Até me arrepio de pensar nisso...

    Muito bem — continuou o Visconde. Estávamos já com a crosta da terra endurecida e a água formando os mares, os lagos e rios. Neste ponto começou a dar-se um fenômeno muito interessante. A água, de tanto lidar com o Calor e o Ar, fez com eles um trato. "Está muito feia a terra, assim reduzida a uma crosta de rocha dura", disse a Água. "Precisamos combinar umas modificações que permitam o aparecimento da vida. Quero ver a terra cheia de verdura e de bichos que andem, corram e se ataquem uns aos outros."

    E urrem, e zurrem, e piem — acrescentou Emília.

    "E para isso, que fazer?" — perguntou o Calor.

    "Aliar-nos os três e atacarmos as rochas ígneas, transformando-as em rochas sedimentárias" — respondeu a Água.

    "De que modo?" — perguntou ainda o Calor, que era bem burrinho.

    "Isso veremos na hora do trabalho. Tenho que experimentar. No momento basta que vocês jurem aliança comigo."

O Calor e o Ar aceitaram a proposta e desde então o trabalho da Água, do Calor e do Ar na transformação da crosta da terra não parou um só minuto. Para atacar as rochas ígneas os três inventaram uma picareta invisível, chamada Erosão. A Erosão ataca todas as pedras dum modo contínuo, e as vai rachando, lascando, esfarelando, até reduzi-las a pó finíssimo.

    Que negócio é esse? — perguntou Pedrinho.

    Muito simples. Para atacar uma grande massa de rocha, o calor primeiro a aquece. Vem depois a água, sob forma de chuva, e a resfria bruscamente. Como o calor dilata os corpos e o frio os contrai, começou na crosta da terra um terrível rachamento de pedras. Pedra aquecida e resfriada de brusco, racha, parte-se. As grandes massas de rochas foram sendo divididas em pedaços cada vez menores. E quando esses pedaços, por ficarem muitos pequenos, puderam resistir ao processo do rachamento, a Erosão veio com processos novos. A água, nas grandes chuvas, criava as enxurradas, as torrentes. Os blocos de pedra eram arrastados por essas torrentes, chocando-se uns nos outros, desgastando-se. Quem examina um fundo de ribeirão vê milhares de pedras de todas as cores, que de tão esfregadas entre si ficaram roliças, com todas as arestas destruídas. Também o Ar entra em cena, e sob forma de Vento ajuda a Erosão. O quebra-quebra, o esfrega-esfrega, o bate-bate e o rola-rola acabam transformando tudo em pedregulho, e depois transformando o pedregulho em areia e pó finíssimo de pedra — ou argila. E como as enxurradas correm para os ribeirões, e os ribeirões correm para os rios, e os rios correm para o mar, todas as rochas destruídas pela Erosão acabam despejadas no mar.

 

Depois de apoiar os pés na geologia...

 

— Mas, se é assim, os mares já deviam estar completamente entupidos — observou Narizinho.

    E que disse que os primeiros mares não foram todos entupidos? Os mares de hoje não estão onde estavam os mares de milhões de anos atrás. Temos mil provas disso. Os continentes modernos já foram mares. Por toda parte, até nas mais altas montanhas, vemos sinais de mar, o que quer dizer que também as montanhas já foram fundos de mar. As neves eternas do Himalaia, que é a mais alta montanha do mundo, repousam sobre camadas de calcário — e o calcário, como vocês devem saber, é uma rocha sedimentária formada no fundo do mar. Rocha sedimentária quer dizer rocha que se sedimentou.

—  E que é sedimentar?

— Sedimentar é ser depositado no fundo da água. Se num copo você mistura areia com água e sacode, logo a areia se deposita no fundo, isto é, se sedimenta. Pois foi o que aconteceu na crosta da terra.