pobre coitada. O sábio teria sido utilizar meios tão grosseiros como a palavra e o gesto, lamentando ao mesmo tempo não existirem outros mais sutis.
Vendo-me afundar todos os dias nesse mutismo delicioso, Marthe imaginou que eu me entediava cada vez mais. Sentia-se disposta a tudo para me distrair.
Com o cabelo solto, ela adorava dormir perto do fogo. Ou melhor, eu pensava que ela dormia. Seu sono era apenas um pretexto para colocar os braços em torno de meu pescoço e, uma vez desperta, dizer-me com os olhos úmidos que acabava de ter um sonho triste. Não queria jamais contá-lo. Eu me aproveitava de seu falso sono para aspirar seus cabelos, seu pescoço, seu rosto em brasa, roçando-os de leve para não acordá-la. Tais carícias não são, como se crê, o dinheiro miúdo do amor, mas sim as notas mais raras, a que só a paixão pode recorrer, e eu as acreditava autorizadas por minha amizade. Mas começava a me desesperar seriamente ao perceber que só o amor nos dá direitos sobre uma mulher. Poderia passar sem o amor, eu pensava, mas nunca sem ter direitos sobre Marthe. E para tê-los estava decidido até mesmo ao amor, acreditando ao mesmo tempo deplorá-lo. Eu desejava Marthe e não o compreendia.
Quando ela dormia assim, a cabeça apoiada em meu braço, eu me debruçava para ver seu rosto iluminado pelas chamas. Era brincar com fogo. Um dia me aproximei demais, sem que no entanto meu rosto tocasse o seu. Fui como a agulha que penetra um milímetro na zona proibida e é capturada pelo ímã. Culpa da agulha ou do ímã? Foi assim que senti meus lábios contra os seus. Seus olhos ainda estavam fechados, mas era óbvio que não dormia. Eu a beijava, estupefato com minha audácia, quando na realidade fora ela que me atraíra para si com força. Suas mãos se agarraram ao meu pescoço. Não teriam se agarrado mais furiosamente se estivéssemos naufragando. Eu não compreendia se ela queria que eu a salvasse ou que me afogasse junto com ela.
Agora ela estava sentada, minha cabeça sobre os seus joelhos, acariciando meu cabelo e repetindo docemente: "Você deve ir embora, você não deve mais voltar". Eu não ousava tratá-la por tu. Quando não podia mais permanecer em silêncio, escolhia cuidadosamente as palavras, pois, se não conseguia tratá-la por tu, sentia que seria ainda mais impossível dizer vous.10
Minhas lágrimas me queimavam.
1 comment