Queirós?

Queirós respondeu afirmativamente e passou a examinar as outras

pessoas. Conhecia algumas, e trocou duas ou três palavras com elas.

Ao João Viegas disse que desde muito tempo desejava conhecê-lo,

por causa de um favor que o pai lhe deveu outrora, negócio de foro.

João Viegas não se lembrava de nada, nem ainda depois que ele lhe

disse o que era; mas gostou de ouvir a notícia, em público, olhou

para todos, e durante alguns minutos regalou-se calado.

Queirós entrou em cheio no jogo. No fim de meia hora, estava

familiar da casa. Todo ele era ação, falava com desembaraço, tinha

os gestos naturais e espontâneos. Possuía um vasto repertório de cas-

tigos para jogo de prendas, cousa que encantou a toda a sociedade, e

ninguém os dirigia melhor, com tanto movimento e animação, indo

de um lado para outro, concertando os grupos, puxando cadeiras,

falando às moças, como se houvesse brincado com elas em criança.

-- D. Joaninha aqui, nesta cadeira; D. Cesária, deste lado, em pé,

e o Sr. Camilo entra por aquela porta... Assim, não: olhe, assim de

maneira que...

Teso na cadeira, o Rangel estava atônito. Donde vinha esse fura-

cão? E o furacão ia soprando, levando os chapéus dos homens, e des-

penteando as moças, que riam de contentes: Queirós daqui, Queirós

dali, Queirós de todos os lados. Rangel passou da estupefação à mor-

tificação. Era o cetro que lhe caía das mãos. Não olhava para o

outro, não se ria do que ele dizia, e respondia-lhe seco. Interiormente,

mordia-se e mandava-o ao diabo, chamava-o bobo alegre, que fazia

rir e agradava, porque nas noites de festa tudo é festa. Mas, repe-

tindo essas e piores causas, não chegava a reaver a liberdade de espí-

rito. Padecia deveras, no mais íntimo do amor-próprio; e o pior é

que o outro percebeu toda essa agitação, e o péssimo é que ele per-

cebeu que era percebido.

Rangel, assim como sonhava os bens, assim também as vinganças.

De cabeça, espatifou o Queirós; depois cogitou a possibilidade de

um desastre qualquer, uma dor bastava, mas cousa forte, que levasse

dali aquele intruso. Nenhuma dor, nada; o diabo parecia cada vez

mais lépido, e toda a sala fascinada por ele. A própria Joaninha, tão

acanhada, vibrava nas mãos de Queirós, como as outras moças; e

todos, homens e mulheres, pareciam empenhados em servi-lo. Tendo

ele falado em dançar, as moças foram ter com o tio Rufino, e pedi-

ram-lhe que tocasse uma quadrilha na flauta, uma só, não se lhe

pedia mais.

-- Não posso, dói-me um calo.

-- Flauta? bradou o Calisto. Peçam ao Queirós que nos toque

alguma cousa, e verão o que é flauta... Vai buscar a flauta, Rufino.